Nonato Guedes
O presidente Jair Bolsonaro e o governador da Paraíba, João Azevêdo, apesar de terem sido consagrados nas urnas em 2018, estão, hoje, sem partido. Creia, leitor, uma analogia criteriosa das situações que os levaram a esse “status” mostra, facilmente, que toda e qualquer semelhança que porventura venha a ser apontada, não passará de mera coincidência. Bolsonaro deixou o PSL, pelo qual foi eleito, por divergências com o presidente Luciano Bivar e para escafeder-se do “rolo” que está na mídia sobre a transformação do partido num autêntico laranjal, com candidaturas-fantasmas financiadas pelo Fundo Partidário. Azevêdo deixou o PSB por falta de espaços e por causa da marcação cerrada exercida pelo ex-governador Ricardo Coutinho, dono da sigla, que queria mandar, também, no governo, como se o tivesse emprestado ao sucessor. Como pano de fundo, a “Operação Calvário”.
Param mais ou menos por aí as coincidências de situação vividas pelo presidente e pelo governador da Paraíba. Não há afinidade política, ideológica ou partidária, entre João Azevêdo e Bolsonaro, de modo que será difícil encontrá-los habitando o mesmo teto nos embates eleitorais que se avizinham. João pode não ser um socialista visceral, figurino que se encaixa aparentemente como uma “luva” em Ricardo em face das ligações que este soube forjar com movimentos de esquerda espraiados no arco social. Mas Azevêdo não pode ser tido como discípulo de Bolsonaro, que é um político da extrema-direita, conectado com os bolsões mais conservadores de que se tem notícia na história deste país. João estaria mais para o centro – não para os extremos. Mas não faria feio num figurino de centro-esquerda, rótulo que pode ser atribuído a outras agremiações que pululam no flamejante universo partidário tupiniquim.
Entre Ricardo e Azevêdo pode ficar combinado o seguinte: o ex-governador tem perfil mais definidamente esquerdista; o atual governador situa-se como um democrata comprometido com as causas sociais e uma dosagem de nacionalismo, o que lhe confere viés relativamente avançado em termos de discurso. O que vai balizar concretamente o posicionamento do governador da Paraíba é o enfoque a ser dado a partir de agora, com autonomia, à sua gestão – e, além disso, a postura em termos políticos que o titular do Executivo encampará nas grandes questões nacionais controversas, aquelas que não aceitam meio-termo, mas exigem definições concretas e irreversíveis. Se vier a enfileirar-se no campo do atraso ou, como é comum dizer-se, do retrocesso, Azevêdo estará demonstrando que sua passagem pelo PSB foi apenas de “agá”, modelada para pavimentar caminhos que conduzissem ao poder, atrelado ao trânsito que Coutinho inegavelmente possui na seara ideológica avançada na Paraíba e no país. Mas se, com palavras e ações, Azevêdo mantiver-se ostensivamente no campo de centro-esquerda, será encarado como um idealista que chegou ao poder cheio de expectativas para mudar a realidade desumana que ainda perdura na Paraíba e no Brasil.
A questão ideológica, no Brasil, é sempre complicada, em termos de partidos políticos, porque a verdade é que há agremiações que se dizem progressistas mas cujo ideário se aproxima do atraso. A ética, por exemplo, parecia monopólio intocável do Partido dos Trabalhadores e o que se viu foi o desfile de mensaleiros e petroleiros em portas de cadeia, acusados de participar de esquemas engendrados para saquear os cofres públicos. Nem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva escapou da maracutaia montada contra o povo. Quando o bipartidarismo foi extinto com o fim do regime militar, o PDS, sucedâneo da Arena, adotou na sua carta-programa o princípio da co-gestão, ou seja, a distribuição de lucros entre patrões e empregados. Tudo bem que fosse um item para inglês ver porque, na prática, nunca foi executado no Brasil. Mas se a Lei obrigasse os partidos a cumprirem cartas-programas, o PDS teria que adotar o princípio consagrado. Quem lembrava isto, com ironia, era o ex-ministro Ernani Sátyro, para comparar que nem o Partido Comunista, ao qual ele tinha ojeriza, foi revolucionário ao ponto de admitir o princípio da co-gestão, quanto mais outros avanços apregoados da boca para fora.
O que se quer dizer é que somente a prática, e nada mais, definirá o comportamento dos homens públicos perante a História – sejam eles Jair Bolsonaro, João Azevêdo ou Ricardo Coutinho. Mil palavras podem ser ditas ao vento, mil falsos profetas podem ser acolhidos por multidões e endeusados como “Messias” ou supostos “Mitos”. Nenhum deles garantirá seu lugar na História se não for coerente, retilíneo, nas alocuções defendidas a céu aberto em praça pública. Há muita pantomima circulando na praça. A vantagem é que já faz tempo que o eleitor aprendeu claramente a distinguir o joio do trigo. E isto é que é motivo para alvíssaras e evoés!