Na noite da última quinta-feira, saí de casa pela avenida Beira Rio embaixo de um céu luminoso, jamais, devorando os sinais vermelhos para chegar na hora marcada ao Tribunal de Contas do Estado e receber o Diploma de Mérito Cultural 2019, bem longe dos súditos, dos que se acham o máximo escambau.
Eu ia, ia, ia numa antropofágica alquimia e, sozinho em meu vasto C3 vermelho, passando pelos vilarejos e barracos da favela, recebendo a brisa que o Brasil beija e balança, entre as árvores da Beira Rio, a Terra, as pedradas junto aos meninos “com seus paus crescendo” jogados nas faixas pedindo passagem.
Danem-se os feios da beleza da vitrine, no rastro da propaganda da lente do Fantástico na tevê em modo avião, quando eu não acho mais a voz americanizada de Paulo Henrique Amorim – olá, tudo bem? Tudo mal.
Não que eles não sejam também superbacanas e narcísicos, mas é que para americano, como diz Caetano, “branco é branco, preto é preto (E a mulata não é a tal) Bicha é bicha, macho é macho, Mulher é mulher e dinheiro é dinheiro. Americanos sentem que algo se perdeu, algo se quebrou, está se quebrando”. Esquece.
Impossível olhar para aquele lugar e não imaginar a Liberdade. #estátua. Nada de ser contaminado pelo bombardeio sísmico que nos atinge em todo raio e que faz com que nos percamos dentro de nossas vísceras e verduras e seus cânceres e agrotóxicos que usam e abusam, próprios de pensamentos vazios, que vão e vêm. Ora, outro dia, um amigo de Sampa me disse que quem tem cabeça ruim, tem odor de cabeça e não dor. Está certo. Mas vamos voltar ao tema? Obrigado Marcílio Franca e Flávio Sátiro, pelo diploma ao K conferido. Meu compadre Marcílio também recebeu e estava lá com a professora Alessandra e seu caçula Theo.
Mas, se temos um cérebro eletrônico a mais, mesmo que esteja no mercado à deriva, e é lá de riba que chegam as ideias, é possível também esforçar-se para ir para fora disso, mesmo que sejamos sempre tragados de volta, e o esforço seja mais contínuo, mas quem anda para trás é caranguejo. Ou seria de lado? De lá só o Trump, pode arrasar? Te dana!
Daí ser ou não ser apenas importante gente, mas mais exatamente vital – no sentido de que só assim é possível se sobressair nesse cu de mundo e, claro, sobreviver e ter em vista algo bacana, fora de nós, algo maior do que nós, do qual fazemos parte e perante o qual somos personagens, o mundo.
Ódio a bala que diretamente matou a menina Agatha, mas amanhã virá outra bala que embala essa crueldade chamada Brasil. Ninguém resolve nada. Sim, eles arrasam com projeteis de bala com os projetos de vida dos outros. Que vida, vadia ou socada? A grande doença da arte e da sociedade contemporânea é essa de lavar roupa com sangue. Alguns vão de verde e rosa, entre eles, eu o velho solitário.
Nosso ódio a ideia de ser ultrapassado é como se houvesse um acordo tácito de que somos todos canalhas-querendo-ser-bacanas, de modo que ninguém sente-se à vontade para passar à frente ou na frente dos entulhos. E aí, alguém ousou, sob o risco de ser qualificado de hipócrita? Quem? Por que?
Nem tudo é vaidade. Nem tudo é verdade.Uns loucos e outros pobres de carinho. Somos pó. Alguns idiotas não constroem algo maior do que eles: uma canção que seja, um poema, uma família. Outros mais espertos botam o bloco na rua e são canalhas, simplesmente não conseguem evitar os holofotes.
Ah! Se eu soubesse faria uma modinha para tocar depois do carnaval, no Pelourinho de Salvador, (só pra lembrar: tem uma música nova de Chico César no CD “O Amor é um Ato Revolucionário”), que diz que o cara adora carnaval na Bahia e odeia nordestino) lindo de morrer e ali não encontrarei mais os personagens que matei em algum momento da crônica, em meio a toda a nossa sujeira, para ser melhor do que realmente somos, nós fulanos latinos americanos.
O fato é que podemos ir bem mais. Isso é banal? Tire os óculos de sol e veja que estamos sem máscaras. Cara a cara. Tá craude brô, você e tu lhe amo.