Nonato Guedes
O presidente Jair Bolsonaro não consegue disfarçar que ficou profundamente abalado com as oito horas de depoimento do seu ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro na Polícia Federal em Curitiba. Como o processo corre em segredo de Justiça, ainda não vazou muita coisa. Ainda. Mas algumas informações já circulam. Sabe-se, por exemplo, que Moro apresentou as tais “provas concretas” de tentativa de interferência política de Bolsonaro na Polícia Federal. Embora a PF esteja vinculada diretamente à Presidência da República, a Constituição não dá ao governante de plantão poderes excepcionais para ingerir em investigações que são conduzidas de acordo com a lei. Bolsonaro quis barrar essas investigações, na presunção de que elas poderiam alcançar filhos seus e milicianos apoiadores em casos nebulosos da história política recente do país.
No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, no domingo, o capitão-presidente proporcionou ao mundo inteiro mais um espetáculo ridículo, repugnante e ofensivo às instituições democráticas do Brasil. Incentivou ataques a jornalistas, comandou novos atos de desobediência a regras sanitárias rigorosas em tempos de pandemia do coronavírus e, na recaída golpista de praxe, acenou com a necessidade da volta do regime de força, explicitando que sua paciência esgotou e que não admitirá mais ser contestado na ofensiva limitada para concentrar atribuições excepcionais. Em troca, Bolsonaro colheu manifestações de repúdio, de ministros do STF a dirigentes de instituições da sociedade civil. Vai-se ampliando o isolamento político do presidente da República.
A reiteração de ameaças ao Supremo Tribunal Federal e ao Congresso – depois de ter atacado governadores, ministros, prefeitos, indígenas, ambientalistas, enfermeiras, confirma as suspeitas de há muito alimentadas por segmentos conscientes da sociedade de que Bolsonaro está acometido de algum tipo de sanidade, que cabe a especialistas classificarem com exatidão. Na opinião do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, do DEM, o presidente optou por tentar espalhar uma atmosfera de terror no âmbito da sociedade. Quer se apoiar exclusivamente nos quartéis, mas lideranças militares de expressão já vieram a público repetir que o limite é a Constituição. Que Bolsonaro finge respeitar enquanto comete atentados diários à Carta Maior.
“Amanhã, qualquer um que se opõe à visão de mundo dele (Bolsonaro) será vítima. Cabe às instituições democráticas impor a ordem legal a esse grupo que confunde fazer política com tocar o terror”, escreveu Rodrigo Maia no Twitter. Arrematando: “Que a Justiça seja célere para punir criminosos”. A presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, afirmou, incisiva: “Basta! Não é possível que o jogo da morte e o desprezo pela democracia tenham continuidade a cada final de semana, com o presidente da República ameaçando o Judiciário e o Legislativo, e a horda de fascistas que o apoiam atacando a imprensa e a oposição, tentando calar quem denuncia o arbítrio”.
Disse Gleisi Hoffmann didaticamente: “Toda semana, o presidente decide estimular vândalos a usurparem a bandeira nacional, vestirem-se de verde e amarelo e ameaçar o Supremo e o Congresso, arrotando vitupérios contra a oposição e a imprensa. Isto é inadmissível”. E mais: “As Forças Armadas sequer repreendem o Vândalo-Geral da República e deixam por isso mesmo até o próximo ataque a Rodrigo Maia, Dias Toffoli ou a qualquer outro que discorde dessa cantilena fascista. Basta! Os democratas precisam reagir”. Gleisi afirmou ainda ser simbólico que Bolsonaro lance nova ofensiva contra as instituições republicanas na semana em que o mundo relembra os 75 anos das mortes de Adolf Hitler, que se suicidou em 30 de abril de 1945, e Benito Mussolini, morto em praça pública em Roma, em 28 de abril do mesmo ano. “As instituições e os democratas não podem se curvar ante o fascismo e a escalada do arbítrio, porque a história ensina que o preço que pagamos por não deter o fascismo é a morte e o fim do pluralismo de opiniões”.
O presidente disse que não tem mais paciência com a falta de poderes ditatoriais. Pois está na hora de saber que está pro um fio a paciência da maioria do povo brasileiro com ele e seu governicho. O impeachment já pontua no horizonte. É questão de tempo – ou de estratégia.