Nonato Guedes
A entrada em vigor da “janela” partidária, mecanismo que favorece a migração de filiados sem o risco da aplicação de sanções legais, tende a confirmar o desmonte experimentado pelos quadros do Partido Socialista Brasileiro (PSB) na Paraíba sob o comando do ex-governador Ricardo Coutinho, que moveu céus e terras para controlar a legenda, a ponto de destituir, “manu militari”, dirigentes ligados ao governador João Azevêdo e hostilizar este, levando-o a buscar abrigo no “Cidadania”, que começa a ser formado no Estado.O desmonte vivenciado pelo PSB paraibano contraria a expectativa de fortalecimento da agremiação na esteira de vitórias alcançadas no pleito de 2018 para o governo do Estado, uma vaga no Senado, uma vaga na Câmara Federal e boa bancada na Assembleia Legislativa.
O que se verifica, a dados de hoje, é o prenúncio de esvaziamento das fileiras socialistas. Deputados, vereadores e prefeitos que formalmente continuam vinculados à legenda já estão em tratativas avançadas com outros partidos em que cogitam ingressar e levar à frente a militância política. A debandada é ocasionada pelo desgaste que o ex-governador Ricardo Coutinho passou a enfrentar, como um dos implicados na Operação Calvário, que alude a desvio de recursos públicos na Saúde e na Educação do Estado. Ricardo perdeu o carisma como líder político não só porque até hoje não conseguiu construir uma narrativa consistente capaz de inocentá-lo das acusações levantadas pelo Gaeco e Ministério Público, em depoimentos e “delações premiadas”, como porque está utilizando ostensivamente a tornozeleira eletrônica, uma das medidas cautelares impostas pela Justiça para evitar que ele fuja do alcance do braço da Lei, na dependência da evolução das investigações em andamento.
Como pode um líder político ter flexibilidade de movimentos para dialogar com “aliados” e com eventuais parceiros de jornada se está atado pela tornozeleira, refém da tomada de novos depoimentos a qualquer momento para esclarecer informações que ainda estão obscuras no âmbito da Operação Calvário e que dizem respeito ao destino do dinheiro surrupiado dos cofres públicos? Por outro lado, que equilíbrio psicológico o ex-governador pode exibir em contatos políticos essenciais para a reconstrução do projeto socialista de poder se está condicionado a possíveis tarefas bem distintas das que são confiadas a dirigentes de partidos? O grande desafio que move as agremiações no corrente ano diz respeito à preparação para as eleições municipais, o que abrange o lançamento de candidaturas próprias a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores ou, então, a celebração de alianças ou coligações para apoio a chapas majoritárias, uma vez que não serão permitidas composições na esfera proporcional. Isto exige largueza de espaços, amplitude de flexibilidade – requisitos que falecem a RC.
O próprio Ricardo é exemplo da dificuldade que o PSB terá para se mostrar forte, competitivo, quer como protagonista, quer como coadjuvante ilustre, nos embates que serão travados nas urnas em outubro na Paraíba. Ele despontava como o nome mais forte da representação socialista paraibana para candidatar-se, novamente, a prefeito de João Pessoa, uma vez concluída a passagem de oito anos pelo governo do Estado (já que não concorreu ao Senado em 2018). Tão logo estourou o escândalo da Operação Calvário, que resultou na sua prisão por dois dias, revogada mediante habeas-corpus de magistrados em Brasília, ele foi praticamente rifado do páreo sucessório pessoense, estando o partido que preside a braços com o impasse para definir candidatura própria.
A perspectiva de que Coutinho fosse candidato a prefeito da Capital extraiu manifestações de apoio, inclusive, em outras legendas, como o Partido dos Trabalhadores, que sepultou divergências históricas com seu ex-filiado e admitiu apoiá-lo como cabeça de chapa, não obstante um integrante de proa da legenda, o ex-deputado federal Luiz Couto, ocupar secretaria estratégica no governo de João Azevêdo. O discurso dos petistas, hoje, é no sentido de forjar uma candidatura própria à prefeitura, não havendo a menor sinalização de nomes ou de perfis, o que torna nebulosa a situação para os próprios militantes da agremiação fundada há quarenta anos, em São Paulo, pelo ex-presidente Lula da Silva.
Os socialistas que estão debandando da legenda porque adquiriram incompatibilidade de convivência com Ricardo Coutinho não vão, necessariamente. engrossar as fileiras do “Cidadania”, o partido que tem como líder de fato na Paraíba o governador João Azevêdo. Poderão se filiar a outras legendas que, no entanto, continuam na base de sustentação política e de apoio ao atual chefe do Executivo. Essas legendas poderão lançar candidaturas próprias na Capital ou se compor em torno de uma chapa apresentada pelo “Cidadania” – em qualquer caso, serão aliadas de Azevêdo. Quanto a Ricardo, é como se tivesse que começar do zero – sem poder e sem perspectiva de poder a oferecer, por enquanto.