Nonato Guedes
O ex-governador Wilson Leite Braga e sua mulher, a ex-deputada federal Lúcia Braga, que morreram nos últimos dias, em virtude de várias complicações, decorrentes, inclusive, do novo coronavírus, não deixaram herdeiros políticos na cena paraibana, mas discípulos dos estilos e do legado de obras e de realizações no exercício de mandatos executivos e legislativos. Wilson foi governador, prefeito de João Pessoa, deputado federal, deputado estadual e vereador. Lúcia foi a primeira mulher eleita deputada federal na história local, exerceu mandato na Assembleia Legislativa e presidiu a Fundação Social do Trabalho, Funsat, que viabilizou empreendimentos de apoio a carentes da população.
Historiadores como José Octávio de Arruda Mello observam que o casal se alternava na hegemonia política, no que diz respeito à disputa de cargos eletivos, superando eventuais divergências políticas-ideológicas (Lúcia era tida como mais à esquerda, enquanto Wilson sustentou, por longo tempo, ligações com grupos econômicos e políticos conservadores, tendo, já nos momentos finais da trajetória, se vinculado ao ideário socialista do ex-governador do Rio, Leonel Brizola, com filiação no PDT). Filhos do casal como Marcelo e Patrícia, já falecidos, não tinham o perfil de herdeiros políticos, embora Marcelo tivesse inclinações para a atividade. A filha remanescente, Mariana, nunca se envolveu diretamente em campanhas.
O caráter personalista da biografia de Wilson, na opinião de historiadores, fazia com que ele tivesse um estilo pessoal e intransferível, calcado no populismo e no clientelismo. Certa feita, instado a se definir numa entrevista para o extinto jornal “O Norte”, Wilson admitiu que se considerava “um populista progressista”. No início da trajetória, nos anos 50, ele formou nos quadros do PSB que tinha figuras de expressão como Osmar de Aquino e Nizi Marinheiro, reconhecidamente alinhados com teses socialistas. Mas acabou sendo empurrado para uma demorada militância na UDN e sucedâneos – Arena, PDS, PFl. Registrou, partidariamente, passagens pelo PDT, PMDB e, por último, pelo PSD. A base da liderança política de Wilson no Estado era centrada em redutos conservadores de cidades do interior.
Já Lúcia migrou de formação católica, sedimentada em movimentos de que participou, para uma postura mais avançada em termos ideológicos. Mesmo filiada a PDS ou ao PFL, por injunções da aliança com o marido, Wilson, votou com parlamentares progressistas e de esquerda na Assembleia Nacional Constituinte e declarou preferência pela candidatura de Tancredo Neves a Presidente no colégio eleitoral indireto de 1985, enquanto o marido era partidário declarado de Paulo Maluf, derrotado na disputa. Lúcia só veio a se projetar politicamente, de forma mais expressiva, na campanha de Wilson a governador em 1982, em que este derrotou Antônio Mariz, do PMDB. Ela arregimentou parcelas do eleitorado feminino no denominado MAF – um Movimento de Ação que atuou na linha de frente das manifestações públicas de reforço à campanha wilsista.
Mais tarde, Lúcia comandou remanescentes do MAF na atuação desenvolvida á frente da Fundação Social do Trabalho – Funsat, instituição que adversários tratavam como “assistencialista”. As mortes de Wilson e Lúcia fecharam um ciclo relevante da história política paraibana. Ele tentou voltar ao governo em 1990 mas foi derrotado por Ronaldo Cunha Lima. Lúcia candidatou-se ao governo em 1994 mas perdeu para Antônio Mariz, que morreu no exercício do mandato. Mariz, aliás, também não deixou herdeiros políticos, mas discípulos, sobretudo entre os aliados da dissidência que comandou contra Tarcísio Burity em 1978 ao governo do estado por via indireta. Burity, igualmente, não tem herdeiros. Somente Ronaldo Cunha Lima logrou preservar a semente política, com o filho Cássio, que se elegeu governador por duas vezes, senador, deputado federal e prefeito de Campina Grande, e com o neto Pedro Cunha Lima, que está no exercício de mais um mandato de deputado federal.