Nonato Guedes, com agências
Perplexidade. Esta foi a reação de pessoas de diferentes segmentos da população brasileira diante da declaração do presidente Jair Bolsonaro, na noite de ontem, de que a rotina no país deve voltar à realidade e que a imprensa espalhou o pânico em torno da pandemia do novo coronavírus, o qual voltou a chamar de “gripezinha”. Em pronunciamento em rádio e televisão, Bolsonaro também criticou governadores por determinarem quarentena, com fechamento de comércio e fronteiras, e questionou o motivo pelo qual escolas foram fechadas. Durante os poucos mais de cinco minutos de fala do presidente, vários “panelaços” contra ele foram realizados em cidades brasileiras.
“O vírus chegou, está sendo enfrentado por nós e brevemente passará. Nossa vida tem que continuar, empregos devem ser mantidos, o sustento das famílias deve ser preservado, devemos, sim, voltar à normalidade”, acentuou Bolsonaro. Textualmente: “Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o fechamento de comércio e o confinamento em massa”. Bolsonaro também disse que pessoas saudáveis e abaixo dos 60 anos não correm grandes riscos e que não devem apresentar sinais da doença em caso de contaminação. “O grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos, então por que fechar escolas?”, questionou.
Idosos acima de 60 anos e pessoas com doenças pré-existentes são considerados pela Organização Mundial de Saúde como grupo de risco para o coronavírus, porém, a entidade tem reforçado que crianças e jovens adultos já morreram de Covid-19. As críticas de Bolsonaro ao isolamento social também contrariam orientações da OMS e do próprio Ministério da Saúde. Em consonância com a pasta, estão apenas recomendações de que fronteiras não devem ser bloqueadas e que o fechamento de escolas pode favorecer a contaminação de idosos por parte das crianças e adolescentes. O presidente disse que logo que houve a repatriação de brasileiros que estavam em Wuhan, epicentro do coronavírus na China, o necessário era conter “o pânico e a histeria” e traçar estratégia para salvar vidas e evitar “o desemprego em massa”. Antes da missão que repatriou os brasileiros, porém, Bolsonaro chegou a dizer que o governo brasileiro não deveria trazê-los de volta.
No pronunciamento, Bolsonaro afirmou que a imprensa encontrou“o cenário perfeito” para que a histeria se espalhasse pelo país. “Quase contra tudo e contra todos, grande parte dos meios de comunicação foram na contramão, espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro-chefe o anúncio do grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com clima totalmente diferente do nosso. Bolsonaro ainda ironizou o fato de alguns veículos, como TV Globo e CNN, embora sem citá-los, terem feito editoriais contra o pânico provocado pela pandemia desde ontem. “Parabéns, imprensa brasileira”, comentou o presidente. Ele também afirmou que seu histórico de saúde o deixa tranquilo caso ele seja contaminado pelo vírus. Bolsonaro realizou dois testes para o coronavírus, obtendo resultados negativos para o diagnóstico. No entanto, ao menos 23 pessoas que estiveram na mesma comitiva que ele durante viagem aos Estados Unidos contraíram covid-19.
– Pelo meu histórico de atleta, caso eu fosse contaminado pelo vírus eu não precisaria me preocupar – ou um “resfriadinho” ou “gripezinha” como disse aquele conhecido médico daquela conhecida televisão – adiantou. A referência foi ao médico Dráuzio Varela, comentarista da TV Globo, que minimizou a doença em um vídeo do dia 30 de janeiro, semanas antes de a OMS declarar pandemia de coronavírus no mundo e quando o isolamento social ainda não era uma das medidas recomendadas pela entidade internacional. O vídeo foi resgatado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que pediu desculpas na manhã de ontem pelo ocorrido.