Nonato Guedes
Em meio à controvérsia que cerca a realização de eleições para prefeitos e vereadores em todo o país em outubro, com propostas de adiamento ou cancelamento, alegando como pretexto a pandemia do coronavírus, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ, presidente da Câmara Federal, e o ministro Luís Roberto Barroso, que assumirá em maio a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, mostram-se como fiadores da efetivação do pleito de acordo com o calendário estabelecido. Barroso assumirá o posto no auge da crise do coronavírus no território nacional. Segundo a revista “Veja”, ele trabalha com o mês de junho como data-limite para que se avalie se o cenário exige ou não o adiamento da disputa eleitoral.
Barroso, em entrevista, defendeu a tese de que as eleições sejam realizadas neste ano, ainda que nos últimos dias de dezembro. “Se não for seguro o comparecimento às seções de votação, será o caso de adiar as eleições, mas tenho confiança em que a situação estará controlada até então”, frisou. Ministros do TSE relataram a “Veja” que técnicos do tribunal já reportaram por diversas vezes o temor de que não seja possível as eleições ocorrerem em outubro. Os receios vão desde os testes ainda não concluídos em urnas eletrônicas até o risco de não haver condições sanitárias mínimas para garantir as disputas municipais. Barroso sustenta ser precipitado traçar agora um plano de contingência para as eleições e refuta a ideia de o Judiciário encampar iniciativas oportunistas que já começaram a aparecer.
De sua parte, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que apoia Eduardo Paes, também do DEM, para a prefeitura do Rio, diz ser contrário ao adiamento das eleições. Maia foi mais além: operou nos bastidores para estancar a manobra pró-adiamento no nascedouro. Disse a interlocutores que não colocará em votação nenhuma proposta que vise empurrar o pleito municipal para daqui a dois anos. Esse recado já teria sido repassado a ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral. Rodrigo teria encomendado um parecer jurídico à consultoria da Câmara, que além de classificar como inconstitucional a prorrogação do mandato de prefeitos e vereadores, diz que os municípios brasileiros podem ser administrados provisoriamente por juízes a partir de janeiro, caso não haja eleições até o fim do ano.
Analistas políticos e jurídicos advertem que mudar a data das eleições pode se constituir em tarefa de difícil materialização. É necessário agrupar, de imediato, o apoio de um terço de deputados ou de senadores para que o tema comece a tramitar no Congresso Nacional e depois submeter a proposta a duas votações tanto na Câmara quanto no Senado. Com o Congresso, atualmente, realizando sessões remotas apenas para aprovação de medidas de emergência ditadas pelo coronavírus, fica bloqueado o corpo-a-corpo de líderes políticos e partidários para a costura de apoios e arregimentação de votos em torno da proposta. Em último caso, será necessário conseguir o aval do Supremo Tribunal Federal para flexibilizar uma trava na Constituição, conhecida como princípio da anualidade, que não permite que se troquem regras eleitorais a menos de um ano do pleito de outubro.
Entre os defensores de não realização de eleições este ano figura o senador Ciro Nogueira, do PP-PI, que tenta angariar apoios para alterar a Constituição, prorrogar o mandato atual de prefeitos e vereadores por mais dois anos e unificar as eleições a partir de 2022. O parlamentar exerce influência sobre um contingente de cerca de 200 prefeitos no seu Estado. “A unificação do pleito é uma demanda antiga”, argumenta Nogueira, que foi denunciado na operação Lava-Jato. Até os últimos dias haviam surgido três Propostas de Emenda Constitucional que pedem não só o adiamento da eleição mas também a unificação com o pleito nacional de 2022. Os autores das propostas foram os senadores Major Olímpio (PSL-SP) e Elmano Férrer (Podemos-PI), e o deputado Aécio Neves (PSDB-MG), que mesmo pilhado pela Lava-Jato ainda mantém proximidade com muitos prefeitos, principalmente em Minas Gerais.
Major Olímpio diz que além de prolongar o mandato de prefeitos e vereadores, deseja reunir dois bilhões de reais do fundo dos partidos e mais um bilhão, que seria o custo da Justiça Eleitoral para organizar as eleições, e destinar tudo para a saúde pública, que atualmente enfrenta situação de calamidade.
O tema é controverso, envolve oportunismos e muitos interesses escusos. Mas, como adverte com propriedade a colunista Dora Kramer, em artigo, também na “Veja”, “adiar eleição nunca é bom, mas não se pode evitar o tema só porque é de difícil execução”.