Nonato Guedes
O ex-ministro da Fazenda, Maílson da Nóbrega, em seu blog na “Veja” tece reflexões acerca do pacto federativo e admite que existe a impressão de excessiva centralização de recursos nas mãos da União, “mas isto não é verdade”. Para ele, trata-se, portanto, de “falácia” esse argumento. O economista paraibano lembra que pacto federativo tem significados diferentes no Brasil, podendo referir-se a competências e atribuições dos entes federados (Estados e municípios) ou ao aumento de transferências federais para esses entes. Governadores e prefeitos preferem o segundo. Um dado preocupante, a seu ver, é que a maioria dos Estados está quebrada e 14 deles gastam mais do que arrecadam.
Remontando às origens históricas do Brasil, o ex-ministro ressalta que a independência veio de ato do príncipe e não de uma declaração de guerra. O Império era um Estado unitário e a federação brasileira inspirou-se no modelo americano, mas sua motivação era dividir o todo em Estados para manter o território (holdtogether). Nos EUA o cientista político William H. Riker chamou de “pacto federativo” a Convenção da Filadélfia que elaborou a Constituição (1787). Unidades até então soberanas decidiram criar a federação que as uniria. As treze colônias conquistaram a independência nos campos de batalha mas já não gozavam de grande autonomia.
Para Maílson, criou-se no Brasil a cultura de dependência do poder central, o inverso do caso americano. “Nos anos pós-guerra – explica – nasceu o processo de transferência de receitas tributárias da União para Estados e municípios, intensificado no regime militar, na Constituição de 1988 e em emendas constitucionais. Até 1968, as transferências eram 12% do imposto de renda e do IPI. Hoje, somam 49% do imposto de renda e 59% do Imposto sobre Produtos Industrializados. A descentralização e o fim do “pires na mão”, foram a justificativa para elevar as transferências. Pois bem, depois de os porcentuais de partilha mais do que quadruplicarem, sobre uma base tributária que quase dobrou, a maioria dos Estados está quebrada. Catorze deles despendem em gastos correntes 95% ou mais do que arrecadam”.
Sobre a tese da excessiva centralização de recursos pela União, o economista diz que os economistas José Roberto Afonso e Marcos Mendes já demonstram que a federação brasileira é uma das mais descentralizadas do mundo. “Não importa o que se arrecada, mas com quanto cada ente fica na repartição do bolo tributário”, ensina. Atualmente, pelos seus dados, 93% dos gastos primários da União são obrigatórios, o que inviabiliza a elevação das transferências de tributos federais e a sustentação da ideia “Mais Brasil, Menos Brasília”. Por isso, o governo optou por maior partilha de receitas não tributárias, os royalties do petróleo, em favor dos Estados e municípios. “Ocorre que os royalties variam com o preço do petróleo. São voláteis. Na maioria dos municípios que passaram a recebê-los, os gastos com pessoal aumentaram quando a arrecadação subiu, mas não baixaram quando ela caiu. As prefeituras quebraram e pediram socorro à União.
Maílson da Nóbrega conclui lembrando: “Dizia-se que a Lei de Responsabilidade Fiscal inauguraria uma era ao fixar limites para gastos de pessoal. Estados, com o respaldo de Tribunais de Contas estaduais, fraudaram a contabilidade para esconder despesas sujeitas ao limite, e faliram. Nada garante que essa história não se repetirá. A cultura de responsabilidade fiscal dos Estados Unidos ainda não chegou de todo por aqui. Reflitamos melhor sobre tudo isso”.