Nonato Guedes
Pelo seu temperamento passional, o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), que está embarcando para a Espanha a fim de prestigiar seminário político, dá-se ao luxo de escolher aliados e adversários “de estimação” nos embates que tem travado na Paraíba. Em 2018, a título de exemplo, ele se obstinou em contribuir para derrotar Cássio Cunha Lima (PSDB), de quem já foi aliado, na disputa deste para reeleger-se ao Senado. Cássio não foi reeleito e está, temporariamente, fora da liça. O alvo predileto de Ricardo e sua metralhadora, em 2020, será o prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PV), independente de RC figurar ou não como candidato à sua sucessão. Ele baterá forte, como já vem batendo, na gestão de oito anos que Cartaxo completará. O mote consiste em apontar falhas cruciais da atual administração pessoense, bem como tentar desconstruir a narrativa de Luciano de que a Capital deu visíveis saltos progressivos na sua Era.
Providencialmente, Ricardo passará ao largo de um tema incômodo para ele – a sua má vontade em firmar parceria efetiva com as gestões de Cartaxo. A menção a esse fato desagrada a Ricardo porque põe a nu a falta de espírito republicano, da sua parte, para conviver com o contrário. O ex-governador não pode ignorar que a relação belicosa mantida com a prefeitura de João Pessoa prejudicou, diretamente, a população desta metrópole, ficando paralisado um contencioso de demandas que requeriam intervenção conjunta do Estado e município. O equacionamento dessas demandas teria sido fundamental para a Capital paraibana destravar gargalos e partir, célere, para sinais plenos de desenvolvimento. Ricardo optou por fazer política com o fígado, desprezando parcerias com Cartaxo como represália porque duas candidatas que ele lançou à prefeitura – Estelizabel Bezerra e Cida Ramos, não lograram abater o alcaide atual nas urnas.
A ausência de “diálogo institucional” com a prefeitura de João Pessoa não quer dizer que à frente do governo do Estado Ricardo Coutinho não tenha investido em obras e serviços na Capital, com os recursos próprios do orçamento. Tendo nascido aqui, vivenciado experiências pelos seus logradouros e demais caminhos e tendo tido o privilégio de governar por duas vezes o solo que lhe serviu de berço e lhe deu triunfos eleitorais retumbantes, seria preciso ser muito inafetivo para não premiar a Capital com o que ela merece, não por favor ou concessão demagógica, mas por imperativo da sua importância no contexto geográfico da Paraíba e, no contexto político, como “tambor”, segundo definição clássica do monarquista Otinaldo Lourenço ao se referir à condição de “caixa de ressonância” empalmada pela antiga Felipéia de Nossa Senhora das Neves.
O Centro de Convenções e o teatro A Pedra do Reino são obras ilustrativas do “portfólio” de realizações da administração de Ricardo Coutinho como governador, sem falar em “intervenções” decisivas na infraestrutura urbanística da cidade e em projetos de alargamento de espaços concebidos com dentro da filosofia de ajustar a Capital da Paraíba ao ciclo de crescimento que lhe está destinado e que não tem mais retorno, porque é inexorável como um dever dos poderes públicos e como uma aspiração legítima da população, traduzida em cobrança permanente. Aplausos para Ricardo, por óbvio. Mas, também, críticas ou censura pela atitude intransigente na relação com o executivo municipal, movido por idiossincrasias que não fazem jus a perfis de grandes homens públicos.
Sendo ou não candidato a prefeito, o que menos chama a atenção de Ricardo Coutinho, até onde se conhece o seu estilo, é saber o nome ou o rosto da candidatura à sucessão que Luciano Cartaxo pretende retirar do bolso do colete para lastrear a retórica de que o projeto por ele dirigido precisa ter continuidade porque dispõe de aprovação popular e tem se revelado, dentro das limitações, eficaz para corresponder a expectativas dos diversos segmentos quanto a ações pontuais do poder público. O plebiscito, na visão de Ricardo, é da gestão de Luciano, especialmente do que deixou de fazer, ou do que possa ter feito de errado que, porventura, não coincidiu com o verdadeiro interesse público. Há quem especule que outro “alvo de estimação” do ex-governador será o candidato ou candidata que o governador João Azevêdo lançar à disputa pela prefeitura pessoense. Coutinho, como se sabe, declarou guerra a Azevêdo, com intervalos de armistício, abespinhado com certas decisões do sucessor e, ao mesmo tempo, “envenenado” por insinuações envolvendo o rumo da Operação Calvário. Ele e Azevêdo não deverão dividir o mesmo palanque no próximo ano. E ter como “adversários de estimação” o atual prefeito da Capital e o atual governador do Estado, convenhamos, já estará de bom tamanho para o ego passional do mentor dos girassóis políticos.