A ostensiva movimentação política do ex-governador Ricardo Coutinho, dispondo-se, inclusive, a liderar uma manifestação domingo em Monteiro em favor da continuidade da transposição de águas do rio São Francisco e contra o governo Bolsonaro, não logrará tirar o governador João Azevêdo do foco administrativo. É por isso e por outras razões, ligadas a divergências com o antecessor, que Azevêdo não vai a Monteiro. Já deixou claro que o evento de domingo é um evento político e que, enquanto outros dedicam-se a politicar, ele cuida de descascar os abacaxis postos na mesa como governador do Estado.
Não falta quem alerte para o risco de Azevêdo vir a perder espaços em termos de liderança política, mas o chefe do Executivo age de forma racional, evitando dar mote para o acirramento da divergência com Ricardo. Ele sabe que se ceder a pressões para fazer o jogo de Ricardo deixará a retaguarda administrativa a descoberto, com isto abrindo a guarda, já que não há vácuo na política. Em certa medida, também, o governador paga para ver até onde se estende o cacife apregoado pelo antecessor Ricardo Coutinho, estando ele desprovido do aparato institucional de poder e sem tinta na caneta que nomeia e demite. Quando era Senhor do poder Ricardo pôde bancar a ida de dois ex-presidentes da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e Dilma Rousseff, a cidades do interior paraibano contempladas com a recepção das águas do rio São Francisco. Hoje, Lula está preso e Dilma circula como barata tonta na cena política nacional. Ricardo contenta-se com as presenças de Gleisi Hoffmann, que preside o PT, e Fernando Haddad, que disputou o Planalto em 2018.
Pelo que o próprio governador revelou, sua agenda está repleta de audiências esta semana com ministros e outras autoridades para encaminhar demandas de interesse da Paraíba. Há um vasto contencioso a ser resolvido e para ele o governador está atento, evitando desviar-se do múnus administrativo para enveredar no terreno político. É certo que as eleições municipais exigirão posicionamento do governador, seja qual for, como também é certo que precisa haver uma definição sobre o comando do PSB para dimensionar se é possível a convivência com Ricardo no metro quadrado partidário. Em última análise, o governador espera que a cúpula nacional socialista seja mais proativa na condução do impasse que desabrochou na Paraíba, diante da conjuntura de acefalia que está sendo experimentada atualmente, mercê do afastamento entre os dois líderes que costuraram a vitória nas urnas em 2018.
A posição como governador, por outro lado, impede, do ponto de vista ético, que Azevêdo antecipe sinais particulares da tendência que observará a partir de agora. Ele está sendo chamado a, até mesmo, deixar o PSB, devido ao clima irrespirável internamente, e à agilidade com que Ricardo se move, acionando a direção nacional para dissolver o diretório regional e destituir o presidente, como se deu com Edvaldo Rosas. O gestor chegou a dizer a jornalistas que aguarda serenamente um marco divisor da parte da direção nacional sobre a situação específica da Paraíba. Não lhe faltarão opções caso seja impelido a deixar a sigla pela qual foi eleito. E a saída, nas circunstâncias atuais de temperatura e pressão, poderá ser encarada sob o prisma da justa causa, uma vez que Azevêdo e seu grupo estão sendo praticamente expulsos da seção socialista paraibana. A questão, de resto, está sendo tratada com muita habilidade pela direção nacional para evitar que se esfarele a hegemonia conquistada com muito esforço.
Perante a opinião pública, que acompanha desnorteada o desdobramento do impasse nas hostes do PSB, Azevêdo não quer ser tido como fraco ou traidor. Sem ser dado a bravatas, o gestor sonda seu espaço de atuação política, não descartando composições com líderes que não dialogam com Ricardo Coutinho. Só que, no seu caso, tudo é pesado e medido com uma amplitude que não é dispensada a Coutinho. Trata-se, afinal de contas, do grande teste político a que Azevêdo se submete, depois de ter passado pelo estágio eleitoral com louvor, vencendo as eleições ao Palácio da Redenção em primeiro turno. A necessidade de operar como estrategista impõe ao governador o dever de não cometer erros, já que qualquer passo em falso poderá comprometer a sua sobrevivência política, afetando, por via de consequência, o projeto administrativo que empalma. Azevêdo está sendo desafiado e repassa a ideia de que não se deixará acuar no confronto que não buscou.
Nonato Guedes