Nonato Guedes
A morte, por infarto, do ex-ministro e advogado Gustavo Bebianno, desatou a escalada de “achismos” sobre supostas verdades encobertas por trás do diagnóstico dos médicos. O senador Major Olímpio insinuou que ele e o deputado federal paraibano Julian Lemos sabem de “verdades” que Bebianno acumulava sobre a tortuosa trajetória do capitão Jair Bolsonaro, presidente da República. Por esse enredo, tais verdades, quando vierem à tona, constituirão nitroglicerina pura, bomba de alto teor explosivo, dinamite capaz de explodir a República. Vá lá que o Major e o paraibano sejam muito bem informados sobre as intrigas palacianas que Bebianno compartilhou. Mas, que tal irmos a fatos?
Diz o jornal “O Estado de São Paulo”: “O ex-ministro e advogado Gustavo Bebianno não tinha raiva do presidente Jair Bolsonaro. O sentimento que o perseguia desde que deixou o governo era a decepção de um fã com seu ídolo. Foi o que ele contou na última conversa com o “Estadão” em um hotel em Brasília na terça-feira, 10, onde fez reuniões de articulação para sua candidatura a prefeito no Rio pelo PSDB. No encontro com a reportagem, que ocorreu quatro dias antes de sua morte, o ex-ministro fez elogios ao presidente que ajudou a eleger, mas demonstrou mágoa pelas suposições de que poderia estar envolvido com a facada sofrida por Bolsonaro durante ato de campanha em setembro de 2018 – o boato ganhou força após Bolsonaro dizer, em entrevista, que um auxiliar poderia estar por trás da facada”.
Disse o ex-ministro ao ”Estadão” há poucos dias: “Eu sou muito sensível. Eu sinto a energia das pessoas. Não posso ter me enganado tanto. Eu só enxergava uma pessoa de bom coração, sincera. Acho que ele (Bolsonaro) é assim, mas todo mundo tem luzes e sombras. Eu conheci o pior lado também”. Na conversa com a reportagem, Bebianno contou sobre a carta que escreveu para Bolsonaro após ser demitido do governo, em fevereiro de 2018. Queria aparar arestas, fechar um ciclo. No texto, o ex-ministro aconselhou o presidente sobre o filho Carlos Bolsonaro, que é vereador pelo PSC no Rio de Janeiro. “Eu disse que Carlos não sabia amar, era nutrido por ódio o tempo inteiro. Ninguém o ensinou a amar. Ele não aprendeu”, contou.
O “Estadão” revela que cópias da carta foram entregues para o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, então chefe da Casa Civil, o general Maynard Santa Rosa, que ocupava o cargo de chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos e para o ator Carlos Vereza, que se aproximou do presidente e também se tornou seu amigo. Bebianno, que nunca mais encontrou Bolsonaro pessoalmente ou manteve contato por telefone, queria ter certeza de que o presidente havia lido sua carta. Onyx, segundo contou o advogado, garantiu que Bolsonaro leu o texto. Em um dos trechos, o ex-admirador falava que o presidente, depois de chegar ao poder, estava cercado de energias negativas, que o atrapalham na condução do país.
Para Bebianno, foi após esta carta que Bolsonaro passou a declarar que um ex-assessor poderia estar envolvido na tentativa de seu assassinato. “Isso é uma loucura. Eu estive ao lado dele o tempo inteiro. Abri mão de estar com minha família. Nunca quis nada em troca. Eu acreditava quando ele dizia que queria mudar o Brasil”, adiantou. A Carlos é atribuída a saída de Bebianno do governo com apenas 49 dias de gestão. O então ministro foi demitido em uma crise que eclodiu após ter declarado ao jornal “O Globo” que havia conversado três vezes com o presidente durante uma crise no Planalto. A declaração foi dada para afastar rumores de que estava sofrendo um processo de fritura. Na sequência, Carlos foi à internet dizer que o ministro estava mentindo. Áudios divulgados depois da demissão confirmaram que Bebianno e o presidente mantiveram contato.
A relação de Bebianno e Carlos era conflituosa desde a pré-campanha eleitoral. Na época, o coordenador da campanha evitava fazer declarações sobre o filho do presidente. Em entrevista à TV Cultura, no início deste mês, Bebianno falou que Carlos queria montar uma “Abin paralela” dentro do Palácio do Planalto com a participação de delegados federais. Desde que saiu do governo, Bebianno tinha medo. Apontado como um homem-bomba, que poderia revelar segredos da campanha de Bolsonaro, o ex-ministro afirmava que jamais faria isso, embora dissesse ter documentos, áudios e mensagens guardadas. “Não é o meu perfil. Eu tenho caráter”, arrematou. Isto não é “achismo”. Era a versão livre de Bebianno, dada poucos dias antes da morte. Que convém reproduzir, em tempos de “fakenews”.