A generosidade da advogada criminalista Nadja Palitot fê-la repassar mensagem ao mano Lenilson Guedes, editor do site Os Guedes, a propósito de comentário deste escriba sobre tema pertinente da atual conjuntura política, em que ela identifica traços de lucidez na análise e na fundamentação de argumentos. Era inevitável que o post de Nadja me transportasse na máquina do tempo para uma das inúmeras fases épicas do jornalismo paraibano em que acompanhei seus passos, como vereadora, suplente de deputada estadual e, depois, deputada estadual, candidata a prefeita de João Pessoa, militante política ativa, exemplo genuíno de mulher guerreira que nunca se intimidou diante dos arreganhos dos poderosos.
No livro de Glória Rabay e Maria Eulina Pessoa de Carvalho sobre histórias de mulheres que se projetaram nas lutas políticas na Paraíba, Nadja é destaque com seu depoimento sem subterfúgios acerca da sua própria personalidade, seu temperamento combativo. Eu sempre fui muito rebelde, admite Nadja, explicando que sua preocupação com o social tem raízes na forma como toda a sua família convivia com as pessoas economicamente menos favorecidas, típica da solidariedade cristã tradicional. As empregadas da minha casa não foram empregadas, sempre foram pessoas da família, ressaltou Nadja nesse depoimento, indicando um traço de fatores que modelaram o seu caráter.
Comprou brigas históricas, situando-se na oposição a governos municipais e estaduais. Travou uma queda de braço dentro do PSB, partido onde se encontrava já há algum tempo, quando era vivo Miguel Arraes de Alencar, a legenda de Pernambuco que resistiu ao golpe militar de 64 dentro do Palácio do Campo das Princesas e foi levado para Fernando de Noronha, posteriormente exilado. A queda de braço de Nadja foi com o então vereador, depois deputado Ricardo Coutinho, que manejou os cordéis até ser reconhecido como liderança política emergente em João Pessoa, a partir daí sendo admitido com honras no PSB e, na sequência, como candidato a prefeito. As vitórias cimentaram a permanência de Coutinho no PSB e, no reverso da medalha, o rompimento de Nadja. Os signos de ambos não se cruzavam. E ela continuava rebelde demais para se submeter ao guante do domínio de Ricardo nas hostes socialistas. Foi briga feia, com sequelas pessoais. Mas Nadja travou o bom combate, em alto nível, e foi cuidar da vida em outras paragens menos espinhosas ou hostis à sua militância indócil.
Carismática, dava gosto acompanhar as investidas de Nadja Palitot, nos discursos, nas entrevistas, nas conversas. Ela sempre tinha algo diferente a dizer. Combinava idealismo com pragmatismo político, mas revestia o pragmatismo de certas limitações, a partir das quais não ia em frente. Por isso, talvez, não tenha perseverado mais na política. Porque Nadja Palitot negou-se a fazer concessões, barganhas, a entrar no já famoso jogo do toma lá dá cá que, hoje, curiosamente, o presidente Jair Bolsonaro fustiga ou critica com veemência, embora ele tivesse sido eleito no papel de outsider da política brasileira, aparentando um distanciamento dos métodos tradicionais que entravam em desgaste, por fadiga de material, ou, até mesmo, por exaustão cidadã de eleitoras e eleitores cansados do fisiologismo desbragado, da falta de conteúdo, de propostas, no ramerrão da política-partidária. Na juventude, como confessa, Nadja se imaginou anarquista porque tomou horror a tudo o que viesse de política. Caiu nos braços da política por intuir que era nela que deveria ser travada a guerra para mudar a forma de fazer política.
Formada em Direito, já estabelecida como advogada criminalista, Nadja Palitot candidatou-se às eleições para o Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil na Paraíba, em princípio receosa por estar adentrando a um território muito machista. Para sua surpresa, foi bem acolhida, tornando-se expoente do grupo pioneiro que fundou a Comissão de Direitos Humanos. Os conselheiros mais velhos olhavam desconfiados para mim. Uma mulher com idade de ser filha deles fundando Comissão de Direitos Humanos e dizendo abertamente nas reuniões de Conselho que era anarquista…Mas eles suportavam isso, acho que eles achavam, talvez, um pouco engraçado, pueril, relembra Nadja, divertindo-se. Anarquista, graças a Deus, como intitulou Zélia Gattai, a companheira de Jorge Amado, livro de reminiscências assaz mencionado. Nadja rebelde, mas com causas, sim. E dona de uma oratória forte, eloquente, que atuou gigante nas mobilizações contra demissões no Paraiban e contra seu fechamento. Nadja de outras batalhas, Nadja guerreira, leoa contra os pavões misteriosos que se assenhoreavam de cúpulas partidárias e cortejavam o beneplácito popular. Nadja que a Paraíba reverencia e reverenciará sempre, como mulher guerreira e, portanto, revolucionária, carregando dentro de si toda a ternura do mundo e a beleza dos sentimentos femininos.
Nonato Guedes