Nonato Guedes
Parabéns à senadora paraibana Daniella Ribeiro (PP) pela postura de sensibilidade que a levou a encampar o movimento para adiamento de provas do Enem, exames e demais atividade de seleção para acesso ao ensino superior, devido à pandemia do coronavírus e à situação de desigualdade para alunos sem condições sociais e financeiras de manter os estudos nesta fase, ou sequer de ter acesso às ferramentas necessárias para o ensino à distância. Nota zero para o senador Flávio Bolsonaro (RJ), filho do capitão-presidente Jair Bolsonaro, o único a se posicionar contra a proposta de Daniella. Também nota zero para o ministro da Educação, Abraham Weintraub (o que esse senhor ainda faz nesse governicho?), que chegou a acusar a “esquerda” de agir para que o exame não aconteça.
O filho do capitão e o ministro capacho do presidente são pródigos na produção de asneiras desde que subiram a rampa do Palácio do Planalto junto com Messias Bolsonaro. O ministro é uma figura folclórica no governo. Já foi visto deitando falação em tom doutoral deitado numa rede e posando ostensivamente para fotógrafos e comanda uma Pasta bagunçada por causa da influência avassaladora do astrólogo e “guru” dos Bolsonaro, Olavo de Carvalho. Não tem noção da complexidade dos desafios que abarcam o segmento educacional brasileiro, raramente pisa os pés em Estados ou municípios. E deixa-se enredar pela paranoia da suposta “guerra ideológica” que permeia o governo Bolsonaro e que insiste na desgastada polarização direita-esquerda no país.
Na cabeça desorganizada do ministro Weintraub, a proposta de adiamento do Enem seria uma orquestração da esquerda – como se a senadora Daniella Ribeiro tivesse alguma inflexão ideológica nesse sentido e não fosse signatária, em certos momentos, de teorias conservadoras. A diferença é que Daniella sabe separar o joio do trigo – e perpassar embates irrelevantes quando está em jogo o interesse maior de parcelas expressivas da população. A questão do Enem e de outros vestibulares para acesso ao ensino superior tem implicações sociais no campo da desigualdade no Brasil, dada a dificuldade de acesso de muitos alunos de famílias pobres a ferramentas tecnológicas para o ensino preparatório à distância. Em relação a esse ponto, é prego batido, ponta virada. Não há o que polemizar.
Até hoje, segundo o ministério da Educação, o Enem conta com quatro milhões de inscritos – e é claro que há estudantes mais abonados que praguejam contra adiamentos. Só que a emergência vivida pelo país e, mais grave ainda, a calamidade que se agrava diariamente, tem subvertido o calendário e a normalidade das mais inimagináveis atividades. Vivemos um quadro em que shows artísticos são cancelados, atividades culturais ficam suspensas, o turismo sumiu do mapa, aulas estão suspensas – e a moeda corrente é a comunicação virtual, online, seja nas sessões de votação dos Legislativos de todo o país, nas videoconferências entre governadores ou destes com o presidente da República e nas “lives” que cantores e cantoras apresentam como formas de reinvenção da sobrevivência em tempos de pandemia.
O ambiente na Câmara dos Deputados, como relatou a jornalistas o presidente Rodrigo Maia, era pelo adiamento do Enem antes que houvesse a votação no Senado. “O melhor era que pudesse vir do presidente da República uma decisão antes que o Senado e a Câmara tomassem a decisão de votar para não parecer que é uma coisa contra o governo. Essa demanda de adiamento do Enem vem de todo o Brasil”, expressou Rodrigo Maia. O posicionamento da senadora paraibana Daniella Ribeiro expressou, justamente, o sentimento generalizado de preocupação com uma situação instável para jovens que mesmo convivendo com o nada admirável mundo novo da pandemia do coronavírus ainda se dão ao direito de sonhar com um futuro melhor, passada a quarentena e virada a página do isolamento social.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, do DEM, defendeu a prerrogativa da Casa de votar o projeto do adiamento porque, segundo ele, os senadores buscaram uma conciliação com o governo por mais de quarenta dias, sem sucesso. Quer dizer: pregaram no deserto enquanto Bolsonaro dava milho aos pombos, provocava aglomerações e vendia a todo custo o uso da cloroquina como pomada maravilha, interessado em beneficiar industriais de medicamentos que querem faturar com a desgraça do povo. O líder do PDT no Senado, Weverton Rocha, disse que o ministro da Educação “não tem um pingo de sensibilidade para entender o que está acontecendo de verdade no Brasil”.
Que bom que há vida inteligente no Parlamento. E que a Paraíba saia bem na fita, numa conjuntura de radicalismos e de muitas bobagens também.