Nonato Guedes
Aliados do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) que se julgavam confortavelmente amparados no guarda-chuva da administração estadual até dezembro de 2018, começam a passar recibo de desalento com a orfandade do poder por não encontrarem abrigo fácil na gestão do atual governador João Azevêdo. Revelam “em off” que apostaram na continuidade do projeto socialista, com o prestigiamento de remanescentes da Era Ricardo, alguns dos quais originários, ainda, dos mandatos empalmados por RC na prefeitura de João Pessoa em duas ocasiões, mas perderam cargos e espaços de influência. E lamentam abertamente a falta que faz a prefeitura da Capital paraibana, enfeixada nas mãos de um adversário de Ricardo, o bi-prefeito Luciano Cartaxo, do PV.
Os relatos dão conta de que havia a expectativa natural de acomodação na gestão Azevêdo, senão com a permanência em cargos em que os “ricardistas” se encontravam, pelo menos com o aproveitamento mediante remanejamento para outras funções executivas relevantes. A leitura das edições do “Diário Oficial” desde a investidura de Azevêdo tem sido, porém, um “suplício de Tântalo”, na definição de um ex-secretário influente, para quem estava acostumado com a mordomia do governo, mercê das demissões constantes de ex-auxiliares ou ex-assessores de Ricardo Coutinho. A última mudança alcançou a área de Comunicação Social, respingando na rádio Tabajara e no jornal “A União”. Mas há casos de maior dimensão, afetando a posição de figuras que estavam abancadas em secretarias de alto nível e prestígio.
Nos bastidores, fala-se em “desricardização” total do governo João Azevêdo, da mesma forma como no segundo governo de Tarcísio Burity, na década de 80, houve a “desbragatização” com demissões em série de apaniguados da gestão Wilson Leite Braga, que havia se investido pelas urnas no pleito de 1982, quando o candidato do PDS, sucedâneo da Arena, derrotou Antônio Mariz por cerca de 151 mil votos. Já Burity, que governou, pela primeira vez, por via indireta, a partir de 79, voltou ao poder pelo voto em 1986, derrotando Marcondes Gadelha (PFL) por 296 mil votos de diferença. Marcondes foi o candidato lançado por Braga depois que o ex-vice-governador e empresário José Carlos da Silva Júnior resignou à candidatura ao governo, alegando pressões para ser o “trem-pagador” das campanhas de vários candidatos, papel a que não estava disposto a se submeter. No meio-termo da quadra política em que braguistas e buritizistas passaram a se hostilizar, inúmeras pessoas foram jogadas no meio do caminho porque não se enquadravam ao novo figurino dominante no poder de plantão.
Em relação a Ricardo Coutinho, os aliados descontentes, que sempre se manifestam “em off” por não quererem bater de frente com o ex-chefe, ponderam que se RC tivesse concorrido ao Senado nas eleições do ano passado teria grandes chances de vitória, dispondo não somente de uma tribuna para fazer face a denúncias que têm sido vazadas de inquéritos da Operação Calvário sobre supostas irregularidades em contratos de gestão pactuada com organizações sociais nas áreas da Saúde e da Educação, mas também estaria fortalecido com um instrumento para manter a “sobrevida” de remanescentes da sua Era que passaram a ser tratados a pão e água na gestão de Azevêdo, especialmente quando ficou patente o rompimento entre os dois comandantes da campanha vitoriosa ao governo em 2018. Da mesma forma, alega-se que se Ricardo tivesse lançado candidaturas realmente competitivas à prefeitura de João Pessoa, nas disputas de 2012 e 2016, hoje contaria, folgadamente, com um suporte para não deixar à deriva os que seguraram cartazes com seu nome nas eleições de que participou num arco temporal de quase 20 anos.
Entretanto, de forma impositiva, que é a faceta maior do seu estilo personalista, o ex-governador Ricardo Coutinho tirou do bolso do colete para candidatas à prefeitura Estelizabel Bezerra, em 2012, e Cida Ramos, em 2016. Nenhuma delas havia sido testada na disputa de cargos executivos – conquistaram a deputação estadual com o reforço do governo Ricardo e com outros recursos de que dispunham. Estelizabel e Cida não lograram, sequer, ir para o segundo turno nos prélios à prefeitura da Capital – em 2012, Luciano Cartaxo acabou tendo como adversário o então senador Cícero Lucena, do PSDB, e em 2016 liquidou a parada no primeiro turno, sem maior esforço. “O rompimento com João Azevêdo agravou a falta de perspectiva de sobrevivência dos ricardistas”, confidencia uma fonte ligada ao ex-governador, arrematando: “O pior é que, agora, nem mesmo há certeza de que uma virtual candidatura de Ricardo a prefeito de João Pessoa em 2020 venha a ser vitoriosa ou sensibilize o eleitorado”. A cobrança, velada, é no sentido de que Coutinho abandone, de uma vez por todas, o estilo personalista e aja no sentido de agregar, sob pena de perder a liderança de um expressivo contingente de órfãos de poder no Estado.