Nonato Guedes
A ex-deputada estadual e ex-prefeita de Itabaiana, Eurídice Moreira, “Dona Dida”, que faleceu no último dia primeiro de julho em João Pessoa, vítima de complicações respiratórias decorrentes do coronavírus, criticava o machismo no comando da política, encarando-o como obstáculo à participação legítima das mulheres no processo. Entendia que a mulher precisava ser corajosa porque “o machismo ainda é muito forte e ser homem no Brasil ainda é um meio de entrada na política, apesar de que nunca me senti intimidada nem fui discriminada porque eu procuro ser muito prática”. Mas reconhecia a dificuldade. E fez uma confissão: “As mulheres, em geral, não votam nas mulheres, não acreditam nelas. É muito triste isso, mas é verdade. A mulher é que é machista, muito mais que o homem”.
Essa revelação ela fez para o perfil elaborado pelas pesquisadoras Glória Rabay e Maria Eulina Pessoa de Carvalho, inserido no livro “Mulher e Política na Paraíba – Histórias de vida e luta”, de 2010, que teve o selo da Editora Universitária da Paraíba. “Dona Dida” dizia existir um fator que era de responsabilidade da própria mulher: “se ela não reconhecer que tem valor, jamais chegará a lugar algum. É preciso confiar em si mesma e colocar o homem não como rival seu, mas como um parceiro que pode caminhar lado a lado, cada um fazendo sua parte”. Numa análise que fez sobre os números das eleições de 1998, concluiu que a participação feminina havia crescido, mas refletia que era possível conquistar mais espaços, ainda, de representatividade e que isso demandava luta constante, sem acomodação.
Natural de Ingá, foi em Itabaiana que ela se projetou na vida pública. Para lá se transferiu por força do casamento com o médico Aglair da Silva, em cujas campanhas a prefeito se engajou ativamente na década de1970, desenvolvendo trabalho de assistência à pobreza. O gosto pela política vinha desde a infância. Desde muito cedo, nos comícios em Ingá, era convidada para falar nos comícios. Criada por avós maternos, “Dida” dedicou-se ainda aos esportes e aos estudos, cursou a faculdade de Letras e fez cursos no exterior. O marido Aglair da Silvafoi eleito em 1976, mas foi Dona Dida que assumiu grande parte das responsabilidades com a edilidade nesse mandato, que terminou em 1982. Tentou se candidatar à sucessão dele e chegou a ser eleita mas houve um verdadeiro imbróglio jurídico orquestrado por adversários que alegavam inelegibilidade por vínculos familiares. Para contornar novos problemas dessa ordem, Dona Dida oficializou uma separação com aprovação do marido.
Com o vai-e-vem sobre o direito de assumir a prefeitura, nem por isso Dona Dida se afastou da política ou da assistência social. Trabalhou na Legião Brasileira de Assistência de 1990 a 1992 como diretora de programas, presidiu a Fundac (órgão estadual) e também uma Fundação em Itabaiana que procurou manter com muita dedicação e esforço. Sentia-se recompensada por gestos de carinho das pessoas pobres de Itabaiana. “O povo costuma dizer que campanha sem Dona Dida não tem graça, pelo fato de a disputa se tornar acirrada, pelos grandes comícios e memoráveis passeatas”. Em 1994 candidatou-se a deputada estadual e foi eleita. Nas homenagens póstumas a Dona Dida, Nas homenagens póstumas a Dona Dida, lideranças políticas paraibanas destacaram a linha independente de Eurídice Moreira e a contribuição que ela ofereceu à quebra de preconceitos contra o engajamento da mulher na política-partidária e nas esferas de poder.