Nonato Guedes
Lépido e fagueiro, o governador João Azevêdo (Cidadania) foi, ontem, à Assembleia Legislativa ler a mensagem anual aos deputados e pedir apoio destes à “governabilidade”, diante das turbulências que têm se desenhado no horizonte, inclusive, com sinais de retaliação ou má vontade do governo federal para com a gestão do ex-socialista. Azevêdo acabou sendo surpreendido com um presente de grego – na verdade, duas bombas detonadas pela bancada de oposição: o pedido de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para avaliar os rumos e consequências da Operação Calvário, versando sobre desvio de recursos públicos da Saúde e Educação, e o pedido de impeachment do governador, acusado de prevaricação e/ou leniência na punição a agentes públicos citados nos escândalos remanescentes da Era Ricardo Coutinho. A CPI se propõe a apurar irregularidades na pactuação do governo com organizações sociais que já foram banidas do Estado.
O pedido de impeachment, que é o mais grave, parte de uma presunção – a de que Azevêdo tem conhecimento de aspectos relacionados a atos de corrupção cometidos contra o erário público estadual e mesmo assim não tomou medidas que a Constituição impõe em situações excepcionais como tal. Desse ponto de vista, ele teria prevaricado, o que configuraria crime de responsabilidade inscrito nos textos legais. O protocolo do impeachment alcança, também, a vice-governadora Lígia Feliciano, do PDT, remanescente da gestão de Ricardo Coutinho, onde exerceu o mesmo cargo. A reação do governador foi a de encarar com naturalidade, dentro do processo democrático, a iniciativa tomada contra ele e, na sequência, procurar blindar-se, garantindo não ter qualquer conexão com a Operação Calvário.
Chancelado pelo deputado Walber Virgolino, do Patriota, o documento referente ao impeachment alega: “As implicações da Operação Calvário, de traz para frente, chegam fortemente ao atual governador e sua vice, na medida que os dois são beneficiários eleitorais do esquema criminoso que financiou as eleições de 2018, tanto quanto financiou as eleições anteriores, desde 2010”. A oposição, como se vê, questiona fraude de eleições recentes da história da Paraíba, o que, até então, era vocalizado em conversas de bastidores ou insinuações através da imprensa, e põe Azevêdo na roda por identificá-lo supostamente como partícipe de comprometimento em fatos graves arrolados em inquéritos conduzidos pelo Ministério Público, com reforço de policiais do Gaeco.
Em tradução livre, foi mais ou menos isto o que conceituou o deputado Walber Virgolino em sua cruzada que aflorou, ontem, na tribuna da Assembleia: “Foi uma eleição viciada e que quebrou a igualdade do pleito. Temos que ter uma eleição limpa e igual. Por isso, apresentamos esse pedido de impeachment por entender que não há mais condições de se manter um governo que se beneficiou do dinheiro público para se manter no poder”. Da parte do esquema oficial, houve cautela de deputados, na linha adotada pelo governador João Azevêdo e, ao mesmo tempo, confiança em que não haverá reflexo do ponto de vista de incriminar a chapa ungida em primeiro turno no prélio de 2018.
A par do registro de que o pedido de impeachment é inédito ao longo de meio século de história do Poder institucional da Paraíba, há uma constatação, por parte de analistas políticos, de que a iniciativa do deputado Walber Virgolino dificilmente terá condições de prosperar, ainda que produza barulho por algum tempo. O corporativismo entre agentes políticos é latente (foi demonstrado ainda ontem, na Câmara, com a absolvição do deputado federal paraibano Wilson Santiago) e há o fato de que deputados estaduais governistas sentiram-se injustamente atingidos com denúncias extraídas de trechos de depoimentos em forma de delação formulados no curso das investigações da Operação Calvário.
Em todo caso, fica para o governador João Azevêdo a sensação de instabilidade à frente do exercício do governo, como se a espada de Dâmocles estivesse apontada permanentemente para a sua cabeça. É uma péssima notícia para quem tinha a expectativa de adentrar no segundo ano de gestão com relativa tranquilidade para, pelo menos, planejar a execução de obras de impacto, dentro da filosofia que o governador vive a repetir de que o seu foco é na gestão. A bancada de oposição forneceu uma prévia das dificuldades que o chefe do Executivo tende a enfrentar na quadra que lhe coube empalmar como corolário da eleição de 2018, agora, publicamente, tratada como “viciada”.