Nonato Guedes
Levada ao ar na última quarta-feira, com locações em Brasília, a novela cujo enredo é a confirmação da atriz Regina Duarte como secretária de Cultura no governo do presidente Jair Bolsonaro, deverá ter um epílogo no começo da semana com o retorno do mandatário da viagem à Índia, onde fechou acordos comerciais e visitou o túmulo de Ghandi. Regina foi a Brasília para se inteirar da estrutura da secretaria, reuniu-se com auxiliares da gestão Bolsonaro, esteve com a primeira-dama Michelle, madrinha da sua indicação, mas forneceu poucas pistas sobre a aceitação, ou não, do cargo. Patrulhada por artistas situados à esquerda, que combatem ferozmente o governo de Bolsonaro, Regina limitou-se a repetir declarações iniciais do presidente de que ambos estavam “noivando”. O cargo ficou vago com a exoneração de Roberto Alvim, que caiu em desgraça após publicar um vídeo de lançamento de um prêmio cultural em que fez plágio de um discurso de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler, mentor do nazismo.
Aos 72 anos, Regina Duarte, que já foi chamada de “namoradinha do Brasil” quando da atuação em folhetins consagrados da TV Globo, tem uma atuação política paralela bastante polêmica, como registra a revista “Veja” em matéria de capa. Na década de 80, a atriz militou pelas Diretas-Já. Depois, trabalhou no governo Fernando Henrique Cardoso, como integrante do conselho de um programa tocado pela então primeira-dama Ruth Cardoso. Na eleição de 2002, provocou controvérsia ao declarar que “tinha medo” diante da perspectiva de vitória do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores. No governo da presidente Dilma Rousseff, também do PT, chegou a derramar elogios à primeira mandatária a sofrer um impeachment. Nas últimas eleições presidenciais, em 2018, participou de atos de campanha de Bolsonaro, chamando-o de “um cara doce”, com “alma democrática”.
“Veja” lembra, ainda, que no período da ditadura militar instaurada em 1964 e que perdurou até 1985, os serviços de inteligência produziram pelo menos 25 relatórios sobre Regina Duarte, que era considerada, então, como subversiva. Os arapongas colocaram a atriz em primeiro lugar numa lista de personalidades e artistas de teatro que doavam recursos à “Convergência Socialista”, uma organização trotskista, que, segundo os militares, era subversiva e levantava dinheiro para a libertação de presos na Argentina. A atriz foi alvo, ainda, de relatórios do Serviço Nacional de Informações (SNI) ao visitar Cuba para promover uma novela, ocasião em que posou para fotos ao lado de Fidel Castro. Em 1984, um dos relatórios do SNI tinha o título “Utilização de artistas para propaganda comunista” e reproduzia falas da atriz. Numa delas, Regina Duarte dizia que Fidel era “um dos maiores estadistas do mundo”.
A provável confirmação de Regina Duarte como secretária especial de Cultura do governo Bolsonaro desencadeou até reações furiosas e de baixo nível da parte de alguns artistas pró-PT, como o ator José de Abreu, amigo pessoal do ex-presidente Lula. Ele postou em rede social: “Acompanhem a tragédia, jornalistas do meu Brasil. Denunciem essa farsa. Ninguém com um currículo destes pode assumir um cargo público. Ou pode, num governo de merda como este. Se merecem”. Reações desse tipo contrastam com a receptividade com que foi aceita nos meios artísticos e intelectuais a nomeação do cantor e compositor Gilberto Gil para ministro da Cultura do governo Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-presidente Lula, como se sabe, acabou ficando preso por mais de um ano na Polícia Federal em Curitiba, acusado de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e conivência com atos de corrupção. Atualmente está em liberdade e concede entrevistas deitando falação contra o governo do presidente Bolsonaro.