A atitude do deputado federal paraibano Pedro Cunha Lima (PSDB), abrindo mão de uma gorda aposentadoria especial concedida a parlamentares no exercício do mandato, é uma exceção no universo político brasileiro, onde são muitos os que adquirem patrimônio de forma obscura e tentam ludibriar as leis omitindo declarações no Imposto de Renda e buscando escapar de punições. No livro Os Ben$ que os Políticos Fazem, o jornalista Chico de Gois conta histórias de quem enriqueceu na política e menciona dois extremos: o caso do ex-deputado federal João Alves, que ficou famoso nacionalmente no início da década de 1990 ao afirmar que toda a riqueza que tinha não se devia à roubalheira, mas à sorte e a Deus, e o caso da deputada federal paraibana Luíza Erundina (PSOL-SP), que precisou recorrer a doações de amigos e simpatizantes para pagar uma dívida de R$ 352 mil em 2010 por causa de condenação judicial sofrida quando fora prefeita de São Paulo. Erundina havia veiculado propaganda em apoio à greve dos motoristas de ônibus em 1989 e a Justiça entendeu que ela gastara o dinheiro do município de forma irregular.
Uma campanha foi feita por personagens de diversas colorações ideológicas e empresários e a arrecadação obtida por meio de jantares conseguiu quitar a dívida. Erundina tinha apenas o apartamento onde morava e dois veículos e, na época, confessou que recorrer à vaquinha foi a fórmula encontrada para cobrir a inadimplência e não ser penalizada judicialmente. Em relação a João Alves, ele acabou entrando no folclore político quando jurou, durante depoimento na CPI do Orçamento da Câmara Federal: Deus me ajudou e eu acertei duzentas vezes na loteria. Alves foi um dos parlamentares cassados durante o escândalo dos Anões do Orçamento, pelo qual deputados apresentavam emendas para obras ou aquisição de equipamentos e, para isso, eram recompensados pelas empresas que iriam vencer as licitações já previamente acertadas. Comparado aos escândalos da Lava-Jato, que arrastaram para a cadeia até o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a ginástica de João Alves para enriquecer era fichinha.
Chico de Gois alerta que nenhum político admite ser desonesto ou que ficou rico porque os mandatos exercidos por ele o permitiram. Quem já era milionário antes de assumir uma função pública tem muito mais chance de lavar o dinheiro ganho indevidamente do que quem ainda não é. Os sinais exteriores de riqueza são a prova mais visível de que alguém desviou verbas públicas. Quem pouco tinha e passou a ter muito tem dificuldade de explicar como conquistou tanto patrimônio. A maioria diz que foi por causa de suas empresas, de suas terras, do seu gado, dos seus negócios. Outros, apesar das evidências de que imóveis lhes pertencem, afirmarão que as propriedades são de algum parente, embora todos na cidade saibam que é i verdadeiro dono, acrescenta Chico de Gois. Por menor que seja o poder de um eleito, ele pode ganhar muito dinheiro desonestamente, se assim o desejar. Um vereador de uma cidade média tem muita possibilidade de auferir dividendos na discussão, por exemplo, do Plano Diretor da cidade, que vai dizer o que pode e o que não pode ser construído e onde as restrições irão valer. Proprietários de terrenos farão um forte lobby para, com a mudança da lei, valorizar ainda mais seus imóveis, relata o jornalista.
Repórter da sucursal de O Globo em Brasília, que cobriu diversas campanhas eleitorais e CPIs como as do Mensalão e do Cachoeira, Chico de Gois refere-se, no livro, ao atual deputado federal Wilson Santiago, do PTB da Paraíba, que teve origens humildes mas que ascendeu de forma promissora na vida pública. A vida financeira de Santiago deu um salto: os R$ 48.500 declarados em 2006 multiplicaram-se quase 20 vezes ele informou que tinha um patrimônio de R$ 926 mil, incluindo quotas da Terradrina Construções, uma empreiteira da qual era sócio, narra Góis, lembrando que em 2010 Wilson candidatou-se ao Senado e lançou o filho de 21 anos para lhe suceder na Câmara. Hoje, Wilson Filho é deputado estadual e tem pretensão de ser candidato a prefeito de João Pessoa, enquanto Wilson pai reconquistou o mandato na Câmara Federal e tem tido, por enquanto, uma atuação apagada, o que levou o radialista Gutemberg Cardoso a comentar, ainda ontem, na rádio Arapuan, que ele parece ter desaprendido sobre como atuar em Brasília. Quando pipocaram denúncias sobre seu patrimônio, Wilson Santiago atribuiu as denúncias a manobras de adversários políticos no Estado. Chico de Gois, embora ressaltando que quanto mais prestígio tem um parlamentar, mais possibilidade de ser corrompido ele tem, adverte: É lógico que não se trata de todos. Há muitos políticos que conquistaram o respeito dos seus pares e da sociedade porque agem seriamente com a coisa pública e dedicam-se a debater assuntos importantes para o país. Mas os mal-intencionados veem no debate de temas que envolvem bilhões de reais uma oportunidade de auferir lucros.
Nonato Guedes