Nonato Guedes, com agências
Teve ampla repercussão nos meios políticos e na sociedade como um todo a divulgação, ontem, do vídeo da reunião ministerial do governo Bolsonaro de 22 de abril, que integra o inquérito que investiga suposta interferência do presidente da República na Polícia Federal. As imagens foram divulgadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello. O ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, está se valendo de trechos das falas de Bolsonaro para provar a interferência dele na Polícia Federal, trocando dirigentes do órgão para proteger familiares e amigos seus possivelmente envolvidos com ilícitos. Apesar de Bolsonaro ter dito que as falas não o comprometem, líderes políticos no Congresso pensam o contrário e voltam a acenar com o fantasma do impeachment.
Sergio Moro pediu demissão dois dias depois da famosa reunião. O pretexto da saída, ocorrida em 24 de abril, segundo Moro, foi a decisão do presidente Bolsonaro de exonerar o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, contra a vontade do então ministro. Nesses trechos da reunião de 22 de abril, Bolsonaro externou por diversos momentos sua insatisfação com as informações que recebe dos serviços de inteligência, que, segundo ele, o desinformam. Ele diz que não pode ser surpreendido com notícias e menciona a Polícia Federal: “Pô, eu tenho a PF que não me dá informações”. Revelou ter um “sistema particular” de informações que, segundo ele, funciona, e reclamou que o sistema oficial “desinforma” – em entrevista à rádio Jovem Pan na noite de ontem, o presidente disse que o “sistema particular” é formado por conhecidos dele.
Depois de dizer que os serviços de informação são “uma vergonha” e que “não dá para trabalhar assim”, afirmou que iria interferir – nesse momento, olhou para o lado em que Sergio Moro estava sentado; disse ter o poder de interferir em todos os ministérios, sem exceção e mencionou preocupação de que familiares e amigos dele sejam prejudicados porque não pode “trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa”. Após a divulgação do vídeo da reunião, Bolsonaro comentou que as imagens desmontam “mais uma farsa” e mostram que não há “indício de interferência na Polícia Federal”. Sergio Moro comentou que “a verdade foi dita, exposta em vídeo”.
Ao reclamar que não podia viver sem informação e que os órgãos de inteligência do governo estavam desaparelhados nesse terreno, Bolsonaro foi incisivo: “Então é um apelo que eu faço a todos, que se preocupem com política pra não ser surpreendido. Eu não vou esperar o barco começar a afundar para tirar água. Estou tirando água de todos os ministérios no tocante a isso. A pessoa tem que entender. Se não quer entender, paciência, pô! Eu tenho o poder e vou interferir em todos os ministérios, sem exceção. Nos bancos, eu falo com o Paulo Guedes, se tiver que interferir. Nunca tive problema com ele, zero problema com Paulo Guedes. Agora, os demais, vou! Eu não posso ser surpreendido com notícias. Pô, eu tenho a PF que não me dá informação. Eu tenho as…inteligências das Forças Armadas que não tenho informação. ABIN tem seus problemas, tenho algumas informações. Só não tenho mais porque temos problemas, pô! Aparelhamento, etc. Mas a gente não pode viver sem informação. É uma realidade. Não adianta esconder mais, tapar o sol com a peneira”. Ao admitir que tentou trocar gente da sua segurança no Rio e que não conseguiu, ameaçou:
– Isso acabou. Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele. Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira”. Na reunião do dia 22 de abril, Bolsonaro também xingou governadores, criticou ações contra a Covid-19, entre outras afirmações. Além do presidente Bolsonaro, estavam na reunião o vice-presidente Hamilton Mourão, Sergio Moro e outros ministros. Ao todo, 25 autoridades participaram do encontro.