Na recente visita que fez à Paraíba, o senador Davi Alcolumbre, presidente do Senado, foi como que profético ao opinar que dificilmente passaria no Parlamento, este ano, a proposta de prorrogação de mandatos de prefeitos e vereadores, a pretexto de promover-se uma coincidência geral de eleições no país e também como estratégia para reduzir custos numa atividade que é sempre onerosa a disputa política. Não é que haja propriamente um sentimento de repúdio generalizado à ideia da prorrogação, na proporção em que ela foi criticada em outras oportunidades. Hoje, a sociedade está como que paralisada diante de fatos políticos de repercussão e casuísmos, ora porque não constituem surpresa, ora porque não se dispõe a gastar energias levantando bandeiras que muitas vezes são contrariadas pelos que se intitulam representantes do povo.
A ideia da prorrogação de mandatos nasceu, seguramente, de insinuação das bases municipais, ou seja, dos maiores beneficiários com a medida: prefeitos e vereadores que não têm perspectiva de futuro promissor definida ou que não desejam correr riscos, no caso dos que têm direito à reeleição (o que na Paraíba exclui, de largada, Luciano Cartaxo, que administra João Pessoa, e Romero Rodrigues, que governa Campina Grande, ambos já no segundo mandato). Estes, como outros, põem-se numa atitude de expectativa. Se tiverem que agir para o desideratum da prorrogação, o fazem nos bastidores a fim de não se expor a desgaste perante a opinião pública face ao caráter antipático da iniciativa.
Um outro fator que pode estar contribuindo para o desaquecimento da ideia da prorrogação de mandatos é a tumultuada conjuntura nacional, em que afloram temas controversos, que não conseguem o mínimo consenso na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Um exemplo foi a aprovação, ontem, pelo plenário do Senado, do parecer da Comissão de Constituição e Justiça que pede a suspensão do decreto do presidente Jair Bolsonaro flexibilizando as normas de posse e de porte de armas de fogo. O texto foi aprovado por 47 votos a 28 e segue, agora, para apreciação e análise pela Câmara dos Deputados. Uma sinalização palpável do resultado da votação de ontem foi a vulnerabilidade do governo de Bolsonaro em relação à montagem de uma base parlamentar sólida ou confiável, que viabilize a aprovação de matérias do seu interesse.
O governo do capitão tem amargado derrotas sucessivas e não raro se envolve em recuos que atestam a própria dificuldade de Bolsonaro em exercer na plenitude o cargo de presidente da República. Não faltou quem dissesse já que ele não tem vocação para o posto, o que foi confirmado pelo próprio Bolsonaro, ao tecer loas às Forças Armadas, corroborando a impressão que se tem de que seu universo é o da caserna, não o do poder. Bolsonaro tem errado, por exemplo, na escolha de ministros, e por isso é que enfrenta defecções em série na equipe. Chegou ao ponto de humilhar um auxiliar publicamente, sugerindo que se ele não pedisse demissão, o exoneraria. Assim foi feito com Joaquim Levy, que foi defenestrado da presidência do BNDEs em meio a contrariedades do presidente da República com medidas autonomistas que ele intentou no banco.
O governo do capitão está retalhado em intrigas palacianas e em interferências domésticas ou familiares, dos filhos do presidente. Ainda ontem, em conversa com este repórter, um deputado federal paraibano, falando em off, reiterou que apesar de Bolsonaro querer fazer crer que os filhos polêmicos, que atuam como robôs em redes sociais, estão afastados do centro das decisões, na prática eles são os grandes conselheiros do presidente, porque opinam sobre tudo da indicação de ministros à definição de políticas públicas e até mesmo a definições ideológicas no âmbito do governo, embora não tenham autoridade intelectual para incursionar por essa última seara.
Nessa situação confusa, o governo está a braços com o destino da sua grande bandeira a reforma da Previdência Social. A esta altura, com a torre de Babel instalada no governo a pleno vapor, não há a menor garantia de que a reforma seja aprovada no Congresso Nacional, pelo menos nos moldes do texto que o Palácio do Planalto concebeu e encaminhou para apreciação e votação. De olho na voz rouca das ruas, que se mexem aqui e acolá emitindo protestos contra pontos da reforma da Previdência, Bolsonaro avança e recua concede e nega na questão da nova Previdência. O resultado vai ser um texto Frankenstein, sem qualquer unidade ou coerência. Pode ser pior: a montanha pode parir um rato. Não é só a agenda nacional que está indefinida. O futuro desse governo é que é imprevisível.
Nonato Guedes