O Boeing decolou!. A frase do então diretor de jornalismo da Globo, Armando Nogueira, após a primeira edição do Jornal Nacional ir ao ar, em primeiro de setembro de 1969, resume o sentimento de alívio com o sucesso da empreitada. O telejornal, que nasceu embalado pela revolução tecnológica promovida pela ditadura militar, um sistema integrado de micro-ondas via Embratel, foi o primeiro programa transmitido pela Globo para todo país algo que parecia impensável. A manchete do dia, sobre o estado de saúde do presidente Costa e Silva, foi proibida pelo governo militar e substituída por um comunicado oficial lido por Cid Moreira.
O JN abriu o caminho para a novela e o entretenimento serem nacionais, a criação da televisão como se conhece hoje, relembra José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que estava ao lado de Nogueira naquele dia. O telejornal ao vivo, entre duas novelas, conquistou audiência, ganhou relevância e serviu de referência para outras emissoras. Em cinco décadas, a atração sofreu acusações de enviesamento político como nos casos da cobertura das manifestações pelas eleições diretas (1984) e do debate entre Collor e Lula (1989) mas também deu furos de reportagem e colecionou prêmios. O formato também se adaptou às mudanças. Os apresentadores hoje caminham pelo cenário e conversam entre si, informalidade que é criticada por Boni. As mulheres conquistaram espaço na bancada, antes restrita a homens, como lembra Marília Gabriela.
Para celebrar os 50 anos, o Jornal Nacional promove, desde ontem e pelos próximos três meses um rodízio de apresentadoras de todas as afiliadas da emissora. A TV Cabo Branco, de João Pessoa, terá como representante na bancada do JN, em novembro, Larissa Pereira, apresentadora do JPB Segunda Edição. Também será lançado Jornal Nacional: 50 Anos de Telejornalismo (Globo Livros) com depoimentos de 118 profissionais e ex-profissionais como é feito o telejornal. Âncora do JN desde 1996, William Bonner resume em seu texto os principais desafios do mais antigo telejornal do Brasil no ar, com a concorrência da internet, a polarização nas redes sociais e a disseminação de fake News. Para tanto, defende a importância do jornalismo profissional:
– No ambiente tão adverso para o qual a imprensa profissional tem sido empurrada, esse marco pode e deve ser celebrado por todos: os integrantes da equipe JN, o jornalismo da Globo, a imprensa profissional do Brasil, o cidadão telespectador. Por todos, em suma, que prezam e defendem a democracia brasileira ressalta William Bonner, que divide bancada, atualmente, com Renata Vasconcellos. O colunista Maurício Stycer, do UOL, teve acesso a um documento inédito que desvenda episódios de bastidores da criação do Jornal Nacional. A versão mais conhecida havia sido divulgada em 1991 por Walter Clark no seu livro de memórias O Campeão de Audiência, escrito com o jornalista Gabriel Priolli. Principal executivo da Globo em 1969, ele diz no livro que Armando Nogueira, então diretor de jornalismo, que hoje aparece como criador do Jornal Nacional, foi quem mais resistiu a ele. O americano Joe Wallach, outro executivo importante da Globo no final dos anos 1960, diz exatamente o contrário em seu livro de memórias, Meu Capítulo na TV Globo, publicado em 2011: A grande liderança na criação e expansão do Jornal Nacional era Armando Nogueira, que dirigiu o jornalismo da Globo a partir de 1966.
Uma terceira versão é apresentada por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que na época era subordinado a Walter Clark. No Livro do Boni, publicado também em 2011, ele diz que Armando Nogueira batalhou pelo projeto. Segundo Boni, as afiliadas queriam que suas reportagens fossem apresentadas por seus próprios locutores, dos seus estúdios. Já Armando insistia que elas enviassem as matérias para a sede da Globo, onde seriam lidas pelos apresentadores do JN. O Walter e o Arce (José Ulisses Arce, superintendente de Comercialização) entendiam que Armando era contra o JN. Não era nada disso. Armando e eu queríamos apenas levar o projeto a sério. E nossa tese prevaleceu. Os afiliados concordaram em fazer uma experiência. Num dos poucos depoimentos a respeito, a um colega da Globo, Armando disse que não teve a menor participação na fase de concepção do programa e imaginava que a ideia tenha sido fecundada no mais alto escalão da Globo. Enquanto eles discutiam a estratégia de lançamento, eu ia cuidando de preparar a mini-equipe do futuro JN. Ninguém nunca me ouviu sobre a ideia, contou. Ainda sem título, a biografia de Armando Nogueira que Paulo Cezar Guimarães prepara será publicada em 2020, dez anos após a morte do jornalista, pela editora Grypus.
Da Redação, com UOL