Nonato Guedes, com “Veja”
Fez um ano, anteontem, que Jair Bolsonaro (PSL) foi confirmado como presidente da República no segundo turno das eleições, vencendo o candidato do PT, Fernando Haddad, que substituiu Luiz Inácio Lula da Silva, impugnado pelo TSE por estar enquadrado na Lei da Ficha Limpa e preso na Polícia Federal em Curitiba. No discurso de vitória perante emissoras de TV em sua casa, na Barra da Tijuca, no Rio, Bolsonaro ressaltou o empenho do senador Magno Malta em aproximá-lo dos evangélicos na campanha e delegou a ele a oração pelo triunfo. Malta fora derrotado na reeleição ao Senado e esperava como prêmio de consolação um cargo no governo, mais especificamente o Ministério da Família. Para surpresa sua, foi preterido com requintes de crueldade – a escolhida foi sua ex-assessora Damares Alves.
Num levantamento feito por “Veja”, o episódio foi o primeiro sinal do estilo de Bolsonaro de se desfazer de aliados sem dó nem piedade, geralmente de forma ruidosa e traumática. A lista cresce constantemente. Agrega nomes como o da ex-líder do governo, Joice Hasselmann, deputada federal por São Paulo, o deputado federal Alexandre Frota, o Delegado Waldir, os ex-ministros Gustavo Bebbiano e Santos Cruz, o dirigente do PSL, Luciano Bivar. Todos eram aliados mas ficaram pelo caminho em virtude de desentendimentos internos ou por alimentar sonhos de poder conflitantes com os de Bolsonaro. Até mesmo o deputado federal Julian Lemos, da Paraíba, entrou na linha de tiro dos filhos de Bolsonaro, que o acusaram de papagaio de pirata e desmentiram que ele tivesse coordenado a campanha do capitão reformado no Nordeste. Fora do seu círculo, Bolsonaro comprou brigas com governadores do Nordeste, com jornalistas, com líderes de entidades sociais e, ultimamente, sinalizou que pode não renovar a concessão da Rede Globo de Televisão, insinuando que a emissora dos Marinho lhe hostiliza.
Confrontado com denúncias de “candidaturas laranjas” patrocinadas dentro do PSL, partido pelo qual se elegeu ao Planalto, Bolsonaro passou a admitir a hipótese de deixar o partido. “Veja” informa que, ressabiados com o estilo do presidente, partidos que poderiam recebê-lo estão refletindo duas vezes antes de abrir-lhe as portas. A fidelidade nunca foi o forte de Bolsonaro. Em 28 anos de Congresso, ele esteve em oito siglas. Na opinião do cientista político Carlos Melo, do Insper, Bolsonaro sempre foi um cavaleiro solitário, que fazia o seu próprio jogo, tanto que o grupo dele sempre foi ele e a família. O Delegado Waldir, deputado por Goiás, em meio a um atrito com o “clã”, chamou Bolsonaro de “vagabundo” e ameaçou implodi-lo. Alexandre Frota caiu em desgraça quando passou a criticar a intenção do presidente de indicar o filho Eduardo Bolsonaro para a embaixada do Brasil em Washington. A nomeação de Eduardo acabou sendo arquivada, mas Bolsonaro ganhou um desafeto.
“Sempre foi uma convivência extremamente difícil. Ele (o presidente) é muito inseguro, paranoico, enxerga inimigos onde não tem, vive a confusão, gosta da confusão”, analisa Alexandre Frota. Até o empresário Paulo Marinho, que cedeu a sua mansão no Rio para que fosse o quartel-general da campanha de Bolsonaro, também se afastou do presidente. “Ele tem um sentimento desagregador, que é uma coisa muito evidente na sua personalidade”, afirma o hoje aliado do governador de São Paulo, João Doria, do PSDB, outro que virou desafeto de Bolsonaro quando passou a deixar claro que poderia tentar o Planalto em 2022. A relação de Bolsonaro também é tumultuada com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, que volta e meia é lembrado como alternativa à presidência da República. Precavido, Moro tem repetido que não acalenta pretensões políticas.
“Veja” lembra que depois de ser deixado pelo presidente da República, Magno Malta afastou-se da política e vem investindo na carreira de cantor gospel. Lançado em 2018, seu CD mais recente tem a música “Limite”, que diz: “Quando as portas se fecham e a gente não vê saída e direção/É nos momentos mais precisos/que a gente não tem um amigo para estender a mão”. Ah, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, do PRB, também alvo frequente de bolsonaristas nas redes sociais no início do governo, foi escanteado por Bolsonaro e possivelmente só não caiu porque foi eleito junto com ele. A tática de desagregação utilizada por Bolsonaro é avaliada em alguns círculos como “suicídio político”.