O futebol argentino perdeu um dos seus goleiros mais emblemáticos. Na noite de ontem, Andrada morreu aos 80 anos, de causas não reveladas. El Gato ficou marcado no futebol brasileiro por ter sofrido o milésimo gol de Pelé em 1969 e por ter conquistado o título nacional de 1974 pelo Vasco da Gama. Nascido em Rosário em 1939, ele deu seus primeiros passos no futebol com a camisa do Rosario Central. Goleiro ágil e elástico, aos poucos ganhou projeção no clube, a ponto de ter se tornado titular absoluto entre 1960 e 1969 foi o goleiro que mais atuou na meta da equipe, com 284 partidas.
Mesmo não tendo conquistado títulos importantes no Rosario Central, suas grandes atuações o levaram a ser convocado para a seleção da Argentina, com a qual teve grandes atuações na Copa América de 1963. Em 1969, desembarcou em solo brasileiro para vestir a camisa do Vasco. E ficou marcado logo por um lance para a posteridade: em jogo válido pelo torneio Roberto Gomes Pedrosa, El Gato sofreu o milésimo gol de Pelé. No Maracanã, o argentino quase alcançou o pênalti cobrado pelo Rei e, enquanto Pelé comemorava, Andrada dava socos na grama. Ele também não escondia seu incômodo cada vez que falavam sobre o tema.
No ano seguinte, saboreou sua primeira conquista com o Cruz-Maltino. Ao lado de nomes como Gilson Nunes, Alcir, Eberval e Fidélis, Andrada sagrou-se campeão carioca. Manteve-se como titular absoluto da equipe com o passar dos anos e em 1974 fez parte de uma campanha histórica para os vascaínos. Ele era o camisa 1 da equipe que se sagrou campeã brasileira ao derrotar o Cruzeiro por 2 a 1 no Maracanã. El Gato com nomes como Roberto Dinamite, Ademir, Zanatta e Jorginho Carvoeiro. Em 76, atuou no Vitória e a partir de 77 voltou à Argentina, vestindo a camisa do Colón. Aos 43 anos, pendurou suas luvas, defendendo a meta do modesto Renato Cesarín em 1982. Em 2007, começou a trabalhador como preparador de goleiros do Rosario Central, mas uma acusação interrompeu seu ciclo no clube ele foi suspeito de participar do assassinato do militante Osvaldo Agustín Cambiaso e Eduardo Pereyra Rossi durante a ditadura militar no país. Ao ser citado, o Rosario Central pediu sua saída. Andrada negou em entrevistas ter participado do crime. Em fevereiro de 2012, o juiz federal Carlos Villafuerte Ruzo lhe concedeu inimputabilidade por falta de provas.
Na Paraíba, o gol de número 999 Na peregrinação futebolística em busca do milésimo gol, que quase fez o Brasil parar, Pelé passou pela Paraíba quando já havia atingido o nonacentésimo nonagésimo oitavo gol, faltando apenas dois para chegar ao sonho recorde dos mil. Quem relembrou o episódio foi o jornalista e escritor Severino Ramos, já falecido, em crônica na revista Ponto de Cem Réis, encartada em A União, em 17 de julho de 1994:
– Lembro-me como se fosse hoje. Era uma sexta-feira, 14 de novembro de 1969, o prefeito Damásio Franca decretou até feriado municipal a partir do meio-dia. Bancos e repartições fecharam para o pessoal ver a chegada da delegação do Santos, que vinha de ônibus do Recife e foi direto para o Palácio da Redenção, onde o governador João Agripino prometeu a Pelé que se ele fizesse o milésimo gol na Paraíba o governo mandaria erguer uma estátua para ele, maior do que a de João Pessoa. Pelé respondeu com aquele seu sorriso de simpatia e nada prometeu. À noite, a Paraíba em peso acorria ao Estádio Olímpico onde poderia acontecer o mais espetacular acontecimento esportivo do século. A imprensa do mundo inteiro acompanhava a delegação do Santos com os mais sofisticados equipamentos para registrar o gol número mil. O Santos jogou nessa noite contra o nosso glorioso Botafogo, que perdeu de 3 a 0. Mas estava escrito que Pelé não faria o milésimo gol em João Pessoa. Não só estava escrito, como decidido, pela diretoria do Santos, que estava faturando uma nota. Tanto assim que antes de começar o jogo o técnico do Santos, Antoninho, chamou a imprensa e informou que o goleiro titular, Aguinaldo, estava sem condições de jogo. Em seu lugar entraria o reserva Estêvão. Se este também se contundisse, já se sabia o que fazer: Pelé poderia substituí-lo. Já havia um precedente num jogo do Santos contra o Grêmio de Porto Alegre, quando Pelé atuou como goleiro. E foi o que aconteceu naquela noite no Estádio Olímpico. Aos quatro minutos de jogo, toda a torcida prendeu a respiração quando Pelé acertou uma bola na trave. De outra feita, Pelé driblou dois adversários e chutou forte, tendo a bola batido novamente no travessão. O público aplaudiu e chegou a pedir gol, mas o juiz não confirmou. Aos 14 minutos, Manuel Maria foi derrubado na área. O juiz marcou pênalti e a torcida gritou, em coro, o nome de Pelé. O técnico do Santos autorizou Pelé a bater a penalidade. Depois de conversar alguns minutos com os companheiros, ele bateu, ficando o placar em 3 a 0 e assinalando o nonacentésimo nonagésimo gol de sua gloriosa carreira. A partir daí, Pelé recuou, praticamente apagando-se em campo, não chegando nem mesmo à linha divisória. Faltando 15 minutos para terminar o jogo, o goleiro do Santos, sozinho, sem ninguém tocar nele, contundiu-se, caiu, contorcendo-se no chão, o estádio em peso pensando que tinha sido um ataque de epilepsia. Não era nada disso. Havia sofrido uma bruta contusão, ninguém sabe aonde. Mais que depressa, o técnico do Santos mandou um recado para Pelé ir para o gol já que o titular estava sem condições de jogo. Pelé ainda brindou a assistência com três excelentes defesas que teve a oportunidade de fazer durante os seus 15 minutos de goleiro. O milésimo gol estava reservado para o Maracanã, com todo o cenário montado, inclusive, o pênalti providencial e histórico. Contra Andrada.
Da Redação, com agências