Nonato Guedes
Nunca antes, na história mais recente da Paraíba, houve registro da ação de uma organização criminosa de alta periculosidade, enquistada nas ante-salas e salas nobres do governo do Estado, adrede motivada para sangrar os cofres públicos, saquear o erário até a última gota e partilhar o butim entre os apaniguados girassóis, tal como foram denominados os expoentes do “projeto socialista” que massificou a propaganda de uma “revolução” em terras tabajaras. A Orcrim, está comprovado nos autos dos inquéritos do Ministério Público, prosperou de forma diligente a partir de 2011 (ano da posse de Ricardo Coutinho no primeiro mandato) até 2018 (término da segunda gestão de RC). Havia a obstinação de desviar recursos públicos mediante um esquema que recorreu a malfadadas Organizações Sociais, com livre acesso em áreas vitais como a Saúde e a Educação.
As gestões que se jactaram de implementar uma nova Era na Paraíba, reinventando o Estado a partir de supostas práticas socialistas, montaram a mais sofisticada máquina de corrupção já desbaratada, proporcionalmente, em todo o País, com conexões e tentáculos fora do Estado. Denúncias de corrupção e irregularidades que pipocaram em outros governos ao longo das últimas décadas na Paraíba constituem “fichinha” diante do profissionalismo com que a “Ocrim” de agora atuou. Os focos das investigações do Ministério Público, da Controladoria Geral da União e outros órgãos auxiliares iluminaram os rostos de “vestais” da política e da administração paraibana, estampando a desfaçatez com que ensaiam álibis e caricatos gestos de “surpresa” com o que vinham praticando na dilapidação do dinheiro público para enriquecimento pessoal, tráfico de influência e distribuição de propinas a granel.
Não é o caso de se afirmar que uma parcela da população paraibana esteve permanentemente desinformada a respeito do rosário de falcatruas oficialmente desvendados, inclusive, por meio de interceptações de ligações telefônicas em que se planejava o saque ou em que se engendrava com perfeição quase absoluta o “butim” finalmente descoberto. O que houve, em meio à chusma de delações e de revelações repassadas, foi a concessão do beneplácito da dúvida até que a culpa fosse irreversivelmente provada e que os responsáveis deixassem rastros da ofensiva deletéria, da gana de avançar pelos cofres públicos como quem administra lucros pessoais. O que resta divulgado é que o Estado teria pago mais de R$ 2,1 bilhões, entre 2011 e 2019, a quatro organizações sociais – em forma de propinas cujo pagamento seguia um fluxo das alocações em rotina temporal, tal como demonstrado nos interrogatórios de arrolados.
Homens públicos até então incensados dentro e fora da Paraíba não tinham o menor constrangimento em recorrer a “laranjas” (familiares e parentes) para receber valores de propina e ocultar seus bens, em técnica de lavagem que põe em risco a aplicação da lei penal, como registra, hoje, no “Correio da Paraíba”, a colunista Sony Lacerda, após a pertinente observação de que “o juízo final chegou”. Uma organização que era estratificada em núcleos – político, econômico, administrativo e financeiro operacional e que arregimentou adesões de deputados, secretários de Estado, prefeitos, empresários. Ainda ontem, no ruge-ruge das operações de busca e apreensão e do cumprimento dos mandados de prisão expedidos, chegou a ser apreendida uma quantidade de dinheiro não revelada, tendo-se conhecimento da divulgação de um vídeo contendo a apreensão do dinheiro, inclusive, em euros.
Toda a orquestração montada e executada com disciplina espartana, mediante cronograma de repasse de dinheiro, resultou em drenagem, para a máquina de corrupção, de recursos que poderiam ter sido investidos em educação e saúde, tornando a Paraíba, realmente, uma ilha de progresso, de desenvolvimento e, quiçá, de felicidade do seu povo. Essa “Paraíba” chegou a ser vendida em peças de propaganda na televisão e nas redes sociais, como advento de um “novo tempo” – mas tudo não passava de artifícios de engodo, mistificação, prestidigitação. Governos que se arvoraram em paladinos da moralidade absoluta, donos exclusivos da transparência à toda prova, sonegaram da opinião pública a revelação das práticas criminosas que levavam a cabo debaixo dos panos, em conluios acertados em condomínios privados, mesas de restaurantes, apartamentos e suítes de hotéis de altíssima categoria, tal como exigia o ritual predileto dos “novos ricos” ou “nababos” que são bafejados com dinheiro caído do Céu, diferentemente dos mortais comuns que vivem na miséria e ainda têm que votar nesses salteadores da modernidade. A Paraíba terá que passar por uma angustiante faxina até que os culpados paguem pelos crimes que lhes são atribuídos e também reparem o Estado da sangria que implantaram de forma voraz. Que essa página negra do butim seja virada definitivamente, para todo o sempre.