Num balanço sobre os seis anos de atuação da Operação Lava-Jato, cruzada contra a corrupção deflagrada no Brasil com repercussão internacional, o procurador Deltan Dallagnoll atacou decisões recentes do Supremo Tribunal Federal e iniciativas do Congresso, afirmando haver hoje um ambiente mais difícil de combate à corrupção se comparado ao do início da operação. “No último ano, identificamos uma série de decisões e posições do Parlamento e do Supremo Tribunal Federal que acabam resultando em dificuldades no exercício do nosso trabalho, das investigações e processos”, descreveu o chefe da força-tarefa da Lava-Jato no Ministério Público Federal do Paraná.
Embora ele não tenha feito referência específica, a fala de Deltan, em entrevista coletiva, ocorre às vésperas de atos contra o Congresso Nacional e o Judiciário, incentivados pelo presidente Jair Bolsonaro e que estão previstos para domingo. Entre as críticas que destinou ao Legislativo, o procurador citou a aprovação, em setembro do ano passado, da lei de abuso de autoridade. Conforme seu ponto de vista, há, na legislação, regras boas, mas também outras que impedem e dificultam a atuação de autoridades públicas contra corruptos poderosos. O procurador avaliou, também, de forma negativa, a configuração final do pacote anticrime elaborado pelo ex-juiz da Lava-Jato e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro.
– Vimos uma grande tentativa de aprovação de reformas, por meio do pacote anticrime, mas infelizmente, ao longo de sua tramitação no Parlamento, boa parte das regras anticorrupção foi retirada – expressou Dallagnoll. Deltan foi questionado sobre possíveis retrocessos ocasionados pela atuação do Executivo no combate à corrupção, como a ausência de vetos por Bolsonaro sobre itens criticados por Moro na lei de abuso de autoridade. Em resposta, disse que, apesar de haver pontos negativos, a maior preocupação está no desempenho dos Poderes Legislativo e Judiciário. “É quem mais pode impactar o combate à corrupção no país no médio e longo prazo. A mudança nas punições que favorecem ou desfavorecem a integridade dependem essencialmente de mudança de leis (…) e também da aplicação dessas leis”, afirmou.
Deltan Dallagnol elencou várias decisões datadas de 2019 do Supremo Tribunal Federal que, a seu ver, criaram um ambiente desfavorável no combate à corrupção, como a determinação, em março, de que investigações de propinas destinadas a campanhas políticas fossem encaminhadas à Justiça Eleitoral. Citando como exemplo o caso Pasadena, anulado após o entendimento do Supremo, ele disse que outros casos da alçada da Lava-Jato podem ser afetados. “Para dizer o mínimo, essa decisão do STF gera uma grande insegurança jurídica com relação a casos já propostos que tramitam em Curitiba, inclusive, casos já julgados”, revelou. O procurador também criticou a decisão do presidente do Supremo, Dias Toffoli, de suspender em julho do ano passado investigações criminais pelo país que usassem dados detalhados de órgãos de controle como Coaf, Receita Federal, Banco Central, sem autorização judicial. Após críticas, Toffoli voltou atrás e revogou parte da determinação em novembro.