Nonato Guedes
A data de hoje assinala o transcurso de 56 anos da instauração, no Brasil, de uma autodenominada “revolução civil-militar democrática” que passou à História como golpe ou ditadura militar, em face do rodízio de generais na Presidência da República e das arbitrariedades e violações de direitos humanos que foram cometidas. O movimento militar de 31 de março de 1964 provocou a deposição do governo de João Goulart e a consequente investidura do general Humberto de Alencar Castello Branco na presidência, promoveu cassações de mandatos de líderes políticos, perseguições contra professores universitários, magistrados, juízes, líderes sindicais, trabalhadores rurais, religiosos, jornalistas e outros profissionais liberais. O regime durou 21 anos (capitulou em 1985) e teve ainda como saldo a prática de torturas, prisões ilegais e assassinatos de dissidentes políticos. O último presidente do ciclo militar foi o general João Batista de Figueiredo, que sob pressão concedeu anistia a exilados e a presos políticos e liberalizou o sistema, facilitando a reorganização partidária.
As cassações e arbitrariedades atingiram a Paraíba, da Assembleia Legislativa à Universidade Federal. O então presidente da Assembleia, Clóvis Bezerra Cavalcanti, já falecido, que depois foi vice-governador e governador do Estado, hipotecou apoio ao movimento militar e acatou sugestão do deputado Joacil de Brito Pereira para cassar os mandatos dos deputados Assis Lemos, Langstein Almeida e dos suplentes Figueiredo Agra e Agassiz Almeida, todos do PSB. Na Câmara Municipal de João Pessoa, presidida pelo vereador Cabral Batista, foi cassado o mandato do vereador Antônio Augusto Arroxelas. O ex-governador Pedro Gondim, que estava à frente do Executivo em março de 64 e que supostamente teria tomado posição dúbia, foi cassado quando deputado federal pelo Ato Institucional número cinco, de dezembro de 1968, por ter se solidarizado com o deputado Márcio Moreira Alves, punido por causa de discurso contrário ao movimento militar.
Outros paraibanos ilustres como o ex-ministro do Planejamento de Goulart, Celso Furtado, o ex-ministro da Justiça, Abelardo de Araújo Jurema, os deputados Antônio Vital do Rêgo, José Joffilly, o reitor da UFPB, Mário Moacyr Porto, desembargador Emílio de Farias, deputados Osmar de Aquino, Sílvio Porto, Francisco Souto, José Maranhão, Robson Espínola, Mário Silveira, Romeu Abrantes, foram alcançados por atos de exceção. Prefeitos como Newton Rique, Ronaldo Cunha Lima, Severino Cabral, todos de Campina Grande, Domingos de Mendonça Neto, de João Pessoa, também sofreram punições. No Décimo Quinto Regimento de Infantaria em João Pessoa, foram torturados presos políticos como Antônio Augusto Arroxelas, Antônio Dantas, um dos fundadores da Liga Camponesa de Santa Rita. O jornalista Jório de Lira Machado, que mais tarde se tornou deputado estadual, foi mandado para a ilha de Fernando de Noronha, onde foi torturado. Lá estavam outros prisioneiros, inclusive o governador de Pernambuco, Miguel Arraes, deposto no Palácio do Campo das Princesas, no Recife, depois de argumentar que não renunciaria ao cargo.
A manifestação da Assembleia Legislativa, de apoio ao movimento militar, foi justificada pela Mesa Diretora com o pretexto de defesa da normalidade democrática. Na manhã do dia primeiro de abril de 64, o presidente Clóvis Bezerra convocou e abriu sessão extraordinária da Casa, que na época tinha 40 integrantes, para discutir a situação em que se encontrava o país. Submeteu a plenário nota oficial prestando total apoio às Forças Armadas, pela decisão de depor o governo Goulart, sob o argumento de que era preciso sustentar a defesa das grandes tradições brasileiras no tocante à liberdade, à religião, à família e à propriedade. Clóvis informou, na ocasião, que a Mesa iria expedir telegrama congratulando-se com as autoridades competentes “pela maneira como agiram em face dos últimos acontecimentos no país, sem haver derramamento de sangue e mantendo o regime democrático”. Comunicou, também que recebera a visita do coronel Ednardo D’Avila Mello, comandante do Regimento de Infantaria da Capital, que foi à Assembleia externar seus agradecimentos pela maneira como se comportou o Poder Legislativo da Paraíba, durante o período que marcou o início do governo militar no Brasil.Muitos dos perseguidos pela ditadura militar conseguiram, na redemocratização, dar a volta por cima, na Paraíba e em todo o país. Em nosso Estado, um dos exemplos foi a eleição de Ronaldo Cunha Lima e de José Maranhão ao governo, bem como a retomada de mandatos por parlamentares e reintegração de autoridades e profissionais atingidos por atos excepcionais.