No dia 19 de maio de 2003, há pouco mais de 17 anos, o então deputado estadual Ricardo Coutinho oficializou a decisão de se desfiliar do Partido dos Trabalhadores, onde já não identificava espaços de convivência. Em entrevista coletiva, admitiu que havia sido uma difícil ruptura afinal, haviam sido 20 anos de militância numa legenda que nasceu como utopia e cresceu como pão-de-ló, vivendo seu maior instante exatamente naquele ano ao empalmar a presidência da República, enfeixada por Luiz Inácio Lula da Silva, então vivenciando o primeiro mandato, ainda deslumbrado com os palácios de Brasília e as mordomias da presidência. Ricardo filiou-se, na sequência, ao PSB, e o pivôt da sua saída do PT, pelo qual iniciara trajetória política, foi o boicote à sua pretensão de disputar a prefeitura de João Pessoa para dar lugar à imposição de outro candidato como o ex-deputado federal Avenzoar Arruda. Coutinho deu o troco em alto estilo, elegendo-se em primeiro turno prefeito da Capital e, em 2008, reelegendo-se pelo PSB.
Para exemplificar que não era um político oportunista, Ricardo deixava claro que estava deixando o PT quando muitos procuravam ingressar nele, pegando carona na onda vermelha que conduziu Lula ao Planalto. Explicou que sua situação no PT era absolutamente desconfortável, constantemente na alça de mira da cúpula, que acenava com punições caso se rebelasse contra a decisão de lançamento de outro candidato à prefeitura. Coutinho sentiu-se maltratado e queixava-se que seu histórico de luta e de contribuição para o fortalecimento da legenda nas horas difíceis não foi levado em conta. A gota dagua para a sua saída foi uma missão do presidente nacional, José Genoíno, na Paraíba, quando sinalizou preferência por uma virtual candidatura de Avenzoar. Como desdobramento, Avenzoar figurou em inserções institucionais de propaganda do PT no rádio e na TV, mesmo sem ser dirigente partidário. Acho que, apesar dos meus defeitos, ajudei a construir algo de positivo e a fortalecer perspectivas do PT, comentou ele.
Avenzoar, por sua vez, reagiu afirmando que Ricardo Coutinho sempre priorizara interesses personalistas em detrimento dos objetivos do partido. 48 horas após a desfiliação de Ricardo, a Executiva petista municipal lamentou a defecção do parlamentar, mas sustentou que fora uma decisão de caráter estritamente pessoal, uma vez que todos os espaços estatutários foram assegurados para que ele expressasse sua candidatura. A Executiva estadual referendou a decisão da direção municipal, endossou as alegações sobre o comportamento do filiado Ricardo Coutinho e deixou claro que o Partido dos Trabalhadores teria candidato a prefeito em 2004 para vencer, em consonância com as diretrizes nacionais da legenda. Ocorreram desfiliações de sindicalistas e lideranças comunitárias do PT na esteira da defecção de Ricardo Coutinho, mas a cúpula estadual minimizou a extensão dos desfalques. Ricardo, por sua vez, passou a participar de plenárias e reuniões com agrupamentos sociais a pretexto de discutir alternativas para a Capital que, a seu ver, ressentia-se de um Plano Diretor para enfeixar metas e estratégias de crescimento urbano.
Ricardo começou um paciente de trabalho de sobrevivência política e reacomodação partidária e fixou sua atenção no Partido Socialista, então dirigido nacionalmente pelo ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes, uma legenda da esquerda no Nordeste e no país. Travou quedas-de-braço com a deputada Nadja Palitot e com remanescentes de grupos do PMDB que estavam infiltrados no agrupamento socialista. O trunfo decisivo para a aceitação de Ricardo nas fileiras do PSB, naquela época, parece ter sido pesquisa de opinião pública que ele encomendou e que apontou seu amplo favoritismo, batendo os mais diversos postulantes em quaisquer cenários dos que foram apresentados pelos entrevistadores do instituto contratado. No confronto final, Ricardo Coutinho bateu no voto o atual deputado federal Ruy Carneiro, do PSDB, que era chefe da Casa Civil do prefeito reeleito de João Pessoa, Cícero Lucena, e tentou uma massificação de sua imagem desenvolvendo um projeto administrativo intitulado Se eu fosse prefeito. Coutinho venceu em coligação com o PMDB, tendo como vice o então deputado estadual Manoel Júnior, que logo se desentendeu com ele e em 2006 disputou e venceu uma vaga na Câmara dos Deputados.
Ricardo Coutinho candidatou-se duas vezes a deputado estadual pelo PT, ficando na oitava e na quarta suplência, mas passou a adquirir votações crescentes que lhe possibilitaram eleições à Câmara Municipal de João Pessoa. Em 1998, fimalmente, foi o deputado estadual em João Pessoa, alcançando em todo o Estado cerca de 25.388 votos. Na Assembleia Legislativa, destacou-se como líder da oposição ao governo José Maranhão (PMDB) e presidente da Comissão de Saúde. Na sua primeira eleição a prefeito de João Pessoa, ganhou no primeiro turno com 215.549 sufrágios, sendo reeleito em 2008 tendo como vice o arquiteto Luciano Agra. Renunciou à prefeitura para concorrer ao governo do Estado, o que fez em 2010, derrotando José Maranhão, entre outros postulantes. Em 2014, foi reeleito derrotando Cássio Cunha Lima (PSDB) como principal oponente eles haviam sido aliados na campanha de quatro anos atrás. Enfim, em 2018, Ricardo declinou de disputar uma candidatura ao Senado, para a qual era tido como favorito, e investiu energias na vitória de João Azevêdo e na derrota de Cássio Cunha Lima, episódios que acabaram se materializando. No começo de 2019, passou a emitir sinais de afastamento de João Azevêdo, o que culminou, agora em setembro, com o ensaio de rompimento e o impasse pelo controle do PSB.
Nonato Guedes