Nonato Guedes
O desembargador Ricardo Vital, do Tribunal de Justiça do Estado, em complemento à quinta fase da Operação Calvário, apontou pela primeira vez, ontem, o envolvimento de um político no exercício de mandato eletivo com práticas ilícitas detectadas na gestão pública. O magistrado resolveu incluir a deputada Estelizabel Bezerra (PSB) nas investigações como suspeita de participar do esquema de desvio de recursos e de relação com Daniel Gomes da Silva, tratado como proprietário da Cruz Vermelha Brasileira e pivôt de todo o escândalo de corrupção que vem sendo apurado na Paraíba, com respingos nas áreas de Saúde e Educação. Estelizabel Bezerra é jornalista, ligada ao grupo do ex-governador Ricardo Coutinho, presidente da comissão estadual provisória do PSB e perdeu a eleição para a prefeitura de João Pessoa em 2012, depois de ter sido indicada por Ricardo, que preteriu a pretensão do então prefeito Luciano Agra de buscar a reeleição.
Há indícios, conforme Ricardo Vital, da vinculação de Estelizabel Bezerra a determinadas condutas criminosas cujo envolvimento aguarda diligências em andamento e que estão protegidas por sigilo. Pela análise do vasto material apreendido nas investigações, a criação da filial da Cruz Vermelha na Paraíba, além de teoricamente ensejar redução da estrutura administrativa montada no Rio Grande do Sul, permitiria que Daniel Gomes atuasse com duas filiais em supostos esquemas criminosos, inclusive, viabilizando a sua manutenção no mercado das organizações sociais, caso uma das filiais viesse a ser julgada inidônea. Nesse ponto, o magistrado questiona o motivo pelo qual Daniel Gomes optou por nomear Mayara de Fátima Martins de Souza, que estava lotada como chefe de gabinete da deputada Estelizabel Bezerra, como presidente da CVB/PB.
Para Ricardo Vital, provavelmente Daniel Gomes tenha permitido que a deputada fizesse indicações semelhantes à de Mayara Martins no âmbito da organização social IPCEP, sendo necessário o aprofundamento das investigações. Até o final da tarde de ontem, a deputada ou sua assessoria não haviam se manifestado sobre os fatos novos que a envolvem. Estelizabel Bezerra tem feito discursos e concedido entrevistas questionando as ações do Ministério Público na Paraíba e cobrando o direito ao contraditório e à ampla defesa de pessoas arroladas. A deputada, igualmente, tem defendido com veemência o ex-governador Ricardo Coutinho em diferentes episódios, inclusive, na destituição do diretório estadual do PSB, que ele apoiou. A deputada foi indicada para presidir a comissão provisória do diretório municipal do Partido Socialista em João Pessoa, facilitando os passos para referendar a unção de Ricardo como candidato a prefeito no próximo ano. Ela tem prerrogativa de foro (imunidade) por estar no exercício parlamentar, mas Ricardo Vital pondera que há possibilidade de ser produzida prova contra ela, daí porque a competência permanece inalterada no âmbito do Tribunal de Justiça.
A determinação do desembargador foi proferida, ontem, nos autos de uma Medida Cautelar Inominada ajuizada pelo Ministério Público da Paraíba. Foram expedidos novos mandados de busca e apreensão, com afastamento de sigilo telemático, no bojo da Operação Calvário, com a finalidade de realizar a apreensão de quaisquer evidências relacionadas aos crimes contra a administração pública, em especial corrupção, peculato, fraudes licitatórias, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ricardo Vital é categórico: “A investigação levada a efeito no PIC 01/2019 objetiva aferir se, efetivamente, houve o desencadeamento de uma plêiade de condutas complexas, perpetradas por uma organização criminosa que teria se instalado no governo da Paraíba, inserindo-se, portanto, essa busca, no contexto da investigação relacionada à ORCRIM, a qual possui vínculos com pessoas que detêm prerrogativa de foro”.