Aparentemente de forma mais articulada, só que com menos público, estudantes, professores e representantes de outras categorias sociais solidárias voltaram às ruas, ontem, para protestar contra o desmonte da Educação que está sendo posto em prática pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, como parte de uma estratégia de confrontação com a sociedade que passa pelo despejo de conquistas e avanços e até mesmo pelo embate verbal-ideológico. Não dá para estar nas ruas todos os dias levantando bandeiras ou hastaghs contra isso ou aquilo afinal, é preciso trabalhar para sobreviver num país que não oferece muitas perspectivas para os que aqui vivem. Mas é preciso reconhecer que o governo é quem está operando como agente provocador, cutucando os protestos de rua com vara curta, por mais que disponha de aparato, sobretudo midiático, alimentado por fakenews para exibir suposta demonstração de força.
Essas manifestações contra e a favor são da essência da democracia, teorizam alguns analistas e emissários chapas-brancas, os mesmos que em outras épocas não tão distantes assacavam invectivas contra protestos de rua invocando a necessidade de ser mantida a paz, ainda que fosse a paz dos cemitérios. Já se disse que todo cidadão decente envergonha-se de certos governos que tentam comandar seu destino. No Brasil da Era Bolsonaro não há razões sobejas para o cidadão orgulhar-se do governo que tem, e dá-se que o dito governo tem sido pródigo em produzir excentricidades, como a de convocar manifestações a favor, quando, normalmente, as ruas são tomadas por manifestações do contra, com pautas reivindicatórias que já chegaram a envolver no Brasil, inclusive, o coro pela volta da tomada de dois pinos na rede elétrica das casas.
O presidente Bolsonaro, que já confessou seu despreparo para ser presidente da República e não se cansa de fazer apologia da vocação que tem pela carreira militar ou pelo bulício da caserna, opera no Palácio do Planalto como se o ofício de governar fosse uma gandaia e não uma responsabilidade séria e desafiadora até em virtude da complexidade dos problemas que precisam ser equacionados. Não há da parte de Bolsonaro sinal mais eloquente de respeito à liturgia do cargo, ritual praticado até por obscuros presidentes que foram alçados à suprema magistratura da Nação não necessariamente por mérito ou pelos votos mas por circunstâncias excepcionais e, em alguns casos, por artes do acaso. Mas o desrespeito à liturgia do cargo ainda é o de menos. Pior é o descompromisso do governo regido pelo capitão com graves causas que afetam a sociedade. Não se passa um dia sem que não ocorra um retrocesso em alguma área essencial nestes tempos bolsonarianos ontem, foi divulgado que o Brasil está no ranking dos países que praticam flagrantemente retrocessos ambientais.
Ainda agora, Bolsonaro está empenhadíssimo em destruir uma reserva ecológica de vital importância para a preservação do ecossistema no Brasil em troca da sua transformação em paraíso turístico, cujo desenho pode incluir tudo, inclusive, cassinos, com a proliferação a granel de jogos de azar e do parasitismo no mercado de trabalho nacional, já que o perde e ganha nas roletas estará concentrado nas mãos de uma minoria perdulária que pode se dar ao luxo de torrar dinheiro em inutilidades ou em vícios pouco exemplares para a maioria esmagadora da população. Bolsonaro tem flertado com fórmulas autoritárias de governo, tem constantemente tentado desmoralizar o Congresso Nacional, onde passou 28 anos sem apresentar um só projeto relevante, e o Supremo Tribunal Federal, que não é intocável mas é imprescindível no regime democrático e caiu no delírio de que governa com as ruas, numa projeção aleatória, porque as manifestações de apoio registradas no último domingo não foram direcionadas ao governo, mas às reformas de que este País carece para sair da estagnação e do subdesenvolvimento.
Parco de leitura e, portanto, desequipado intelectualmente para avaliar conjunturas históricas, para dispor de uma percepção correta sobre as mutações históricas, Bolsonaro exercita à larga um populismo de fancaria, oco de conteúdo, prenhe de substância, mas recheado de apelos demagógicos misturados com slogans extraídos de compêndios do fascismo em que o Estado recorre à democracia de massas entre aspas passando por cima das instâncias legítimas de representatividade popular que compõem a argamassa do Estado de Direito. É um mini-ditador disfarçado de democrata. Com a desvantagem de que está flertando com o perigo ao cutucar protestos de rua. Quem sabe, inconscientemente, Bolsonaro não esteja plantando o germe do próprio impeachment, afiando a guilhotina, desavisadamente, para que ela recaia sobre seu pescoço? Como já foi dito, o que dá pra rir, dá pra chorar…
Nonato Guedes