Nonato Guedes, com agências
Em carta divulgada na noite de ontem, os governadores do Nordeste criticaram o posicionamento do presidente Jair Bolsonaro sobre a crise do coronavírus. O novo documento inicia com a advertência de que não é invadindo hospitais que o Brasil vencerá a pandemia. Foi uma referência à declaração feita por Bolsonaro na live de anteontem. Na ocasião, o presidente fez um apelo à população: que entrasse em hospitais públicos e/ou de campanha e filmassem leitos destinados à covid-19 para saber se estão vazios ou não. A ‘invasão’ recomendada por Bolsonaro seria para que imagens fossem produzidas e repassadas como ‘provas’ à Polícia Federal.
Bolsonaro também declarou alguns governadores estão tendo um ‘ganho político’ com as mortes relacionadas ao novo coronavírus. Diz um trecho: “O governo federal adotou o negacionismo como prática permanente e tem insistido em não reconhecer a grave crise sanitária enfrentada pelo Brasil, mesmo diante dos trágicos números registrados, que colocam o país como o segundo do mundo, com mais de 800 mil casos”. Assinam a carta os governadores da Bahia, Rui Costa, da Paraíba, João Azevêdo, de Alagoas, Renan Filho, do Ceará, Camilo Santana, do Maranhão, Flávio Dino, de Pernambuco, Paulo Câmara, do Piauí, Wellington Dias, do Rio Grande do Norte Fátima Bezerra e de Sergipe, Belivaldo Chagas. Enquanto isso, o neurocientista Miguel Nicolelis, que integra o Consórcio Nordeste, liderado pelos governadores da região, advertiu que “não é hora de reabrir o comércio”, ao comentar medidas que estão sendo tomadas por vários governadores e prefeitos, retomando atividades nos Estados e municípios.
Para Miguel Nicolelis, faltam coordenação nacional, plano estratégico e empatia com as vítimas, o que torna a reabertura do comércio um risco, pela possibilidade de ampliar a disseminação do coronavírus e ocasionar um colapso na rede pública de Saúde. Quanto à nova investida dos governadores nordestinos contra o presidente Jair Bolsonaro, eles sustentam que desde o início da pandemia receberam o desprezo como resposta às tentativas de apoio do presidente ao enfrentamento do coronavírus. Ressaltam, também, que estão sendo vítimas de perseguição por parte do governo federal, mencionando casos registrados em Estados onde os gestores se tornaram alvos da Polícia Federal. “Tais operações produzem duas consequências imediatas. A primeira, uma retração nas equipes técnicas, que param todos os processos, o que pode complicar ainda mais o imprescindível combate à pandemia. O segundo, a condenação antecipada de gestores punidos com espetáculos na porta de suas casas e das sedes dos governos”, diz um dos trechos da carta”.
Os governadores revelam que têm lutado fortemente contra o coronavírus e a favor da saúde da população em condições muito difíceis. “Ampliamos estruturas e realizamos compras de equipamentos e insumos de saúde, de forma emergencial, pelo rápido agravamento da pandemia. Foi graças à ampliação da rede pública de saúde, executada essencialmente pelos Estados, que o país conseguiu alcançar a marca de 345 mil brasileiros recuperados pela Covid-19 até agora, apesar das mais de 41 mil vidas lamentavelmente perdidas no país. Desde o início da pandemia, os governadores do Nordeste têm buscado atuação coordenada com o governo federal, tanto que, na época, solicitamos reunião com o presidente da República, Jair Bolsonaro, que foi realizada no dia 23/03/2020 com escassos resultados (…) O governo tem insistido em não reconhecer a grave crise sanitária enfrentada pelo Brasil”.
– No último episódio, que choca a todos, o presidente da República usa as redes sociais para incentivar as pessoas a invadirem hospitais, indo de encontro a todos os protocolos médicos, desrespeitando profissionais e colocando a vida das pessoas em risco, principalmente aquelas que estão internadas nessas unidades de saúde. O presidente Bolsonaro segue, assim, o mesmo método inconsequente que o levou a incentivar aglomerações por todo o país, contrariando as orientações científicas, bem como a estimular agressões contra jornalistas e veículos de comunicação, violando a liberdade de imprensa garantida na Constituição. Além de tudo isso, instaura-se no Brasil uma inusitada e preocupante situação. Após ameaças políticas reiteradas e estranhos anúncios prévios de que haveria operações policiais, intensificaram-se as ações espetaculares, inclusive nas casas de governadores, sem haver sequer a prévia oitiva dos investigados e a requisição de documentos. É como se houvesse uma absurda presunção de que todos os processos de compra nesse período de pandemia fossem fraudados, e governadores de tudo saberiam, inclusive quanto a produtos que estão em outros países, gerando uma inexistente responsabilidade penal objetiva” – protesta o documento. Os gestores deixam claro que defendem investigações, sempre que necessárias, “mas de forma isenta e responsável”.