O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, economista paraibano, afirma em seu blog na revista “Veja” que ideias antigas perseguem os brasileiros e enfatiza que teorias conspiratórias e fanatismo ainda assombram o país. Ele diz que concepções sobrepujadas pelo conhecimento e pelo avanço civilizatório continuam firmes no Brasil, mencionando que três delas reemergiram recentemente. A primeira, no governo federal, invocou a teoria conspiratória da cobiça internacional por nossa Amazônia. A segunda, da mesma esfera, recorreu à tese de que ficaremos ricos com a floresta. A terceira, do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, investiu contra um gibi que exibia um beijo entre dois homens.
– O medo de uma invasão da Amazônia por potências estrangeiras preocupou o Brasil por muito tempo. Baseava-se na era dos grandes impérios, que buscavam poder e prosperidade via expansão territorial. Isso dependia de reunir recursos humanos, materiais e financeiros para invadir, ocupar e explorar países bem-dotados de matérias-primas, ouro e prata. A estratégia perdeu sentido no fim do século XIX. Desde então, um dos poucos líderes a adotá-la foi, de fato, Adolf Hitler – externa Maílson da Nóbrega, lembrando que a ideia de que recursos naturais asseguram por si sós a ascensão ao status de país rico ainda permeia muitas mentes. “Havia sido assim, dizia-se, na elevação do Reino Unido à condição de potência mundial. O gigantesco império britânico se nutria de matérias-primas das colônias, que eram também mercado para seus produtos manufaturados. O historiador escocês Niall Ferguson desmontou a tese ao provar que as colônias corresponderam a apenas 16% da sua prosperidade”, observa Nóbrega.
O ex-ministro cita que o Reino Unido continuou a progredir após a descolonização por uma razão clara: as fontes básicas do crescimento da economia são o investimento, o capital humano e a produtividade. “O conhecimento vale mais do que matérias-primas. Os territórios ocupados não foram tão relevantes para o êxito dos conquistadores. Os Estados Unidos são bem-dotados de recursos naturais. A extensão de terras férteis em zona temperada, mais favorável à agricultura, dificilmente tem paralelo. Se recursos naturais bastassem, a Venezuela não viveria uma tragédia humanitária. Mais de 5 milhões de venezuelanos foram embora, o que, segundo a ONU, reduziu a população em quase 12%. A abundância do petróleo não enriqueceu a Nigéria. Possuir riquezas em seu território não é tudo. Há que criar condições para sua extração e processamento, o que requer instituições, tecnologia, bons governos e educação de qualidade”, salienta Maílson da Nóbrega.
Quanto à atitude do prefeito do Rio, Marcelo Crivella, de investir contra um gibi que exibia um beijo entre dois homens, Nóbrega avalia que ele recorreu à Justiça para contentar grupos religiosos obscurantistas, “mas nos transportou à Idade Média; nessa época, o fanatismo cristão contra pagãos destruiu obras de arte tidas como obscenas, demoliu templos e queimou livros. Apenas 1% da literatura latina sobreviveu”. Maílson conclui com uma advertência: “O Brasil não avançará de verdade enquanto líderes governamentais insistirem em ideias que o tempo já condenou”.
Nonato Guedes