Nonato Guedes
Com raízes políticas na cidade de Patos, na região das Espinharas e tendo alcançado dimensão política estadual e projeção nacional, o ex-governador Ernani Sátyro, que morreu no dia oito de maio de 1986 em Brasília, fulminado por um infarto no miocárdio, foi prefeito nomeado de João Pessoa em 1940, prestigiado pelo interventor Argemiro de Figueiredo, que já o havia designado para Chefe de Polícia. A passagem de Sátyro pela prefeitura da Capital foi meteórica – dezenove dias após haver tomado posse, a queda do interventor Argemiro de Figueiredo determinou, também, o seu afastamento. Sucede-se, então, uma fase de intensa advocacia por parte de Ernani em comarcas do interior, notadamente em Campina Grande, onde passou a residir, e em Patos. Nesse período, dedicou-se ainda a atividades literárias, com incursões por novelas, romances e outras publicações. Obras que não pôde implementar em João Pessoa como prefeito, Sátyro executou-as como governador, anos mais tarde.
Sátyro concluiu seu curso jurídico em 1933, aos 22 anos de idade e pouco tempo depois ingressou na atividade política, obtendo seu primeiro mandato como deputado à Assembleia Constituinte da Paraíba, pelo Partido Libertador. Com a redemocratização do país em 1945, ele ingressou na União Democrática Nacional – UDN e engajou-se na campanha do brigadeiro Eduardo Gomes para presidente da República. Elegeu-se deputado à Assembleia Nacional Constituinte com 6.759 votos. Em 1950, conquistou o segundo mandato de deputado federal, com o resultado já somando 12.365 sufrágios. O terceiro mandato federal foi alcançado em 1954 e o quarto em 1958. O quinto mandato legislativo foi alcançado em 1962 e Ernani tomou posição ostensiva contra o governo do presidente João Goulart, que acabou sendo deposto pelos militares em março de 1964.
Da tribuna da Câmara Federal, Sátyro pronunciou mais de dez discursos denunciando o que chamava de situação de insegurança reinante no país. A projeção no plano nacional levou-o a ser escolhido em convenção presidente nacional da UDN. Estava no comando da agremiação quando o presidente Castelo Branco decretou a extinção dos partidos políticos. Sátyro, que invocou a ameaça do perigo comunista para endossar o golpe militar, integrou-se à Arena (Aliança Renovadora Nacional), sucedânea da UDN e em 1966 obteve o sexto mandato parlamentar. No governo Costa e Silva, que sucedeu ao de Castelo Branco, Sátyro foi líder na Câmara dos Deputados. Durante a sua liderança ocorreu o episódio envolvendo o deputado Márcio Moreira Alves, do qual resultou a decretação do famigerado Ato Institucional número 5. No auge da crise em torno da licença para processar o deputado Márcio Moreira Alves (MDB-RJ), acusado de fazer discurso incitando rebelião contra os militares, Ernani foi acometido de problemas cardíacos, ficando proibido, por seus médicos, de retornar ao exercício da liderança. Mesmo assim, voltou à Câmara para participar da votação sobre o pedido de cassação do deputado Márcio Moreira Alves.
Nesse ínterim, deu-se a abertura de vaga no Superior Tribunal Militar e o presidente Costa e Silva convidou Sátyro para compor a Corte. Na sua posse, foi saudado pelo conterrâneo, amigo e ex-adversário político Alcides Vieira Carneiro. No STM, atuou com consciência e seriedade, não permitindo que suas convicções ideológicas atropelassem a “serenidade” do julgador. Os adversários políticos na Paraíba prognosticaram, com a ida de Ernani para o STM, o ocaso da sua trajetória política. Ao envergar a toga, segundo os opositores, Sátyro estaria se aposentando para sempre da política. Poucos meses depois, ele aposentou-se, sim, mas do cargo de ministro do Superior Tribunal Militar, como registra o historiador Flávio Sátiro Fernandes em ensaio publicado pelo jornal “A União”. Sátyro ficou disponível para aguardar uma escolha indireta ao governo do Estado – na época, os governadores eram escolhidos pelo regime militar com o aval das Assembleias Legislativas. Em julho de 1970, o presidente Garrastazu Médici anunciou, em um mesmo dia, as últimas indicações: Raimundo Padilha para o Estado do Rio de Janeiro, Rondon Pacheco para Minas Gerais e Ernani Sátyro para a Paraíba. A posse ocorreu a 15 de março de 1971.
Sátyro fez uma administração profícua, marcada por realizações de vulto, tanto em João Pessoa, como em Campina Grande, alcançando cidades importantes do interior do Estado. Entre as obras marcantes em João Pessoa figuraram o Centro Administrativo de Jaguaribe, o edifício da Assembleia Legislativa, estádio de futebol, Central de Abastecimento, conjunto Castelo Branco III e quartel do Corpo de Bombeiros. Ernani Sátyro encerrou a carreira parlamentar conquistando o oitavo mandato de deputado federal, já pelo PDS, sucedâneo da Arena. Foi relator da polêmica proposta de anistia enviada pelo governo do presidente João Figueiredo e do projeto do Código Civil, tendo oferecido um alentado parecer após análise introdutória de caráter geral e exame de mais de mil emendas oferecidas à propositura. O relatório foi aprovado e o projeto remetido ao Senado Federal. Sátyro era conhecido pela autenticidade de posições, nunca cortejando o populismo, bem como pela coerência demonstrada ao longo de sua triunfante jornada política-administrativa na Paraíba e no país.