Depois daquela boutade do presidente Bolsonaro chamando os governadores nordestinos de paraíbas, em tom pejorativo, e citando que o pior deles é Flávio Dino, do Maranhão (PCdoB), o governador da Paraíba, João Azevêdo (ainda no PSB) cantou a pedra: Se ele (Flávio Dino) tiver interesse em se credenciar, tem tudo para ser o candidato das oposições ao Planalto em 2022. O nome do gestor maranhense continua em pauta para a cabeça de chapa, mas o PT, prevendo o desenrolar de fatos que escapem ao seu controle, já começou a agir no sentido de viabilizar uma chapa Fernando Haddad-Flávio Dino, em coligação, para o pleito em que o capitão reformado tentará, possivelmente, a reeleição.
A ordem emanada de Curitiba, onde reina em uma sala da Superintendência da Polícia Federal o pajé Luiz Inácio Lula da Silva, é estreitar os laços com Dino e atraí-lo para uma aliança à esquerda que, naturalmente, empolga petistas e comunistas. Haddad é o preferido como cabeça de chapa por ter sido o candidato-substituto de Lula na disputa de 2018, quando o TSE negou os pedidos de registro da candidatura do ex-presidente por razões óbvias. Além do mais, o ex-ministro da Educação e ex-ministro de São Paulo larga para 2022 com o recall da campanha de 2018 em que amealhou 45 milhões de votos, numa performance avaliada como estupenda, levando-se em conta as condições de temperatura e pressão.
A estratégia, de agora em diante, será focada no sentido de massificar a dupla Haddad-Dino, explorando afinidades entre eles e a urgência de uma tática de união no campo das esquerdas para fazer contraponto à escalada direitista que se dissemina pelo país, no bojo da ascensão de Bolsonaro. A chapa teria algumas vantagens, segundo os seus apologistas: uniria São Paulo ao Nordeste (região onde o PT é praticamente soberano); reforçaria o viés ideológico, dada a condição de Flávio Dino de filiado ao PCdoB e galvanizaria o prestígio que o governador do Maranhão tem na mídia por estar supostamente empreendendo uma gestão operosa no território que durante muito tempo foi senzala política do clã dos Sarney. Há quem mencione, também, a postura do gestor do Maranhão, flexível e não intransigente, quanto à costura de entendimentos políticos.
A chapa Haddad-Flávio Dino teria, também, a utilidade de afastar dos petistas um cálice amargo chamado Ciro Gomes, do PDT, que tem um comportamento cambiante em relação ao PT e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ora acusando o Partido dos Trabalhadores de tentar forçar para si o monopólio da oposição a Bolsonaro, ora repisando que Lula está preso, numa referência subliminar a desvios de conduta que ele teria praticado. Ciro nunca foi confiável ao PT e agora é menos ainda, com a sua recusa em endossar a indústria da vitimologia com que o PT tenta imantar a figura do seu líder maior. Sem deixar de engrossar o coro Lula Livre, Gomes acha pueril a tática de santificação da imagem de Lula.
Em um bom pedaço de tempo, na história política recente, o país assistiu à polarização renhida entre o PT e o PSDB. O confronto era colocado no nível de postura elitista (atribuída aos tucanos) versus compromisso popular (dogma do qual o PT se apropriou, sinalizando uma simbiose com os interesses dos trabalhadores. A eclosão do fenômeno Bolsonaro na conjuntura política nacional trouxe de volta o acirrado componente ideológico, fazendo com que direita e esquerda partam para o enfrentamento. Nem sempre essa discussão costuma ser forrada por argumentos teóricos sólidos, dada a precariedade de leitura e de conhecimento filosófico de expoentes das duas vertentes que estão na liça.
Mas é fora de dúvidas que a polarização ideológica tende a se acentuar, mirando prioritariamente no futuro pleito presidencial. A junção de PT e PCdoB, aparentemente, consolida o arquétipo do projeto de poder que está sendo esboçado nas franjas do território oposicionista. De sua parte, Jair Bolsonaro luta para se manter como o canalizador das opções direitistas que, pelo menos ultimamente, deixaram pudores de lado, saíram dos armários e se assumiram como reacionários de carteirinha. Não se colocam, propriamente, contra as mudanças, mas vendem a ameaça de que a esquerda significa o caos para o país. Este é o tom que predomina e que vai se elevar nos decibéis das pregações de rua, a céu aberto, para a cobiça do voto popular. Pelo menos já há uma prévia do que vai monopolizar o ano de 2022.
Nonato Guedes