O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não abre mão do papel de continuar sendo a mosca na sopa da geleia geral que campeia na política e em outras instâncias de poder da conjuntura tupiniquim, como o Supremo Tribunal Federal. Presidiário com regalias que não são conferidas a mortais comuns, como o acesso a livros de autoajuda política e piedoso fervor religioso, a pen-drives para assistir a um repertório variado de atrações nos momentos de ócio, a saber: jogos de futebol, sobretudo do Corinthians, seu time de coração, e recordista de entrevistas concedidas numa cela da Polícia Federal, ele deu vazão, ontem, a mais um lance pirotécnico para se manter em evidência quando a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal ameaçou conceder-lhe soltura imediata diante de recursos pedindo a anulação dos processos a que responde, por suposta suspeição do ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro.
À primeira vista, deu-se mais uma derrota da defesa de Lula, mas, a bem da verdade, foi uma derrota calculada, no bojo da estratégia em que o ex-presidente persevera para dominar os holofotes, acuar o governo do presidente Jair Bolsonaro, derreter os corações e mentes de ministros do Supremo, alguns dos quais ele mesmo, Lula, nomeou com a caneta presidencial e, enfim, sensibilizar, comover às lágrimas a opinião pública, inclusive, os recalcitrantes que ainda teimam em não endossar a narrativa do golpe e da perseguição odiosa que, conforme os aliados e áulicos lulopetistas, foi deflagrado no Brasil nos últimos anos, pouco importa se houve saque de cofres públicos por governos petistas. Antes, como agora, o que o PT quer mesmo é rosetar. E, no que diz respeito, particularmente a Lula, o seu esporte predileto, além de expor-se como vítima, como líder acorrentado, é o de sambar na cara da Justiça, apelando para instintos primitivos de ministros que foram algozes seus no passado mas que hoje o preferem a Bolsonaro diante da frase infeliz atribuída ao capitão reformado de que bastariam um cabo e um soldado para cerrar as portas da Suprema Corte, o templo dos doutores das sentenças e jurisprudências, dos ilustres capas pretas que decidem os destinos do povo desta república pindorama com a sapiência de quem está acima do Bem e do Mal.
Com sua habilidade intuitiva e malandra, o ex-presidente Lula da Silva conseguiu ser o centro das atenções estando preso e sem o poder da caneta que nomeia e demite. É ele que embala as manifestações de artistas renomados em shows lotados com refrões já desgastados pelo uso mas de forte apelo como o Lula Livre, mantra repetido automaticamente até por quem não gosta do Partido dos Trabalhadores ou não votou em Lula no passado. Aliás, é incrível a grande quantidade, hoje, de discípulos do pajé petista, num arco que envolve ministros, ex-ministros, senadores como Renan Calheiros, esse paladino da moralidade que tantas vezes acicatou o PT mas soube ser demagogo e generoso ao enxertar a anistia para Dilma Rousseff no processo de impeachment, do mesmo modo como hoje é Lula de carteirinha e, dizem os mais íntimos, desde criança, quando sonhava com um mar de bandeiras vermelhas inundando o solo verde-amarelo.
Foi preciso Lula ser recolhido a uma razoavelmente acolhedora cela da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná, onde tem franqueado o uso, até mesmo, de equipamentos de musculação para manter o corpo são e a mente perfeita e gastar o resto do dia entretido em confabulações, recebendo visitas de emissários ou de paus-mandados que tocam a vida do partido e outros empreendimentos lucrativos enquanto ele, o chefe, é privado da liberdade e do contato com palanques a céu aberto, sendo liberado apenas para ir ao velório de um parente muito próximo, usufruindo prerrogativas que só muito tempo depois foram conferidas a Suzane Richtoffen, presa por outra motivação, completamente diversa. Lula desencadeou, também, de forma adrede, sentimentos de culpa entre ministros remanescentes do curto interregno da moralidade que pontificou nas Cortes de Justiça do país. Hoje, tais ministros se submetem, docemente constrangidos, a exercícios de autocrítica sobre sentenças que exararam, bobagens que disseram do púlpito nas agitadas sessões que passaram a concorrer com audiência de novelas e seriados das televisões brasileiras especializadas no entretenimento. No reverso da medalha, o capitão-presidente recua de leis e decretos, administra uma Babel de ministros e auxiliares prosaicos, não consegue avançar no que prometeu ao eleitorado na campanha em que derrotou Haddad, o queridinho de Lula e seu alter-ego. Segue a pantomima. Não será surpresa se logo logo Lula estiver solto, candidato a presidente e amplamente vitorioso por mais dois mandatos. Será êxtase total para lulopetistas e convertidos das últimas horas. É o Brasil!!!
Nonato Guedes