Por mais que o governador João Azevêdo e o antecessor Ricardo Coutinho, ambos do PSB, se esforcem para demonstrar afinidade ou entrosamento, há sinais eloquentes de que as coisas não são bem assim. Há um contencioso que envolve a pauta administrativa e a pauta política. A própria divisão reinante na bancada socialista na Assembleia Legislativa em relação a um episódio a acumulação de uma secretaria no governo com a presidência estadual do partido por Edvaldo Rosas, é emblemática de um desaguisado, ou se preferirem, da existência de fios desencapados que, por óbvio, friccionam a almejada unidade ou o pretendido entendimento.
A impressão que vaza para o público externo é que dá-se um confronto surdo entre Azevêdo, o dono da caneta, e Coutinho, o líder maior dos votos na órbita dos girassóis. A carga feita pelas deputadas Cida Ramos e Estelizabel Bezerra contra a acumulação de cargos por Edvaldo Rosas bateu de frente com a investida em alto estilo do governador João Azevêdo, que além de não enxergar incompatibilidade na acumulação de funções, citando o exemplo do falecido Eduardo Campos, de Pernambuco, que governou o Estado e presidiu nacionalmente o partido, ainda entoou loas ao papel relevante que, na sua opinião, Rosas desempenhou até o momento para favorecer o crescimento da legenda no Estado.
Ou seja, na concepção do governador, Edvaldo tem um histórico que conta a seu favor e, como tal, merece ser prestigiado, porque exibe lealdade ou fidelidade ao projeto socialista e busca equacionar da melhor forma possível eventuais dissensões, muitas vezes motivadas por áreas de atrito localizadas entre deputados e deputadas socialistas ou estimuladas por fogueiras de vaidades originadas pela sensação de que o poder subiu às cabeças coroadas que militam nas hostes do Partido Socialista. Providencialmente, o ex-governador Ricardo Coutinho tem adotado uma postura equidistante das divergências que se espraiam pelo agrupamento girassol. Se tem formulado queixas, age diretamente, sem intermediários, em conversa com o sucessor João Azevêdo. Coutinho sabe, por conhecimento de causa ou experiência, o quão desgastante é o bate-boca através da imprensa. Isto não o exime de, nos bastidores, alinhar-se com reclamações de deputado(a)s que lhe parecem mais fiéis do que ao governador de plantão. Mas, vale repetir, lança mão da habilidade para contornar obstáculos.
Os atos de desinteligência entre Ricardo Coutinho e João Azevêdo estão, a rigor, na lógica da dinâmica política. Foi o próprio Azevêdo, afinal, que deixou claro numa variação da frase de que os homens não fervem à mesma temperatura que possui, sim, diferenças de estilo e até, em alguns casos, de concepção, com Ricardo Coutinho a respeito de intervenções que cabe ao Executivo formular em temas delicados ou decisivos. Mas também é verdade que Azevêdo tem sido enfático ao assegurar que tais diferenças não significam uma quebra do pacto pela manutenção do projeto socialista, que ele considera acertado, ressalvados alguns pontos. O governo é de continuidade, dentro das limitações, e até onde isto for possível. Há um limite para tudo na vida e, muitas vezes, esticar a corda não é a solução.
É preciso registrar um fato que poucos analistas políticos ainda não anotaram: dentro da teoria de que o uso do cachimbo faz a boca torta, alguns auxiliares de Azevêdo, de algum modo remanescentes da Era Coutinho, ainda insistem em bater continência ao ex-governador, ao invés de demonstrar fidelidade absoluta ao governador que tem a caneta nas mãos. Não se trata de cometer deslealdade ou traição, mas de acatar o que está na ordem do dia ou, em caso de constrangimento, pedir o boné e inscrever-se numa das filas de postos de emprego que estão ressurgindo no mercado. Azevêdo e Ricardo se entendem ou não se entendem, mas sabem o que estão fazendo. O que não é politicamente correto é o paralelismo de ações, pois assim nem Azevêdo governa nem o PSB é ajudado.
Indagaram-me, ontem, por telefone, se há risco de um desalinhamento ou até mesmo de uma ruptura entre Ricardo Coutinho e João Azevêdo. Opinei que a dados de hoje, é remota a possibilidade. Pelas minhas observações, identifico que não há um quadro de sangria desatada para um distanciamento entre os dois, invocando-se qualquer pretexto à mão. Há pendências que passam pela Operação Calvário e outras que nem de longe são do conhecimento da opinião pública, as quais precisam ser resolvidas a quatro mãos, mais precisamente entre Azevêdo e Ricardo. Mas já tivemos desentendimentos na história entre aliados na Paraíba, como entre Wilson Braga e Tarcísio Burity, e José Maranhão versus Ronaldo Cunha Lima. Vale repetir: os homens não fervem à mesma temperatura, e os interesses não convergem a vida inteira em nenhuma parte do mundo.
Nonato Guedes