Um dos maiores compositores do Brasil, o paraibano Jackson do Pandeiro completaria 100 anos, hoje, e o marco reforça as homenagens de artistas de reconhecida expressão. Em depoimento que a TV Cabo Branco destacou, a cantora Elba Ramalho foi taxativa: Ele era o mestre do suingue. Fez uma escola no Brasil com sua capacidade de improvisação infinita, sua genialidade e, principalmente, sua humildade; era um homem do povo, um homem simples. O crítico de arte Renato Félix, no Correio da Paraíba de hoje, define Jackson como uma fonte inesgotável e diz que sua origem paraibana e o instrumento representam o encontro do forró com o samba, uma mistura da qual Jackson é o expoente máximo. São muitos os filhos musicais de Jackson do Pandeiro, acentua Félix, lembrando o fraseado, a divisão rítmica, a improvisação, a velocidade, a desconstrução dessa velocidade no meio da canção e o bom humor.
Em ensaio para a plaquete Paraíba Nomes do Século, série histórica produzida pelo jornal oficial A União, o jornalista Fernando Moura, autor de um livro-referência sobre Jackson, juntamente com o jornalista Antônio Vicente Filho, trata José Gomes Filho, natural de Alagoa Grande, como o rei do ritmo e um dos pilares da música brasileira dos anos 50 para cá, além de ter sido um gênio. Em 29 anos de carreira discográfica, ele teria sido tão carismático quanto Ataulfo Alves ou Ciro Monteiro e tão sofisticado e refinado, embora iletrado e empírico, quanto Pixinguinha, Moacir Santos ou Guerra Peixe. Em quase 500 músicas, nos cerca de 140 discos gravados, ele passeou do forró ao baião, do xote ao rojão, do frevo ao batuque, do samba ao maxixe, do chorinho ao coco. Um dos mais respeitados críticos do país, Zuza Homem de Mello afirmava que até então não surgira na música brasileira alguém com tamanha capacidade de invenção rítmica.
E justificou: Seu balanço contagiante foi recheado de instintivas invenções enriquecedoras sob as mais diversas formas: retardos e antecipações, redobradas e desdobradas, contrações, breques, acentuações, pausas, pontuações, ligaduras, enfim, novos desenhos rítmicos inexistentes nos originais, proporcionando uma aula de interpretação sincopada em cada música das que deixou gravada. Para Zuza Homem de Mello, Jackson e Luiz Gonzaga formam a dupla mais admirada e influente da música nordestina. Jackson morreu em 10 de julho de 1982, em Brasília, aos 62 anos de idade, sequelado pela diabetes que lhe perseguiu metade da vida. Fernando Moura conta que, por bastante tempo, Jackson do Pandeiro caiu no esquecimento na sua própria terra, mas, aos poucos, foi sendo ressuscitado e glorificado na mídia. Só em 1999, quando completaria 80 anos de idade, Jackson teria sua primeira grande homenagem dentro da Paraíba, através da Fundação Espaço Cultural, que o elegeu símbolo do V Fenart, quando foram realizados debates, exposições e lançado o primeiro trabalho escrito sobre a vida e obra do artista Jackson do Pandeiro O Rei do Ritmo, tendo como base de dados levantamento realizado por pesquisadores da Textoarte Editora, de Fernando Moura. Na ocasião, Almira Castilho, sua esposa e parceira durante doze anos, e a sobrinha Geralda Gomes, considerada por ele como filha, representaram a família no evento que contou com críticos de renome nacional, jornalistas e músicos paraibanos.
Ainda no início da década de 90, a Rede Paraíba de Televisão produziu um documentário de cerca de 50 minutos, contando a história do rei do ritmo, produzido pelo jornalista Rômulo Azevêdo, dentro da série A Paraíba e Seus Artistas. Foi em Pernambuco, na verdade, em pleno carnaval de 1953, que Jackson começou a ganhar projeção, antes mesmo de ter gravado seu primeiro disco, que só ocorreria em novembro do mesmo ano. Sebastiana, de Rosil Cavalcanti, seria seu passaporte para o estrelato. Jackson levou o país inteiro a dançar e xaxar na Paraíba. Diz Fernando Moura que, fiel ás suas origens, o artista sempre ressaltou o fato de ter nascido na Paraíba. Ele achava determinante na sua carreira o contato e as lições aprendidas entre Alagoa Grande, Campina Grande e João Pessoa. Foi por aqui, entre cabarés, feiras e botequins, que forjou seu talento nato. A clássica Como Tem Zé na Paraíba, de Manezinho Araújo e Catulo de Paula, foi outra escolha proposital para seu repertório. Com um enfoque metalinguístico, entre tantos Zé de Baixo e Zé de Riba, ele próprio chamou a atenção para sua origem popular: O diabo é que também me chamo Zé.
Nonato Guedes (Especial)