Nonato Guedes
A divergência sobre medidas administrativas para enfrentamento ao coronavírus no país deu ao governador de São Paulo, João Doria (SP), a oportunidade de romper politicamente com o presidente Jair Bolsonaro. Na sexta-feira, ao determinar quarentena para todos os serviços não essenciais no Estado a partir de terça, 24, Doria alfinetou Bolsonaro, dizendo: “É imperdoável que minimizem a pandemia, alegando que é só uma gripezinha”. E acrescentou Doria: “Vejo com decepção e tristeza (a declaração de Bolsonaro). Como governador de Estado, gostaria de ter um presidente que liderasse o país em uma crise como esta. Fico triste, enquanto cidadão. É triste que não tenhamos uma liderança capaz de liderar a sua equipe e acalmar os brasileiros”.
Doria, que é sempre citado pela crônica política como pré-candidato a presidente da República nas eleições de 2022, nas quais Bolsonaro deverá tentar a reeleição, deixou claro que não falava com viés político, “mas com sentimento de brasileiro”. Pontuou que, na ausência dessa liderança, governadores e prefeitos fazem o que Bolsonaro não consegue fazer”. Para ele, as medidas de alcance macro no combate à pandemia deveriam partir do governo federal. “No entanto, diante da falta de atitudes, os governadores têm agido para resguardar a população”. O governador de São Paulo elogiou o trabalho “competente e republicano” dos ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas.
A determinação sobre a quarentena em São Paulo tem validade de quinze dias e poderá ser prorrogada. Uma das medidas anunciadas é a do fechamento dos bares e restaurantes do Estado nesse período. “Esses estabelecimentos poderão mudar a sua forma de operação e passar a trabalhar em esquema ‘delivery’. É uma medida necessária”, argumentou João Doria. O prefeito da capital, Bruno Covas, do PSDB, endossou, praticamente, as palavras do governador. Ele disse: “Muita gente está achando que se trata de uma marolinha, mas é necessário isolamento social. É um ato de respeito ao próximo, de humanidade. Não é férias”. O presidente da República chegou a qualificar o governador paulista como “lunático” e ironizou com a lembrança de que as eleições presidenciais ainda estão distantes no calendário.
A relação de Bolsonaro com os governadores estaduais tem sido problemática, devido ao temperamento do presidente, considerado “bilioso”. O confronto mais sério foi travado com governadores do Nordeste, que se reuniram em “Consórcio” para fazer negócios diretamente com governos e empresários do exterior, sem a intermediação do Planalto. Isto irritou profundamente Bolsonaro e, sempre que possível, ele alfineta gestores nordestinos, a quem tratou, pejorativamente, como “governadores de paraíba”. Na sequência, o presidente comprou brigas pontuais com governadores do Sul e Centro-Sul, ampliando o seu isolamento político, o que preocupa aliados ainda fieis no Congresso Nacional.