Nonato Guedes
O “Jornal Nacional”, da Rede Globo de Televisão, que está completando 50 anos no ar, teve Cid Moreira como um dos seus ícones, na condição de apresentador do noticioso de 1969 a 1966. Em depoimento para o livro “JN – 50 Anos de Telejornalismo”, Cid abriu-se na narrativa de algumas histórias marcantes de bastidores sobre o período em que esteve sentado na bancada, em horário nobre. “Eu sabia da responsabilidade de apresentar o Jornal Nacional. Até hoje, aonde vou, sou reconhecido. Mas quando você está falando para milhões de pessoas, como falei durante 27 anos, não dá para se preocupar com isso”, contou Cid Moreira.
E prosseguiu: “Eu gostava mais das notícias de grande impacto. Tem uma coisa que eu sempre digo: o apresentador é um ser humano como outro qualquer, mas o verdadeiro profissional não pode se deixar tomar pela emoção. Quando morreu o poeta Carlos Drummond de Andrade, fizemos um “boa noite” diferente. No final do jornal, eu sussurrei: “E agora, José?”. Uma homenagem-referência a um dos mais conhecidos e emblemáticos poemas de Drummond. “Ninguém esperava isso. Fizeram uma fila para me cumprimentar e, até hoje, me sinto honrado”. O “Jornal Nacional” foi ao ar em setembro de 1969, apresentado por Cid Moreira e Hilton Gomes. Estreou às 19h45 e concorria com o Repórter Esso, da TV Tupi, apresentado por Gontijo Teodoro. Lembra Cid que houve um nervosismo geral na estreia.
– Cheguei no horário de fazer o jornal, não participava da redação, mas vi todo mundo preocupado. Era um jornal em rede nacional. Eu sabia, mas não tinha a dimensão. Tinha na cabeça a ideia de rádio, que, pela facilidade, estava em todos os lares. Quando o JN foi lançado, usavam-se links de micro-ondas, ligando Rio, São Paulo, Porto Alegre e Curitiba. Com o satélite é que se tornou nacional. Em 1975, grande parte da programação da Globo passou a ser exibida simultaneamente para todo o Brasil. Em 1982, toda a programação era transmitida via satélite para as então cinco emissoras e 36 afiliadas. Os textos das notícias eram batidos em mimeógrafos e as folhas soltavam tinta. Eu lembro de Alice-Maria, então editora nacional, toda manchada de roxo. Eu preferia ler no papel que soltava tinta mesmo porque era mais nítido. Geralmente a cópia do mimeógrafo vinha com falhas. E eu queria ter a certeza do que estava lendo. Às vezes, transpirava, passava a mão naquela tinta, me coçava e ficava pintado de roxo. No intervalo, alguém gritava: “Passa um pano!”. Era um drama danado. E hoje temos essa instantaneidade com a informática – ressaltou Cid Moreira.
Quando Hilton Gomes saiu, em 1971, Cid Moreira ficou apresentando o jornal sozinho durante um mês e meio, dois, mais ou menos. Todos os dias. Hilton Gomes foi substituído por Ronaldo Rosas, que permaneceu na emissora por um ano. Então, veio o Sérgio Chapelin. Diz Cid Moreira que a introdução do teleprompter, aparelho que fica abaixo da câmera e que projeta o texto para o locutor, foi “uma maravilha”. O Jornalismo da Globo começou a utilizar o sistema em 1971. Até então, Cid sempre mentalizava as notícias, mas era impossível decorar o jornal todo. Daí, surgiram algumas regrinhas. Por exemplo: o redator dividia as palavras como “per-fume”. Colocava “fume” na linha de baixo. Assim, você batia o olho e via tudo. A outra ideia era a coluna, criando um campo visual em que o locutor via, imediatamente, todo o texto, do começo ao fim. “Se fosse um script com a frase tomando toda a largura do papel, como você acompanharia? Então, tinha que ser uma coluna menor. Além disso, era preciso observar o espaço entre as palavras para facilitar a leitura. A dália – texto que se esconde no cenário para auxiliar o intérprete, caso ele se esqueça de sua fala – nunca foi usada em jornal. Eu procurava mentalizar sempre a primeira frase para passar credibilidade naquilo que estava dizendo”, historia Moreira.
Quando o teleprompter passou a ser usado na Globo, ninguém sabia o que era – relata Cid Moreira. Antes disso, Armando Nogueira, então diretor de Jornalismo, chamava Cid na sala dele para ver os jornais americanos da CBS, da NBC. “E eu ficava imaginando, sem falar nada: Mas eu nunca vou conseguir fazer isso aí. Não sabia que eles já usavam o teleprompter. “Esse cara é um monstro. Como é que ele guarda isso tudo?”, pensava. Depois que foi instituído o teleprompter na Globo, também me perguntavam como eu conseguia guardar tudo aquilo. Quando alguém contava que era o teleprompter, eu dizia: “Poxa, não fala”. Tive a satisfação de ser apresentador no período da introdução da TV em cores no Brasil, no começo dos anos 1970. Também foi um nervosismo geral. O Boni, então superintendente de Produção e Programação, comandou essa operação e, um dia, cismou com a minha gravata. Foi correndo em casa e pegou outra. A implantação da cor foi gradativa. No começo, poucos programas eram coloridos – o restante da programação continuava em preto e branco. Lembro que os tecidos extravagantes, quadriculados. Eu criava meu figurino, vinha com paletó amarelo, cor de abóbora, verde. Ainda estávamos pesquisando”, conclui o apresentador.