Não vou teorizar nem expender argumentos a respeito das denúncias sobre conduta antiética de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol enquanto executores da força-tarefa da Operação Lava-Jato. Minha posição a este respeito é simples: se forem culpados, sejam punidos. Dura lex, sed lex. Aliás, Moro, que está de licença do ministério da Justiça, voltou-se, ontem, pelo Twitter, contra a imprensa, acusando-a de fazer campanha contra a Lava-Jato e a favor da corrupção. Isso está beirando o ridículo, obtemperou o ministro licenciado e, ao que tudo indica, ainda prestigiado pelo presidente Jair Bolsonaro. Lamento que Moro incorra no vezo de atribuir à imprensa os males e os malfeitos do mundo. Esperava que fosse mais criativo nesse terreno.
Noves fora a manifestação intempestiva de Sérgio Moro, que já foi endeusado por essa mesma imprensa a quem acusa como o grande paladino da moral no Brasil, guindado à condição de salvador da Pátria, cabe registrar que há uma orquestração, sim, a todo o vapor, para desmoralizar e sepultar a Operação Lava-Jato, recorrendo-se a métodos que, na Itália, acabaram desgastando a Operação Mãos Limpas, que serviu de inspiração para a congênere brasileira. Quem comanda a orquestração contra a Lava-Jato são os políticos corruptos, por razões óbvias: já sentiram na pele os efeitos do braço punitivo da Lei pelas falcatruas que cometeram. É natural que queiram a volta da impunidade.
Na Operação Mãos Limpas, deu-se o feito de Bettino Craxi, o maior nome socialista da Itália pré-Berlusconi, ter sido investigado e ter admitido a corrupção. Nenhuma legenda ou organização partidária foi poupada. Sérgio Moro, num depoimento que prestou sobre os desdobramentos da Operação Mani Pulite, depois de se aprofundar na sua metodologia, concepção e resultados, foi incisivo: Um acontecimento da magnitude da Operação Mani Pulite tem por evidente seus admiradores, mas também seus críticos. É inegável, porém, que constituiu uma das mais exitosas cruzadas judiciárias contra a corrupção política e administrativa. Procurou-se transplantar o modelo italiano para o Brasil, adaptando-o, porém, às nossas peculiaridades. Afinal, o Brasil é pródigo em sortilégios de políticos e poderosos dentro da tática manjada de escafeder-se de responsabilidades pelos delitos cometidos e de tentar inverter papéis, incriminando quem, na verdade, estava caçando criminosos e dilapidadores do dinheiro público.
A orquestração contra a Lava-Jato no Brasil ganhou adeptos fora da classe política mais precisamente, junto a tribunais superiores encarregados de pôr em prática a Justiça. Ministros escudados em imunidades e em outras prerrogativas de facilitação, mediante tráfico de influência nos bastidores, partiram com veemência contra Moro, Dallagnol e a Operação Lava-Jato em si. Chegou-se ao cúmulo de cogitar como plausível a anulação de atos e de processos de condenação de políticos implicados, o que equivaleria, em outras palavras, a revogar a História, dar como vazias as denúncias formuladas à custa de muita investigação e até mesmo do uso da delação premiada, entronizada como artifício para fazer falarem os que sabiam muito e não diziam nada. Em última análise, a orquestração contra a Lava-Jato intentou – e aindaintenta provocar um terceiro turno das eleições presidenciais de 2018, deslegitimando a vitória do candidato-presidente Jair Bolsonaro e coroando Fernando Haddad, o alter-ego do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o ungido da grande massa para reger os destinos do país.
Por trás de toda essa engrenagem está em curso a manobra para colocar em liberdade o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e aureolá-lo como vítima, de tal sorte que haja uma mobilização nacional para que ele retorne ao comando do Palácio do Planalto, de onde perpetrou a montagem de uma das mais sórdidas organizações criminosas, cuja especialidade era saquear os cofres públicos em detrimento dos programas e das prioridades sociais que cabia ao governo empalmar ou executar. Este é o corolário da orquestração que está em marcha e que ganha tonalidades dramáticas a cada dia, dentro da técnica de lavagem cerebral para deificar Lula como o coitadinho, o prisioneiro de uma conspiração das elites (togadas, também?). O Brasil mantém-se com a respiração presa, aguardando o veredicto: iremos para o retrocesso e a impunidade ou perseveremos no caminho da Lei e da aplicação da Justiça?
Nonato Guedes