Nonato Guedes
Em discurso pronunciado na tribuna do Senado, um dia após o sepultamento do presidente Tancredo Neves, que faleceu a 21 de abril de 1985, o senador paraibano Humberto Lucena (PMDB) referiu-se às manifestações de pesar “vindas dos quatro cantos do mundo” e às “demonstrações da mais viva emoção do povo brasileiro, de norte a sul, de leste a oeste, pranteando a perda do seu convívio entre nós”. Humberto frisou que não havia precedentes de tamanho vulto registrados em nossa História. “Pensávamos todos até bem pouco que a mobilização popular pelas eleições diretas para presidente da República e posteriormente a sua (Tancredo) própria campanha em busca do indispensável respaldo do povo, como único meio de legitimar a sua eleição, não pudessem ser igualadas ou comparadas tão cedo em nossa História”. Terça-feira próxima, a morte de Tancredo Neves completará 35 anos.
– Mas nesses três últimos dias, vimos como é possível a um único homem obter a unanimidade de uma nação inteira em torno de si. Nunca, em momento algum, o Hino Nacional identificou-se tanto com uma só pessoa. Jamais a Bandeira brasileira foi tão usada para simbolizar o ideal de um só homem. Faço minhas as palavras que Afonso Arinos usou para saudar, neste Parlamento, o presidente francês Charles De Gaulle: “Vós sois um desses homens que a História elege em cada século para simbolizar no traçado de uma vida o destino inevitável de um povo – acrescentou Humberto Lucena, já falecido. O parlamentar citou a seguinte afirmação de Tancredo no discurso de sua vitória, em 15 de janeiro de 1985: “A política, tal como a entendemos, é a mais nobre e recompensadora das atividades humanas. Servir ao povo reclama dedicação incansável, noites indormidas, o peso abrasador das emoções. São muitos os que sucumbem em pleno combate, legando-nos o exemplo do seu sacrifício pela Pátria”. Para Humberto, tais palavras exprimiam a síntese da vida pública de Tancredo Neves, “desde o princípio difícil nos anos 30 até a agonia final suportada no calvário de quarenta dias”.
Dirigindo-se, no discurso, ao político mineiro, Humberto Lucena frisou: “Presidente Tancredo Neves: do mesmo modo que Tiradentes, seu conterrâneo de São João del Rei, no século XVIII, traçou os caminhos inexoráveis da Independência que Pedro I faria no século XIX, Vossa Excelência deixa marcada indelevelmente a trilha da democracia da Nova República, de que foi o arquiteto no século XX. O legado de V. Exa., representado pelo seu holocausto, em nome da preservação das instituições democráticas e pela Pátria, será cumprido pelo seu povo custe o que custar. Essa é a promessa que o seu partido lhe faz em honra do seu martírio. Confiamos nós que o presidente José Sarney honrará, respeitará e cumprirá plenamente os ideais da Aliança Democrática, constituída sob sua inspiração e seu comando para promover a redenção do País”.
Humberto Lucena, que foi presidente do Senado por duas vezes consecutivas, arrematou a oração pontuando: “Esteja certo, Presidente Tancredo Neves: V. Exa. Não morreu. Permanece vivo na memória dos 130 milhões de brasileiros que choraram durante a sua lenta e penosa agonia e que farão do seu sacrifício a bandeira e o símbolo da maior luta pela realização dos seus sonhos. Não, Presidente, V. Exa. Não morreu; apenas, passou para a glória da imortalidade, pois sua sombra há de ficar aqui”. Em setembro de 1985, num discurso também na tribuna do Senado, Lucena dizia constatar com renovado otimismo que o governo de Sarney “continuou caminhando aceleradamente para resgatar os compromissos que a Aliança Democrática assumiu nas praças públicas deste país”. De acordo com Lucena, o país ingressara definitivamente na era da democracia e, na área social, apesar do curto espaço de tempo, alguns resultados significativos já se faziam comprovar.