Nonato Guedes
O ex-governador Wilson Leite Braga, que faleceu ontem à noite, fazia jus à alcunha de “animal político” que lhe deram os aliados e os adversários. Além de ser um dos maiores líderes populares da história da Paraíba, disputou o maior número de eleições partidárias e a sua escalada como homem público abrangeu mandatos de vereador (em João Pessoa) a governador. O único posto que faltou no seu currículo foi o de senador, a que concorreu por duas vezes, sendo, porém, derrotado. Perdeu para dois azarões políticos – em 1986, para o empresário Raimundo Lira, que se elegeu na cauda do cometa Tarcísio Burity e na esteira do Plano Cruzado, e em 2002 para Efraim Morais, que se fez ousado e “colou” na campanha do candidato favorito ao governo do Estado, Cássio Cunha Lima, enfim consagrado.
A respeito da derrota experimentada em 86 ao Senado, Wilson atribuiu-a ao “vendaval mudancista”, em declarações a jornalistas. Mais diretamente, entendia que o Plano Cruzado, lançado pelo presidente José Sarney e que alcançou inédita popularidade, favoreceu candidaturas do PMDB e moeu favoritos como ele, na Paraíba, e Roberto Magalhães, em Pernambuco. Uma espécie de “tsunami” político, como ficaram conhecidas, depois, as reviravoltas políticas. O fato de, também, ter se dedicado à campanha para o governo com afinco, enfeixando praticamente todas as decisões, teria contribuído para o revés, mas, nesse ponto, ele se defendeu com o argumento de que demonstrou não agir de forma individualista. O candidato à sua sucessão lançado por Wilson acabou sendo o então senador Marcondes Gadelha, que substituiu a José Carlos da Silva Júnior, ex-vice de Braga. José Carlos renunciou à postulação por desconfiar que seria “cristianizado” durante a campanha e por não aceitar pressões para atuar como “trem-pagador” das campanhas de candidatos majoritários e proporcionais do PDS.
Fosse como fosse, a sorte parecia sorrir antecipadamente para a candidatura de Tarcísio Burity, que num salto triplo carpado ingressou no PMDB na undécima hora dos prazos legais, na condição de “soldado”, já que o candidato natural do partido ao Palácio da redenção era o senador Humberto Lucena. Este acabou abrindo mão da pretensão em favor de Burity, após ser internado com problemas de saúde no Incor, em São Paulo, de onde expediu proclamação ao eleitorado paraibano. Burity estava no auge do seu prestígio político – havia se credenciado no primeiro governo, a que chegou por via indireta, por ter socorrido flagelados de cidades do interior da Paraíba com frentes de emergência bancadas com dinheiro do próprio Estado em uma das secas cíclicas. Lucena optou por concorrer novamente ao Senado, juntamente com Lira. Os dois completaram o triunfo peemedebista, derrotando Braga e Maurício Leite.
Num desabafo com pessoas do seu círculo, Wilson queixou-se de ingratidão de correligionários, detentores de mandatos, que usufruíram do seu governo e tiveram uma ou outra pretensão desatendida. Tais aliados, por represália, não teriam se empenhado na sua batalha para chegar ao Senado em 86. “É a repetição da velha estória: quem faz noventa e nove, mas não completa os cem, nada fez”, resumiu. Deixava claro, para todos os efeitos, que não abandonaria a política nem o seu estilo denominado de populista. Reconhecia ter cometido erros, como decorrência, entretanto, do dever de não se omitir. Enfático, chegou a afirmar à revista “A Carta”, de Josélio Gondim: “Fui injustiçado pelo povo, mas não fui o primeiro nem serei o último. A Paraíba já derrotou, em eleições, José Américo de Almeida, Argemiro de Figueiredo, Alcides Carneiro, Assis Chateaubriand, Ruy Carneiro e Pedro Gondim. Nem por isso eles foram menos amados e honrados”.
Num esforço para não somatizar a perda do mandato nem agravar a dor das feridas que estava lambendo, Wilson Braga ainda se reportou ao episódio de 86, fazendo analogia com derrotas de outros candidatos ilustres ao Senado: “São acidentes de percurso, consequências de incompreensões circunstanciais, herança de climas emocionais, como o desejo de mudança que hoje motiva o país. Gosto de política, gosto do povo, sou do ramo. O tempo vai mostrar que fiz um dos melhores governos da Paraíba, dando ao social a prioridade que prometi e sempre considerei imprescindível”. A eleição de Wilson a deputado estadual em 1954, quando tinha apenas 23 anos de idade, causou surpresa por ter significado superação de barreiras num partido conservador que reunia segmentos patronais como usineiros da Várzea paraibana.
Wilson Braga entra, indiscutivelmente, com méritos, no panteão dos grandes benfeitores da Paraíba. Tinha uma sensibilidade autêntica, inata, para com os mais pobres, os despossuídos de bens ou de recursos. Talvez como reflexo das suas origens humildes, fincadas em Conceição, no Vale do Piancó, e do conhecimento da realidade de pobreza do interior da Paraíba que conheceu na pele como poucos. Para usar um termo incorporado ao jargão político, Wilson tinha “cheiro de povo”. Era com o povo com que quem ele mais se identificava. E também tinha fome de votos, daí a quantidade de mandatos que disputou.