O jornalista Paulo Henrique Amorim, cuja morte ocorrida hoje é profundamente lamentada em setores da imprensa, da vida pública e da sociedade no Brasil, era um profissional carismático e, ao mesmo tempo, polemista. Poucos dias antes de sua morte havia sido comunicado da sua demissão do programa que apresentava na TV Record, tendo sido atribuída a medida a comentários desfavoráveis de PHA ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Algumas de suas maiores controvérsias estão compiladas no livro O Quarto Poder Uma Outra História, com narrativas sobre sua experiência pessoal na televisão. Este manuscrito, escrito num estilo jornalístico convencional, foi rejeitado por seis editoras. Mas não por causa da forma. Resolvi adiar a publicação. Retomei agora, oito, nove anos depois, contou ele, no estilo do blog Conversa Afiada com que brindava o público cativo. Abusava das ironias, é claro.
O primeiro capítulo do livro é intitulado Por que fui para a televisão. Escreve Paulo Henrique Amorim:
Eu dirigi o Jornal do Brasil quando, modestamente, ainda era o melhor jornal do Brasil. Lá pela meia noite, na hora de descer a primeira página para a oficina, Hedyl Vale Jr., redator-chefe, se aproximava, contemplava as filas de redatores cadavéricos e, abafado pelo bigode de Zapata, emitia o comentário:
– Vamos embora. Isso aqui não vai a lugar nenhum. Rodar 100 mil exemplares que ninguém vai ler. Vamos embora para a televisão. Vamos trocar a profundidade pelo alcance.
Hedyl foi primeiro para a Globo.
Demitido do Jornal do Brasil, fui para a TV Manchete, que acabava de nascer, para a TV Globo, Bandeirantes, TV Cultura-SP e TV Record. Só não fui para o Sílvio Santos.
Uma tarde, no meio de nove meses de desemprego depois de sair da Bandeirantes, recebi um telefonema de Hebe Camargo, com quem sempre mantive relações afetuosas.
– Paulo Henrique, estou aqui na sala do Sílvio. Estou dizendo a ele que você deveria vir para cá. Você toparia?
– Claro, Hebe, muito obrigado. Estou desempregado.
– Viu, Sílvio, ele topa! Fala com ele, Silvio.
Vem Silvio ao telefone.
– Olá, Paulo Henrique. Eu gosto muito do seu trabalho. Muito mesmo. Mas eu gosto do seu trabalho na televisão dos outros.
No fim de 2013, um estudo da americana Business Insider concluía que a TV está morrendo.
A audiência caía, inclusive, na tevê por assinatura.
E nem a internet no computador ou no tablete era o que mais se beneficiava, mas os aparelhos móveis.
A TV aberta, comercial, é uma invenção de duvidosa utilidade.
Especialmente no Brasil, onde a Globo conseguiu ampliar seus defeitos com o poder de um monopólio incompatível com o regime democrático. A Globo vai morrer gorda. Líder, mas sem a receita que pague os custos incorporados nos anos de opulência. Ela e a tevê aberta não comemorarão cem anos. Vão durar menos que o chapéu-panamá, que Santos Dumont passou a usar em 1906. Eu provavelmente levarei a TV Globo ao túmulo de chapéu-panamá.
Paulo Henrique Amorim irá para o túmulo nas próximas horas. Sem chapéu-panamá!!!
Nonato Guedes