Com a proximidade das eleições municipais que serão travadas no próximo ano, os partidos políticos têm se articulado no Congresso para aprovar leis e dispositivos de financiamento de campanhas com recursos oriundos do erário. Este tem sido, ao longo da nossa história, o caminho mais fácil para candidatos, de um extremo a outro da política da esquerda mais radical à direita mais raivosa que tem procurado reocupar espaços pegando carona na eleição de Jair Bolsonaro para presidente. Os contribuintes já sinalizaram que não estão mais dispostos a pagar a conta salgada que possibilita a ascensão de políticos a mandatos de projeção ou visibilidade. Para falar a verdade, uma parcela expressiva da opinião pública tem nojo da política.
Com a ascensão do Partido dos Trabalhadores ao poder, o país tomou conhecimento, em detalhes, da engrenagem que permeava o funcionamento do chamado caixa dois uma prática ilícita de arrecadação de dinheiro, utilizada a pretexto de juntar fundos para o custeio de despesas com propaganda eleitoral e que acabou se revelando um escoadouro de lavagem da verba suja, rateada de modo a engordar o patrimônio pessoal dos candidatos, dos dirigentes de partidos, dos empresários e de outros alegados financiadores de campanhas. Em nome da democracia, sob a qual inúmeros crimes são cometidos diariamente no Brasil, criou-se a denominação de dinheiro não contabilizado. Em outras palavras, recursos não declarados oficialmente à Justiça Eleitoral.
A expressão foi popularizada depois que saiu da boca de Delúbio Soares, o engenhoso tesoureiro de campanhas presidenciais do Partido dos Trabalhadores, quando foi confrontado, na esfera do Tribunal Superior Eleitoral, sobre o montante de recursos financeiros e, em paralelo, sobre a destinação que tiveram tais recursos. Foi esse dinheiro não contabilizado que ensejou o escândalo do mensalão, cuja origem remonta, na verdade, ao PSDB de Minas Gerais, por artes de Marcos Valério, na campanha de Eduardo Azerêdo ao governo do Estado. Posteriormente, o modelo foi transplantado pelo Partido dos Trabalhadores, que o considerou bastante criativo e prático. O PT fez mais: importou para as suas fileiras Marcos Valério, o carequinha, como era conhecido, para que ele desenvolvesse nos computadores da legenda do ex-presidente Lula o programa que permitisse a injeção de verbas a pretexto de irrigar disputas eleitorais.
Deu cadeia, como se viu ao longo do julgamento histórico efetuado pelo Supremo Tribunal Federal em torno, especificamente, do mensalão. Os depoimentos tomados, as revelações feitas com precisão surpreendente, tudo isso estarreceu ministros da mais alta Corte do país e advertiram-se os excelentíssimos senhores ministros para a gravidade de aberrações que vinham sendo cometidas nas próprias barbas deles, sem qualquer indício de punição, já que, até então, o Supremo mantinha-se desinformado do que era praticado nos subterrâneos do poder e das cúpulas partidárias, convertidas em caudatárias de crimes imperdoáveis. Um dos ministros com assento na Corte chegou a qualificar o mensalão como um ponto fora da curva, algo que não estava no script e, portanto, fora da ordem legal.
Passada essa fase nebulosa da vida pública brasileira, que teve ampla repercussão negativa no exterior, em meio, ainda, ao quebra-cabeças dos partidos sobre como administrar o financiamento de campanhas de agora em diante, eis que funcionários burocratas de gabinetes do PT na Câmara Federal fornecem a chave para sepultar, de vez, os mensalões e mensalinhos. A saída, ao alcance de qualquer um, está no velho bolão da Mega-Sena, ou de qualquer loteria que por lei seja autorizada a funcionar no território nacional. Foi através da contribuição, estipulada, no mínimo, em dez reais, de cada assessor parlamentar de gabinetes de deputados petistas, que choveu dinheiro nas hortas deles, despertando, naturalmente, a ciumeira dos adversários petistas que não haviam atentado, ainda, para essa alternativa tão elementar, tão curial, de acumular dinheiro.
Não há convicção, ainda, de que a estratégia venha a ser posta em prática na campanha eleitoral do próximo ano para respaldar candidaturas que padecem de recursos financeiros para decolar ou, até mesmo, para puxar outras candidaturas em estágio declinante. Mas, por via das dúvidas, o bolão incentivou o recurso à criatividade, de forma exaustiva, para que, sem burlar a lei e, muito menos se desgastar, candidatos e partidos possam dispor de dinheiro caído do céu para pavimentar suas jornadas na caça ao voto em 2020. A conferir, evidente!
Nonato Guedes