Pelo que as aparências sinalizam, não parece confortável o emprego de ministro do presidente Jair Messias Bolsonaro. Por sua natureza, o cargo já é instável em qualquer governo, ou seja, nunca tem prazo de validade certo, ficando condicionado a humores do presidente ou a rumores espalhados pela mídia sobre alguma coisa que deu errado no âmbito da Pasta e que torna insustentável a posição do seu ocupante. Quando o governo é marcadamente imprevisível, improvisado, como o do outsider Jair Bolsonaro, as coisas tornam-se mais complicadas ainda porque a sobrevivência no posto passa a depender de adivinhações sobre o astral do mandatário no dia a dia. Pode acontecer de uma notícia contra um ministro funcionar a favor do ministro se o presidente somatizar a queimação para o governo em si. Bingo! Mas se Bolsonaro decretar que o problema é exclusivo do ministro tal ou que esse tal ministro deve se cozinhar nas próprias banhas, sem o beneplácito do governo, convém arrumar as gavetas e já encarar o presidente com a carta de demissão porque o que está irremediável, irremediável ficará.
Tome-se, ao acaso, o exemplo do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, frequentemente importunado por Bolsonaro porque lida com questões ecológicas que despertaram o interesse inusitado do presidente da República, às voltas com a obtenção de dividendos financeiros oriundos da exploração de nichos do turismo e com a obrigação de respeitar normas ou limites para a preservação da natureza, dentro do figurino que consta de tratados internacionais. O ministro já foi escalado, de público, para ir a Fernando de Noronha e foi administrar uma questão prosaica: as condições e o custo de estrutura de pousadas e circulação de veículos dentro da jurisdição da ilha, que em eras não tão priscas, ainda recentemente, na ditadura militar, operava como base de confinamento de prisioneiros políticos ilustres, como o ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes, e, numa guinada de 360 graus, adquiriu foros de santuário ecológico, com a imposição de condições para preservação de áreas tidas como sagradas. O governo oscila entre a propaganda ecológica nem sempre correspondente à realidade, e à sanha por lucros derivados da exploração turística de terrenos e de locais que constituem atrativos cobiçados por quem está de fora do território.
A pior saia justa em que o ministro Salles meteu-se, porém, ficou por conta da divulgação de dados alarmantes sobre as proporções do desmatamento que é praticado no Brasil em áreas de matas nativas, com itinerários que escoam pela região da Amazônia, concebida para ser uma espécie de pulmão do país e que tem sido duramente contaminada pela especulação financeira, embutida na disputa travada entre grupos e consórcios econômicos de olho nos espaços de exploração. O ministro deu a público números que contrariaram a estatística própria do presidente Jair Bolsonaro. Foi como se tivesse mexido num vespeiro, numa questão afeta à órbita da segurança nacional, sobre a qual não caberia ingerência em tom de dissintonia com a realidade que o presidente quer passar para efeito de vantagem ou dividendo.
Bolsonaro apressou-se em minimizar os números fornecidos pelo ministro Salles, não tendo pejo qualquer em desautorizar, de público, um órgão credenciado do próprio governo como o Inpe, negando-lhe credenciais para efetuar mapeamento de dados passíveis de publicização. O presidente esbarrou, nesse contencioso, com reportagens de emissoras de televisão, a exemplo da Rede Globo, apresentando imagens bastante fortes do cenário ermo em que vão se tornando paraísos de árvores e de matas nativas de valor incalculável. A televisão mostrou que equipes do governo treinadas no assunto estão desativadas porque não são acionadas para realizar serviços que são de sua competência. E isto se dá porque o presidente quer erguer uma espécie de cinturão em torno dessas áreas nobres, não para protegê-los mas para deixá-los intactos e atraentes na mesa da especulação e dos acordos comerciais. É tentador achar que o ministro é mais patriótico do que o presidente, mas dizer isso a Bolsonaro equivale a uma heresia.
É por conta da falta de autonomia e, sobretudo, da desorganização derivada da falta de propostas concretas do governo para os graves problemas nacionais que vão se acumulando aberrações em pastas estratégicas como o ministério da Educação e Cultura, alvo predileto da bagunça bolsonarista. Também em função disso a ministra da Família, a despreparada pastora Damares Alves, tem se especializado em alimentar uma profusão de sandices sobre temas-tabus para os quais o governo do capitão não tem posição firmada. Isto submete a gestão do presidente a uma roda-gigante constante, com vai e vem de medidas, com avanços e recuos, que refletem o caos imperante e torna definitivamente desprimoroso o cargo de ministro, que já foi o grande desejo de consumo de muitas figuras da vida pública nacional. Até nisso Bolsonaro inova – para pior.
Nonato Guedes