Nonato Guedes
Versátil no “gogó”, o ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho (PSB), ganhou manchetes nacionais por ter protagonizado ações espetaculares que levaram um ministro plantonista em Brasília a pô-lo em liberdade, depois da volta olímpica empreendida no mundo pelo político nordestino, com passagens pela Turquia e Portugal, até ser fichado pela Interpol, de sorte que teve que voltar ao Brasil, em cujo espaço aéreo começou a ser preso, consumando-se o ato em pleno Aeroporto Internacional de Natal, Rio Grande do Norte, onde agentes da Polícia Federal já estavam a postos para conduzi-lo a João Pessoa. Aqui, Ricardo foi para uma cela, depois a uma audiência de custódia no Tribunal de Justiça, novamente conduzido à prisão e, enfim, libertado em alto estilo, em clima de final de Copa do Mundo. A decisão do ministro Napoleão Maia, do Superior Tribunal de Justiça, foi concedida em grau de liminar, o que pressupõe a ausência de apreciação de mérito e, consequentemente, espaço para retorno do contencioso ao magistrado titular que determinou a prisão, imbuído da faculdade de retomar o que fora interrompido por iniciativas exógenas.
Coutinho não perde o vezo e tripudia sobre seus adversários com um argumento forte: a sua soltura. Quer fazer crer que renasceu das cinzas, como a Fênix. Em live dominical através de rede social, já em João Pessoa, o político que governou a Paraíba em dois mandatos, até dezembro de 2018, Ricardo deu trela ao “gogó” e comparou-se ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), igualmente solto, e que faz indústria da vitimologia como “perseguido político”, em nenhum momento jamais admitindo um pingo de culpa num dos maiores escândalos de corrupção já desvendados por uma Operação apropriadamente chamada de Lava-Jato. Como se tivessem ensaiado um discurso combinado, Lula e Ricardo Coutinho são pródigos em desqualificar Ministério Público, Polícia Federal, Gaeco e outras autoridades. Ao mesmo tempo, juram não saber de nada, não ter ingerência em nada, como se estivessem preparando currículos ou perfis para candidatar-se a algum tipo de reconhecimento de santidade ou de imantação. Há muito mais semelhanças entre Coutinho e Da Silva do que imagina a vã filosofia.
Aliás, cogitou-se, no episódio da prisão do ex-governador da Paraíba no Complexo de Mangabeira, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva viria visitá-lo como reciprocidade, retribuindo os pronunciamentos de apoio e a visita que Coutinho lhe fez na sala da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde residiu por um ano com regalias conferidas a presidentes da República, a partir do seu isolamento em relação a presos comuns. Não houve tempo útil para que Lula se abalasse à Paraíba – a prisão de Ricardo foi em ritmo de vapt-vupt e antes que o ex-presidente trocasse de roupa para esticar viagem ao Nordeste, o socialista já contemplava raios de sol no Bosque das Orquídeas, endereço aprazível que passou a ocupar depois que perdeu a condição de inquilino da Granja Santana. Nos meios políticos, a impressão é de que o pesadelo está começando, com direito a idas e vindas, a solturas e prisões, o que tem sido, ultimamente, a praxe de alguns ministros, inclusive, do Supremo Tribunal Federal.
O bombardeio contra Ricardo Coutinho segue intenso – ganhou tonalidades fortes em pleno programa “Fantástico”, no domingo à noite, na Rede Globo de Televisão, com depoimentos devastadores da ex-secretária de Administração Livânia Farias e do ex-operador da Cruz Vermelha Brasileira, Daniel Dantas, debulhando o esquema criminoso que entrou para a história política-administrativa do Brasil pela engenhosidade e pela peculiaridade de seu formato tripartite, juntando organizações sociais, agentes públicos e arrivistas a soldo de líderes políticos, todos mancomunados para dilapidar o coração da Saúde e da Educação num Estado pobre e carente como a Paraíba. Haverá desdobramentos, até porque é forte o sentimento de indignação, lastreado na repulsa à impunidade contra os que são acusados de roubarem a merenda das crianças e os remédios dos velhinhos sem dinheiro e até mesmo sem o amparo do SUS. É uma ópera que comporta resumo, extrato, síntese – mas, seguramente, ainda não qualquer sinal de epílogo.