Nonato Guedes
Empossado em 15 de março de 1991 no governo do Estado, o poeta Ronaldo Cunha Lima (já falecido) em seu discurso de posse na Assembleia Legislativa dedicou um parágrafo especial aos funcionários públicos (cujo dia transcorre hoje). “Afinal, é com cada um deles que começa o Estado”, enfatizou Ronaldo, acrescentando que pretendia, junto com os servidores, reorientar a ação do Estado para sua missão precípua de mediador dos conflitos sociais e de prestador de serviços essenciais. Ronaldo e seu vice, Cícero Lucena, foram investidos com um abacaxi para descascar: o fechamento do Paraiban, alvo de liquidação extrajudicial no governo de Tarcísio Burity, decretada pelo Banco Central, no governo Collor. O banco foi reaberto, de forma enxuta – e este foi o grande feito da gestão de Ronaldo, ofuscando eventuais vantagens que tenha concedido aos servidores públicos em geral.
Ainda do discurso de Ronaldo, na parte referente aos funcionários públicos, reponta esta assertiva: “É com eles que se pretende, em definitivo, resgatar a dignidade da função pública, abastardada ao longo do tempo por quantos fizeram do serviço público fonte de ócio remunerado e de criminoso sinecurismo. Ao funcionalismo devo garantir que não quero atrasar salários e que vou pagar os salários atrasados. Mas ninguém me queira cúmplice da criminosa dilapidação do patrimônio público, representada pelas acumulações indevidas, pelo recebimento sem contrapartida de trabalho ou até pelas procurações fraudulentas que ressuscitam mortos ou corporificam fantasmas”. E mais: “Tenho dito que pagarei aos vivos, não aos vivos demais. O interesse do Estado que me cabe defender e preservar proíbe que o governo se torne refém de privilégios de qualquer origem ou de corporativismos de qualquer inspiração”.
Ronaldo elegeu-se governador em 26 de novembro de 1990, num segundo turno, derrotando Wilson Braga. Ele obteve 130 mil votos de maioria, apoiado por uma coligação de forças nascida no interior do PMDB, partido a que era filiado. No segundo turno, ele recebeu o apoio decidido do ex-candidato do PRN, João Agripino Neto, com influência na classe média. O apoio de João Neto foi fundamental para o triunfo de Ronaldo sobre Braga. No segundo turno, Burity – que apoiou João na primeira fase – cruzou os braços e disse que não apoiaria nem Braga nem Ronaldo. Eleito pelo voto direto em 86, concorrendo pelo PMDB e derrotando Marcondes Gadelha, Burity, no discurso de posse, disse que o descontrole administrativo estadual (referência aos governos Wilson Braga-Milton Cabral) levou à concessão de vantagens descabidas, as quais, aliadas ao excesso de nomeações (mais de 40 mil, sendo que cerca de 30 mil no período eleitoral) fizeram a folha de pagamento crescer 138% em um ano, durante o primeiro Plano Cruzado, para um aumento de vencimentos de apenas 30%.
E verberava Burity: “O excesso de pessoal, aliado a vantagens concedidas, representa um comprometimento permanente de todas as fontes de receita aplicável em despesas correntes. O quadro se agrava com o crescimento mensal dessas despesas, que a partir de janeiro deste ano (87) vem sendo da ordem da ordem de 10%. Diante de tamanha crise, só nos resta arregimentar as forças sadias do Estado para enfrentá-la com disposição. As crises não nos abatem, por mais graves que sejam. Pior do que as crises, seria a falta de coragem para enfrentá-las ou a incompetência para equacioná-las. Tomaremos as medidas indispensáveis e drásticas para curar o doente, contanto que a saúde do organismo social se restabeleça, com vistas à promoção do bem-estar da coletividade”. As dificuldades conjunturais acabaram conspirando contra o segundo governo Burity e atingiram o segmento do funcionalismo. A “herança maldita” deixada pela dupla Braga-Milton Cabral era invocada por Burity como o grande obstáculo colocado no meio do caminho das suas metas em favor da Paraíba.
Não deixa de ser curioso que ao assumir o governo em março de 83, sucedendo a Burity-Clóvis Bezerra (na primeira fase em que Burity governou o Estado, por via indireta), Wilson Braga também aludia ao estado de calamidade das finanças públicas, estimando em R$ 2 bilhões o déficit mensal do Tesouro estadual. De forma taxativa, ele acentuou: “Os compromissos vencidos, da administração direta e indireta, aproximam-se hoje, neste 15 de março de 1983, dos 20 bilhões. (…) É a dura realidade que meu governo vai enfrentar, e para a qual tem de encontrar soluções, emergenciais para amenizar a situação atual, principalmente colocando em dia o pagamento do funcionalismo, o grande objetivo; e soluções de longo prazo, atacando os problemas em suas raízes de forma a impedir que voltem a repetir-se no futuro”.