Entre meados das décadas de 70 e começo de 80 pontificou na televisão paraibana um programa que exprimia a força do telejornalismo brasileiro – o “Confidencial”, apresentado na TV Borborema, dos extintos “Associados”, em Campina Grande, pelo jornalista Chico Maria. Na definição do crítico Paulo Maia, em artigo no “Jornal do Brasil”, a TV Borborema, sem maiores recursos técnicos, conseguia produzir um dos mais significativos e importantes programas de entrevista – “talvez o mais” – do telejornalismo brasileiro. Duas vezes por semana, políticos e personalidades distintas do próprio cenário nacional submetiam-se a uma saraivada de perguntas, as mais contundentes, “puxadas” pelo apresentador e seguidas pelo público, que telefonava ao vivo, na hora do programa, para formular suas questões anonimamente.
Chico Maria foi delegado de polícia da cidade e chefiou a polícia paraibana no governo Pedro Gondim. Passou a publicar crônicas e reminiscências pessoais e locais numa coluna no “Diário da Borborema”, o principal jornal de Campina Grande. Tornou-se uma revelação, porém, como entrevistador. Assim o definia Paulo Maia: “Firme, sem agredir, Chico Maria não recua ante algum entrevistado mais agressivo e não deixa o mais demagogo ficar girando em torno de meias-respostas. Formula as perguntas de maneira sóbria, mas sem vacilar, o que já é elogiável num pequeno e pobre Estado nordestino em que a grande massa da população vive à mercê de favores e do empreguinho da política oficial”. Entre meados de 80 e 90, Chico Maria atuou na TV Cabo Branco, afiliada da Globo em João Pessoa, apresentando o “Paraíba Meio Dia”, juntamente com o jornalista Nonato Guedes, mantendo o estilo polêmico e irreverente de perguntar, o que lhe valeu a consagração popular. Hoje, reside com a família no Recife, mas deixou marcos indeléveis na história da comunicação paraibana.
O cronista Gonzaga Rodrigues, em prefácio ao livro “Confidencial”, dizia que Chico não tinha meias palavras. “Pergunta ao deputado federal Plínio Lemos, o microfone aberto, o que nenhum outro inquisidor teria a desenvoltura profissional de perguntar: Por que o sr. mandou matar Félix Araújo?”. Como perguntou a Luís Carlos Prestes, acredito que único repórter do Brasil a usar estes termos: “Como o senhor apertou a mão de Getúlio (Vargas) sabendo que ele entregou sua mulher, grávida, a Hitler, para ser morta nos campos de concentração?”. Ao missionário frei Damião de Bozzano, que ganhou prestígio nos sertões nordestinos, Chico Maria indagou se ele acreditava em Deus. O capuchinho chorou no estúdio artesanal da TV Borborema em Campina Grande. A Ariano Suassuna, indagou sobre a dança do funk (“eu não conheço não”, ele respondeu) e sobre o fato de prostitutas estarem fazendo sexo a um real e noventa centavos na Paraíba. Com o teólogo Leonardo Boff, travou este diálogo:
Chico Maria – Na Bíblia está escrito: não cai uma folha da árvore a não ser pela vontade de Deus. É verdade?
Leonardo Boff – Sim.
Chico Maria – Então por que Deus permite que uma criança morra de fome, morra queimada?
Leonardo Boff – Veja, Chico, eu acho que a gente não deve transferir a culpa a Deus quando a culpa é nossa.
Ao rei do futebol, Pelé, Chico Maria indagou: “O que é que você tem feito em favor dos seus irmãos da África do Sul?”. Pelé respondeu que protestava contra a discriminação entre negros e brancos, com palavras e atitudes. Dom Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, chamado pelos militares de “bispo vermelho”, passou pelo estúdio do “Confidencial” de Chico Maria, bem como inúmeras outras personalidades de destaque. No dizer do jornalista Nonato Guedes, “Chico Maria é insubstituível no ofício de saber perguntar, que é uma arte. Faz uma falta enorme, principalmente nestes tempos sombrios de acomodação jornalística na Paraíba”.