Nonato Guedes
O ministro Luís Roberto Barroso assume hoje a presidência do Tribunal Superior Eleitoral numa conjuntura recheada de incertezas, na qual é impossível dizer até mesmo a data em que o país terá eleições municipais para prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. “Quem vai bater o martelo são os sanitaristas”, revelou Barroso em entrevista ao “Correio Braziliense”, prevendo a decisão sobre realização de eleições para o fim da primeira quinzena de junho, em conjunto com o Congresso Nacional. Da sua parte, Barroso resiste a adiar as eleições e não coloca a prorrogação de mandatos no radar. “A prorrogação é antidemocrática”, observa. Mas, em caso extremo, admite o adiamento.
Ocupante de uma das 11 cadeiras do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso é um magistrado de opiniões fortes e popular entre seus pares, juristas e na sociedade em geral. Sobre as eleições, foi didático: “Eu não desejaria ter que adiar. O prazo das eleições está previsto na Constituição e penso que elas são um ponto vital para a democracia. Porém, nós não podemos fechar os olhos à realidade. Existe uma pandemia no mundo, ela atingiu o Brasil e a curva, neste momento, ainda é uma curva ascendente. Se até meados de junho a situação continuar semelhante à que se encontra hoje, talvez seja inevitável a necessidade de se adiar as eleições. E se for inevitável, que seja pelo prazo mínimo”.
O novo presidente do TSE disse que já fez uma intervenção informal com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, “para afinarmos as nossas posições e termos um discurso unificado sobre a eventual necessidade de adiamento”. Diz que é uma questão interessante porque, embora dependa do Congresso, é preciso uma emenda à Constituição, o que depende do TSE. Barroso adverte para a necessidade de haver condições técnicas para a realização das eleições e é por isso que acredita que a palavra final será dada pelos sanitaristas, “que vão nos dizer se e quando é seguro realizar uma eleição dessa amplitude, com mais de 140 milhões de eleitores, sem trazer riscos à população”. Acrescenta: “Nós vamos ouvir a ciência e a recomendação médica, procurando fazer o melhor possível dentro do contexto e com diagnóstico que eles nos fornecerão”.
Indagado como vislumbra a campanha eleitoral em meio ao cenário de pandemia, com as pessoas temerosas de sair às ruas, Barroso respondeu: “Nós temos etapas. Temos o primeiro momento, que são as convenções partidárias, cujo prazo é até 5 de agosto e que já envolveriam algum grau de aglomeração. Talvez seja viável fazer isso por videoconferência, embora seja relativamente complexo. Em 15 de agosto, teria início a campanha. A verdade é que em outros tempos a campanha era feita essencialmente de corpo a corpo nas ruas, em comícios que exigiam muito contato e aglomeração. Hoje em dia o perfil das campanhas mudou, sobretudo com o papel da televisão e das redes sociais, de modo que o corpo a corpo e aglomeração se tornaram um pouco menos importantes. É possível imaginar uma campanha feita via redes sociais, via televisão. Seja como for, nós só vamos poder deflagrar esse processo quando algum grau de contato social for possível. Por isso, estamos aguardando o momento certo para bater o martelo”.
O novo presidente do TSE asseverou ao “Correio Braziliense” que será preciso avaliar a curva da doença para tentar-se uma programação do futuro. “Mas a verdade é que a grande característica da pandemia que estamos vivendo é a indefinição, a imprevisibilidade. Caso seja preciso adiar, desejaríamos que fosse por apenas algumas semanas. Talvez para meados de novembro, ou no inicio de dezembro. Ou ainda fazer o primeiro turno em 15 de novembro e o segundo em 4 de dezembro. Faremos tudo que for possível para evitar a prorrogação de mandato. Se isso se impuser como uma coisa inevitável, o que eu espero que não aconteça, seria uma prorrogação pelo prazo mínimo, porque há muitos problemas de ordens diversas em uma prorrogação de mandato”. Segundo ele, a Constituição não prevê e, na redação atual, não autoriza a prorrogação de mandato. “Na verdade, a prorrogação de mandatos é antidemocrática em si, porque os prefeitos e vereadores que lá estão foram eleitos por um período de quatro anos. Faz parte do rito da democracia a realização de eleições periódicas e o eleitor ter a possibilidade de reconduzir ou não seus candidatos. Portanto, pela Constituição, não é possível prorrogar mandatos. Mas, evidentemente, em situações extraordinárias como essa pandemia, pode haver um motivo de força maior que leve o Congresso a contemplar essa possibilidade. Eu verdadeiramente espero que não aconteça em hipótese alguma”.
O novo presidente do TSE comentou ações que pedem a cassação da chapa do presidente Jair Bolsonaro e disse que pretende pautar a questão seguindo a ordem cronológica de tudo que esteja pronto para julgamento. “Portanto, essas ações de investigação perante a Justiça Eleitoral são conduzidas pelo corregedor-geral (atualmente o ministro Og Fernandes, que será substituído pelo ministro Luís Felipe Salomão). Quando o corregedor concluir a investigação, ele comunica a mim e eu pautarei. Vai ter o ritmo que o corregedor puder dar e que as provas forem apuradas. Nós somos juízes. Eu vou ser presidente de um tribunal. Juiz não apoia ninguém nem é adversário de ninguém. Há a Constituição, há as leis e as regras para serem cumpridas. Se ficar pronto para julgamento, vai a julgamento”.