Nonato Guedes
Numa iniciativa do deputado Adriano Galdino (PSB), presidente da Assembleia Legislativa, ocorrerá na tarde desta segunda-feira, no plenário da ALPB, a entrega “in memoriam” do título de “Cidadão Paraibano” ao arcebispo emérito dom José Maria Pires, que faleceu aos 98 anos de idade, de insuficiência respiratória, no dia 27 de agosto de 2017, em Belo Horizonte, Minas Gerais. A honraria havia sido conferida há 52 anos a dom José, mas não foi entregue por questões políticas. Dom José era conhecido pelas posições combativas contra a ditadura militar e a Mesa Diretora da Assembleia, que apoiava o regime, achou prudente cancelar a outorga para evitar um confronto.
Posteriormente, já na fase da abertura política, parlamentares sondaram dom José Maria Pires sobre a hipótese de realização de uma solenidade para que o título lhe fosse entregue mas o arcebispo ponderou que já se considerava paraibano por adoção e que dispensava a formalidade. O religioso era natural da cidade de Córregos, Minas Gerais, onde nasceu em 15 de março de 1919 e foi nomeado arcebispo metropolitano da Paraíba em dois de dezembro de 1965. Ele chegou a se indispor com autoridades militares que cobravam celebração de atos religiosos comemorativos ao transcurso anual da chamada revolução de 1964.
No caso da entrega do título pela Assembleia, na época da ditadura, a Mesa Diretora do Poder Legislativo, acatando instruções do comando do Grupamento de Engenharia, queria ter acesso prévio ao teor do discurso que dom José pronunciaria, em agradecimento. O religioso foi categórico ao recusar a imposição, alegando que se tratava de um ato de censura, ao qual não se submeteria. Dom José defendeu os pobres e oprimidos, endossando as lutas dos trabalhadores rurais pela reforma agrária, o que o colocou em choque com representantes das classes dominantes na Paraíba. No seu arcebispado, duas freiras holandesas chegaram a ser presas na região de Alagamar quando se encontravam em trabalho de doutrinação pastoral. Dom José intercedeu diretamente junto ao governador Tarcísio Burity pela soltura das freiras, o que foi feito prontamente.
Primeiro bispo negro na história do Brasil, dom José Maria Pires instituiu na Paraíba o Centro de Defesa do Direitos da Pessoa Humana e acolheu em igrejas ativistas políticos de esquerda que eram perseguidos ou retaliados pelos militares. Também se solidarizou com estudantes, participando de manifestações de protesto contra o regime e a favor da democratização do ensino público. O arcebispo deixou livros com reflexões e abordagem crítica da conjuntura política-institucional brasileira, tomando atitudes que lhe valeram o respeito e a admiração de todos os paraibanos. Sua chegada se deu em plena vigência da ditadura e, num primeiro momento, dom José tinha esperança de que o regime fizesse valer a democracia, tendo dado um crédito de confiança aos representantes da nova ordem, mas em pouco tempo, com as violações de direitos humanos e outras arbitrariedades, passou a ter uma postura de enfrentamento.
Ele foi sucedido na Arquidiocese da Paraíba por dom Marcelo Pinto Carvalheira, também já falecido, que era igualmente apontado como expoente do clero progressista, tendo atuado na Arquidiocese de Olinda e Recife quando esta foi comandada por dom Hélder Câmara, também hostilizado pelos militares. O presidente Adriano Galdino se diz honrado com a iniciativa da ALPB de promover a reparação histórica “a uma figura que lutou com destemor em defesa da população paraibana”.