Nonato Guedes
O arcebispo emérito da Paraíba, Dom Aldo de Cillo Pagotto, que faleceu ontem em Fortaleza, teve uma atuação marcada por polêmicas à frente da Arquidiocese, onde atuou por treze anos, sucedendo a Dom Marcelo Carvalheira. Ele morreu aos 70 anos e era natural de São Paulo, primo do cardeal Agnelo Rossi, tendo exercido missões em Minas Gerais, Pernambuco e Ceará, onde foi bispo de Sobral. Como arcebispo da Paraíba – posto a que renunciou em 2016 – “comprou” muitas polêmicas, tendo proibido padres de disputarem cargos políticos nas eleições, apesar de manter laços estreitos com grupos políticos locais, o que lhe valeu críticas num Estado dominado pela polarização nas disputas. Foi criticado por sua ligação com a doutrina espírita, inclusive participando de eventos para os quais era convidado.
O caso mais rumoroso da sua passagem pela Arquidiocese foi a acusação de envolvimento com casos de exploração sexual de jovens e adolescentes. Dom Aldo chegou a ser impedido de ordenar – houve, praticamente, uma intervenção da Santa Sé. O Ministério Público do Trabalho abriu inquérito para apurar denúncias graves contra Dom Aldo Pagotto mas não o inquinou de culpa e sabe-se que o próprio Vaticano instaurou processo de investigação, cujos resultados nunca vieram a público. A Arquidiocese chegou a ser condenada a pagar multa equivalente a R$ 12 milhões em face das denúncias, punição que foi revista após recurso. Dom Aldo atribuía as acusações a inimigos que atuavam contra ele dentro da Igreja.
A proibição da disputa de mandatos políticos por padres desencadeou protestos do então deputado federal Luiz Couto e do Frei Anastácio Ribeiro, então deputado estadual, hoje federal, ambos filiados ao Partido dos Trabalhadores. Dom Aldo comandou a desativação de ações e projetos sociais da Igreja que constituíram prioridade dos antecessores – dom Marcelo Carvalheira e dom José Maria Pires, sobretudo deste, que era alinhado a dom Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, expoente do chamado “clero progressista” que postulava princípios filosóficos inscritos no Concílio Vaticano Segundo, evento que revolucionou a Igreja em todo o mundo, especialmente na América Latina.
Na apresentação do livro de Dom Aldo, “O Evangelho nos nossos dias”, lançado pela Forma Editorial, do jornalista Carlos Roberto de Oliveira, o pastor Estevam Fernandes, da Primeira Igreja Batista de João Pessoa, definiu: “Amado por muitos, incompreendido por outros, consequência inevitável de quem se expõe e não tem medo de assumir posições polêmicas, Dom Aldo vai escrevendo sua história em nossa terra, deixando marcas indeléveis de quem tem consciência histórica não só do ministério episcopal, mas também de cidadania, de compromisso com as transformações que urgem em nossa sociedade tão anticristã e desigual”. Para o pastor Estevam, Dom Aldo tornou-se uma das figuras mais importantes, na época, na história da Paraíba, “especialmente porque ele transpõe os limites do religioso e se faz presente nos dramas existenciais do nosso povo”.
E acrescentou o pastor Estevam: “Ouve-se a sua voz delatando as injustiças sociais, clamando por políticas públicas não alimentadoras de assistencialismo decadente, mas, sim, voltadas para o desenvolvimento humano, como educação de qualidade e emprego e renda que gerem condições mínimas de vida digna. Dom Aldo é um sacerdote comprometido com o que há de mais precioso sobre a terra: a vida humana”. Dom Aldo Pagotto projetou-se, ainda, na Paraíba, como presidente do Comitê Estadual em defesa da transposição das águas do rio São Francisco, tendo coordenado reuniões com representantes do governo do Estado e de entidades da sociedade para discussão das prioridades da Paraíba no projeto.
Depois de uma visita feita aos canais de captação em Floresta e Cabrobó, Dom Aldo escreveu na imprensa local que a transposição das águas significava garantia de desenvolvimento estadual e regional para a Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Sugeriu ser importante o envolvimento da população nos estudos sobre “essa obra estrutural que solucionará o problema secular da carência de abastecimento de água no semiárido nordestino”. E pontuou Dom Aldo: “As águas advindas da transposição não estão sendo roubadas de ninguém. São volumes imensos de águas que correm para o mar. Esses volumes deverão se integrar aos nossos açudes, suprindo suas carências, sobretudo na iminência das estiagens”.